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Porque ser contra a PEC da Bengala

  PEC DA BENGALA: UM CAVALO DE TRÓIA Por Paulo Emílio Dantas Nazaré O risco de não compreender a sociedade e por ela não ser compreendido ronda, como nunca, o Poder Judiciário. As Cortes de Justiça, devotas da tradição e do formalismo, perpetuam seu culto ao passado e enfrentam dificuldades para se adaptarem às novidades […]

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PEC DA BENGALA: UM CAVALO DE TRÓIA

Por Paulo Emílio Dantas Nazaré

O risco de não compreender a sociedade e por ela não ser compreendido ronda, como nunca, o Poder Judiciário. As Cortes de Justiça, devotas da tradição e do formalismo, perpetuam seu culto ao passado e enfrentam dificuldades para se adaptarem às novidades que bombardeiam permanentemente as interações sociais contemporâneas. Contribui, para tanto, a garantia da vitaliciedade dos juízes no Brasil. Nesse contexto, é imperativo o incentivo à rotatividade nos quadros dos Tribunais, de tal forma que o encontro de diferentes gerações de juristas ofereça a oportunidade para as Cortes de Justiça não se isolarem da realidade social.

Na contramão da oxigenação do Judiciário, vozes ecoam que a idade de aposentadoria compulsória deve ser elevada dos atuais setenta anos de idade para 75, sob o argumento de que a expectativa de vida dos brasileiros aumentou, e o caixa da Previdência Social seria aliviado com a permanência dos servidores públicos em atividade por mais tempo.

Essa ideia, defendida enfaticamente nos Palácios de Justiça, rapidamente ganhou eco entre os parlamentares, de modo que o Senado Federal aprovou, em dois turnos, proposta de emenda constitucional – conhecida como “PEC da Bengala” – para prorrogar por mais cinco anos a idade limite de permanência no serviço público. Agora a matéria aguarda votação, em segundo turno, na Câmara dos Deputados e consta da pauta prioritária do Presidente da Casa, Deputado Eduardo Cunha.

Na última sexta (10), foi a vez da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro promulgar uma emenda constitucional que eleva a aposentadoria compulsória dos servidores públicos de setenta para 75 anos de idade. E mais, a Assembleia fluminense também inovou o texto constitucional para permitir que brasileiros com até setenta anos de idade sejam nomeados para Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Contudo, nesta quarta (15), o Ministro Luiz Fux concedeu liminar para suspender, até o julgamento definitivo do Supremo Tribunal Federal, a eficácia dos dispositivos introduzidos pela referida emenda constitucional.

É verdade que a média da expectativa de vida dos brasileiros experimentou significativo salto: de 62,5 anos em 1980 para 74,9 anos em 2013. Também salta aos olhos que aos setenta anos de idade os magistrados têm um cabedal jurídico acumulado que deve ser prestigiado pela comunidade e compartilhado com os mais jovens. Vale ressaltar, no entanto, que na Alemanha – país com expectativa de vida superior a oitenta anos de idade – os juízes do Tribunal Federal Constitucional, além de possuírem mandato limitado por doze anos, submetem-se à aposentadoria compulsória aos 68 anos de idade.

Aparentemente, são bem-intencionados os argumentos em prol da elevação da idade de aposentadoria compulsória dos servidores públicos – especialmente dos magistrados. O que está por trás dos panos, contudo, melhor seria se por lá mesmo permanecesse escondido.

A “PEC da Bengala”, no âmbito nacional, ao prorrogar por mais cinco anos os mandatos de Ministros das Cortes Superiores e de Desembargadores Federais, agrega dois tipos de interesses: de um lado, a vaidade de magistrados que querem se perpetuar em seus cargos para conservarem seu poder e status social; de outro, as conveniências políticas de lideranças partidárias que pretendem reduzir o número de nomeações da atual Presidente da República para cargos que ficarem vagos nas Cortes Superiores e nos Tribunais Federais.

Às claras, a “PEC da Bengala” aparenta se apegar ao interesse público, na medida em que: tenta fazer bom uso da experiência acumulada por aqueles que por muito tempo exerceram suas funções públicas; e busca contribuir para o equilíbrio das contas da Previdência Social. Entretanto, os interesses que estão ocultos nos bastidores reduzem-se ao patrimonialismo de uns e às conveniências políticas de outros.

