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CPI exigirá coragem do Legislativo

Por Miguel do Rosário

16 de abril de 2012 : 06h55

Pela primeira vez, em muitos anos, podemos assistir ao instrutivo espetáculo de ver poderosos grupos de comunicação usando todas as suas armas para que uma CPI não seja instalada; se instalada, que não funcione; e se funcionar, que não chegue a lugar nenhum. É a velha cantilena lacerdista: Goulart não pode assumir, se assumir, não pode governar.

Por outro lado, receio que eu esteja perdendo o sangue frio. A guerra da comunicação acende as mais inflamadas paixões políticas, que podem atrapalhar uma análise objetiva.

O que me conforta é saber que as estribeiras foram perdidas primeiro, sobretudo, pela turma de lá, da Veja. A matéria de capa desta semana foi motivo de chacota de meio mundo das redes sociais.

Como formigas guiadas por feromônios, os redatores da revista passaram a inventar teses febrilmente, atribuindo-as ora aos petistas, ora à oposição, ora brandindo as suas próprias. Como diria o velho hippie, tudo se encaixa, cara!

O mensalão se tornou realmente a prova conclusiva de que os judeus, disfarçados de petistas, querem dominar o mundo. Começam pagando mesadas de 30 mil reais a deputados, depois a blogueiros, enfim todos os brasileiros estarão recebendo mesadas de 30 mil reais do governo, e todos se tornarão corruptos, excepto alguns gatos pingados do Leblon, cujas passeatas nas praias contra a corrupção serão hostilizadas pelas hordas de mensaleiros.

Em sua manchete de hoje,

o Globo tenta sua última cartada para melar a CPI: Dilma não quer.  É mais uma forma de chantagem. Depois de insuflar ao máximo a macheza dos parlamentares,  xingando-lhes porque seriam submissos ao Executivo, o Globo subitamente passa a louvar um suposto poder imperial da presidente de encerrar uma CPI com uma simples “reclamação”.

Ora, este Cafezinho tem repetido: CPI não é bom para o Executivo. Mas é hora do Legislativo, finalmente, mostrar independência e tomar uma atitude que melhore sua imagem perante a opinião pública.

Um recuo agora seria desastroso, ainda mais se fosse apenas porque a presidente mostrou “desconforto”. Informação esta que, não esqueçamos, é suspeitíssima, sem fonte, sem nada. Na Folha, também se tenta vender a tese:

 

Recuar revelaria um Congresso, além de submisso ao Executivo, covarde perante a mídia, e suspeito perante a Justiça. Levar adiante uma CPI como essa tem uma função política saneadora, porque ajudará a Polícia Federal a aprofundar suas investigações. O escândalo Cachoeira envolve políticos de alto calibre e grandes empresários, e somente uma CPI teria força para arrostar as terríveis pressões que já estão sendo feitas para abafar tudo.

A tese dos colunistas corporativos, de que a CPI serviria para melar o mensalão, apenas corrobora o seu sentimento de que o processo assenta-se sobre bases frágeis. Se há provas contundentes para condenar os mensaleiros, eles serão condenados. Os juízes do STF já estão com a faca no pescoço e dificilmente terão qualquer complacência para com os réus.

Tudo indica, porém, que as insinuações, sempre em off, de que a presidente estaria insatisfeita com a CPI, não são verídicas. Não se colheu de autoridade do Executivo nenhuma declaração minimamente assertiva de contrariedade à abertura de um inquérito parlamentar.

Ao contrário, o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), confessou (estranhando, porque governos sempre agem para barrar CPIs) que não recebeu nenhuma orientação do Planalto para interferir na instalação da CPI. Quem cala, consente.

A mesma cautela é adotada pelo atual líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM).
– Eu, Eduardo Braga, pessoalmente sempre acho que CPI, a gente sabe como começa, mas não sabe como termina – diz Braga, estranhando não ter tido nenhuma orientação do Planalto para interferir na instalação da CPI.

