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A verdade sobre o PIB

O grande perigo das análises econômicas é que elas se prendem facilmente a mitos, a percentuais mal interpretados. Se eu disser que corri hoje 20% a mais que ontem, e você me disser que correu apenas 1% a mais que ontem, quem correu mais? Pergunta boba, não é? Mas é exatamente disso que se trata.

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Perdão pelo título pretensioso. Não sei a verdade sobre nada, mas tenho fortes suspeitas. O grande perigo das análises econômicas é que elas se prendem facilmente a mitos, a percentuais mal interpretados. Se eu disser que corri hoje 20% a mais que ontem, e você me disser que correu apenas 1% a mais que ontem, quem correu mais? Pergunta boba, não é? Mas é exatamente disso que se trata. Se um país teve uma performance medíocre em 2010, e apresenta um bom crescimento este ano, isso não significa que ele está melhor que o Brasil, que apresenta taxas modestas, pelo simples fato de que a nossa base de comparação, o ano de 2010, foi o melhor ano em muitas décadas. Sendo virtualmente impossível repetir o feito realizado em 2010, seria naturalmente muito difícil exibir, este ano, um crescimento percentual sobre uma base tão boa.

Então como podemos auferir o desempenho da economia, sem essas distorções, resultantes de bases comparativas diferentes?

Passei algumas horas pesquisando os números do IBGE, até que encontrei a melhor forma. Vamos analisar em valores correntes! Ou seja, analisar o desempenho dos setores econômicos e do PIB, em dinheiro vivo! Achei a tabela que traz esses dados e recortei algumas colunas que considerei mais relevantes, à guisa de simplificação.

Dêem uma olhada na tabela abaixo.

 

A tabela me permite entender melhor o que aconteceu à economia brasileira nos últimos dois anos. Ela também nos fornece algumas dicas sobre o que vai acontecer no último trimestre deste ano. Repare que o último trimestre do ano costuma assistir a um aumento muito grande do consumo do governo, e que, no terceiro trimestre deste ano, houve um recuo pesado deste item. Na verdade, foi o único item que registrou queda em relação ao trimestre anterior, dentre os itens selecionados.

Quando à indústria de transformação, ela sofreu, de fato, uma queda no terceiro trimestre deste ano – em relação ao mesmo período de 2010, mas apresentou um crescimento de 2,2% sobre o trimestre anterior mesmo tendo o consumo do governo, que inclui obras e serviços que demandam a indústria, caído 4%.

Por fim, é importante observar que tanto a formação bruta de capital fixo como a construção, que indicam investimentos de longo prazo, foram os setores que registraram os maiores crescimento no terceiro trimestre.

Segundo o IBGE, “a formação bruta de capital fixo (FBCF) é a operação do Sistema de Contas Nacionais (SCN) que registra a ampliação da capacidade produtiva futura de uma economia por meio de investimentos correntes em ativos fixos, ou seja, bens produzidos factíveis de utilização repetida e contínua em outros processos produtivos por tempo superior a um ano sem, no entanto, serem efetivamente consumidos pelos mesmos”.  Em outras palavras, a FBCF é o que a imprensa chama de “investimento”.  E voce pode ver que, no terceiro trimestre, os investimentos alcançaram 20% do PIB, nível similar ao registrado em igual período de 2010, um bom nível. Para se ter uma ideia, em nenhum trimestre do governo FHC, os investimentos chegaram a 20% do PIB; e no governo Lula, somente duas vezes, no terceiro trimestre de 2008 e no terceiro trimestre de 2010, esse índice foi superior a 20%, a saber, 20,6% e 20,5%, respectivamente.

Considerando, contudo, que o PIB brasileiro está bem maior hoje do que em 2008 ou 2010, esse percentual corresponde a um montante em dinheiro muito mais significativo. Os investimentos no terceiro trimestre de 2011 totalizaram R$ 209,5 bilhões, contra R$ 197 bilhões em 2010 e R$ 162 bilhões em 2008.

O aumento de 7% na construção reflete igualmente a pujança da economia brasileira. A indústria pode até desacelerar aqui, para intensificar as atividades mais à frente, mas quando vemos os números de construção apresentarem um crescimento tão vigoroso, devemos entender isso como sinal de que o país segue se preparando para o futuro.

Sem querer fazer proselitismo político ou partidário, até porque entendo que o Brasil vivia outro momento, mas no terceiro trimestre de 2002, os investimentos totalizaram R$ 97,69 bilhões em valores deflacionados. Este ano foram R$ 209,55 bilhões. A indústria de transformação gerou, no terceiro trimestre de 2002, R$ 96 bilhões, em valores deflacionados. Em 2011, gerou R$ 133,9 bilhões. Repare aí que os investimentos cresceram bem mais que o valor da produção industrial, revelando que o Brasil ainda está em fase de cultivo. A verdadeira colheita ainda vai demorar alguns anos. Uma grande indústria de transformação, como as refinarias que estão sendo construídas no Rio e Pernambuco, demoram dez anos ou mais para ficarem prontas. Depois de prontas, porém, tem um poder de multiplicação de riquezas incomensurável, porque são logo rodeadas por dezenas de outras indústrias, desejosas de se instalarem nas proximidades para se integrarem a uma cadeia de produção.

Concluindo, neste último trimestre, haverá o tradicional aumento do consumo do governo e das famílias, o que deverá fazer o PIB brasileiro fechar em até um pouquinho mais de 3%. É um ótimo índice para um país do tamanho do Brasil, num momento tão delicado da economia internacional, e sobretudo perante a uma base tão forte como foi 2010! Lembremos que a média de crescimento durante o governo FHC foi de 2,3%, e sobre bases fracas!

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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