Em meio a debates de conteúdo empobrecido, lá se vai mais uma oportunidade para discussão de qual arranjo institucional melhor se adéqua à sociedade contemporânea. Nesse contexto, o Judiciário continua apegado à estabilidade das tradições e permanece voltado ao passado. Por outro lado, as interações sociais inovam e incorporam novos valores, paradigmas, ideias e conceitos, chegando ao ponto de as novas gerações não conseguirem se fazer compreendidas por meio das categorias de pensamento tradicionais.

A sociedade clama por um Judiciário oxigenado e mais próximo dos dilemas e dramas sociais. Diferentemente, a “PEC da Bengala” perpetua magistrados em seus cargos e dificulta ainda mais a rotatividade de juristas nas Cortes de Justiça. Para se ter ideia, estudo da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB aponta que a PEC vai aumentar, de 17 para 22 anos, o tempo médio de permanência de um ministro no Supremo Tribunal Federal.

A nomeação de novos juristas em substituição aos Ministros e Desembargadores aposentados compulsoriamente – atualmente, com setenta anos de idade – promove o benfazejo encontro de diferentes gerações, interligando o novo e o velho, o reformador e o conservador, o utópico e o experimentado.

Considerando que a sociedade contemporânea carrega a marca do pluralismo, torna-se imprescindível que o Poder Judiciário substitua seu monólogo abstrato e formalista por um discurso que efetivamente reative um canal de comunicação e intercâmbio valorativo entre os Palácios de Justiça e a comunidade. Assim, os tribunais precisam renovar constantemente seus membros, sob pena de não conseguirem absorver as profundas alterações vivenciadas na atual sociedade estruturada em redes. A “PEC da Bengala”, nesse sentido, está na contramão da modernidade e da legitimação democrática do Poder Judiciário brasileiro.

Certamente, o reencontro do Judiciário com sua elevada missão institucional de pacificar os conflitos sociais passa pela abertura dos seus colegiados a novos Ministros e Desembargadores, que poderão trazer ideias diferentes, abordagens renovadas e soluções alternativas ao que já está decidido pela composição atual dos tribunais.

Paulo Emílio Dantas Nazaré, advogado, servidor do Senado Federal e mestrando em Direito pela UnB

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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Comentários

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Vitor

19/04/2015 - 15h53

Limite de 12 anos no STF… Eu sou a favor dessa ideia… Não dá para ter ministros por mais de 30 anos! Tem vezes que entram uns muito ruins!

Paulo De Mattos Skromov

18/04/2015 - 23h53

Os corruptos temem que o ministro José Eduardo Martins Cardozo seja indicado e obtenha uma das próximas vagas no STF , que representaria arejamenmto e republicanismo inaceitáveis. Então querem mudar a lei para impedir isso,

jose erb ubarana

18/04/2015 - 16h19

É um casuísmo de gente sem escrúpulos que domina a cena político-midiática neste País.

Luiz Fernando Souza Lima

18/04/2015 - 16h20

Bem. Perfeito o Victor Cassoli. Quer mudar, mude para os próximos. Ai, nada contra.

antonio s. lima

18/04/2015 - 12h50

O termo “bengala” é pejorativo para atrair apoio da sociedade contra a proposta de emenda constitucional. Enviei em 1987 à assembleia constituinte e defendi em convenção da magistratura a permanência dos magistrados na carreira sem limite de idade, enquanto a saúde permitir o bom desempenho na função, nos moldes da suprema corte dos EUA. A “oxigenação” é outra falácia. Os adventícios seguem os passos dos que se encontram no tribunal e da jurisprudência consolidada. Ademais, quem deve se atualizar com as mudanças sociais é o poder legislativo. Os juízes não elaboram a lei, apenas aplicam-na. São inúmeros os exemplos de decisões dos tribunais ajustando a interpretação da constituição e das leis às demandas sociais. Por outro lado, nem toda a demanda é salutar; nem toda mudança é conveniente. Há necessidade de estabilidade institucional e de segurança jurídica que a natureza conservadora da função jurisdicional atende.

Juliano Zuchi

18/04/2015 - 13h15

Gilmar FHC Mendes sempre foi muito fiel a seu partido.

Juliano Zuchi

18/04/2015 - 13h15

Gilmar FHC Mendes sempre foi muito fiel a seu partido.

Raimundo Medeiros

18/04/2015 - 03h24

Um golpe tucano e de seus aliados na mídia .

Mauricio Gomes

17/04/2015 - 19h56

Porque a “bengala” representa mais 5 anos do Gilmar Dantas engavetando processos. Simples assim……

Victor Cassoli

17/04/2015 - 22h25

Porque mudar as regras do jogo com a jogo em andamento eh GOLPE!!!

Katia Galvão

17/04/2015 - 21h10

Muito bom!!!!


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