O que temos aqui, portanto, é a derradeira cartada do Globo. A mídia fez ameaças fortes nas últimas edições, e agora já constrói, de antemão, uma saída política para Dilma ordenar um recuo estratégico.

O engraçado é que, até a semana passada, a CPI era dada como um fato irreversível. Rapidamente, porém, a mídia entendeu que esta investigação poderá reverberar negativamente em sua própria imagem, em função das alianças e demais ligações entre o bicheiro goiano e jornalistas de grandes publicações.

Os tons de ameaça que se vêem nas manchetes, colunas e editoriais dos jornalões com certeza abalaram os parlamentares. O governo, por sua vez, pode realmente estar inquieto com a possibilidade de se desviar de sua frenética agenda de obras e reformas Brasil a fora para acompanhar os trabalhos de uma CPI do gênero. O esforço político pode consumir parte da energia que Dilma gostaria de focar nos grandes objetivos de seu governo: melhorar a educação, a saúde, a pesquisa científica, e qualificar os serviços públicos. Mas vale a pena, porque o combate à corrupção integra organicamente este esforço. E ela deverá durar apenas 2 meses. Não vai doer muito.

Entretanto, a CPI do Cachoeira é uma iniciativa que o Congresso deve tomar mesmo que em oposição à presidenta, para quem uma CPI barulhenta como essa, de fato, atrapalha sua intenção de promover um clima de estabilidade. Os ganhos políticos (com a CPI) seriam enormes, porque poderiam mudar definitivamente a relação de forças entre a classe política e a mídia conservadora, obrigando esta última a adotar uma postura mais responsável, mais isenta e mais… jornalística, promovendo assim um avanço republicano, com reflexos positivos sobre  a estabilidade política no longo prazo.

O Planalto tem mantido um silêncio cúmplice (a favor da CPI). As notinhas de jornal mencionando insatisfação da presidenta, por isso mesmo, não colam muito. Dias atrás, falavam que a CPI tinha o aval e o apoio da presidenta. Agora dizem o contrário. É mentira. O núcleo político da presidente, incluindo aí o presidente Lula, apóia a CPI, então pronto. O processo já ganhou musculatura própria. O Congresso tem de agir com independência e coragem.  A comissão deve ser instaurada e levada até as últimas consequências. Uma sociedade que deseja autolimpar-se e um governo que pretenda desinfetar o país de seus parasitas, devem apoiar uma investigação como essa com o entusiasmo que ela merece.

Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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5 comentários

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alex

17 de abril de 2012 às 09h56

Miguel e blognautas …
para mim é claro: o governo (o PT) não quer esta CPI.
Passam a imagem que querem, mas não querem …
Nossa prestimosa mídiaPIG sabe disso. Por isso deitam e rolam.
Neste sentido, infelizmente, o PT é fraquinho.
Se fosse ao contrário, os demoTucanos já teriam instalado esta CPI e já estariam julgando como são experts em fazer.
O PT fica no nhen nhen nhen e passa a imagem de que é conivente com a não instalação da CPI

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elson

17 de abril de 2012 às 06h46

Miguel , você deveria ler uma matéria no Brasil 247 que diz que o caso Lunus foi uma armação do PT e do PSdB para sabotar uma possível candidatura da Roseana Saney a Presidência em 2002 .

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Adriano Matos

16 de abril de 2012 às 22h24

O líder do PT desmente a matéria do 'o globo' que lhe citava diretamente como responsável pelo recuo: http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com.br/2

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Adriano Matos

16 de abril de 2012 às 20h02

Miguel, hoje na CBN o Alvaro Dias disse que um recuo agora, na instauração da CPI, vai contra o interesse da sociedade e não é mais possível, fazendo crer que é do governo o poder para tanto. Da mesma forma, outro entrevistado, um parlamentar do PSOL, cobrou empenho do governo e disse não ter visto a lista de coleta de assinaturas no plenário.

Essa conversa só pode acabar com a divulgação da lista de assinaturas.

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Maria Helena

16 de abril de 2012 às 16h53

Agora fiquei preocupada. Só vou estourar a champagne na hora que ver a CPI aprovada.

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