Apertem os cintos, os juros vão despencar!

(Ilustração capa: Farnese de Andrade.)

A principal notícia do dia, a meu ver, é o lançamento do novo portal de transparência do governo, com dados da União, Estados e municípios centralizados. É uma iniciativa bastante inovadora, que põe o Brasil na vanguarda mundial da transparência pública.

Ela permite que as críticas aos governos sejam mais qualificadas. Agora não há mais desculpas para se afirmar que tal ministério acabou com isso, reduziu investimentos naquilo, sem apontar exatamente um link do portal de dados que mostra esse recuo. E o próprio governo terá uma ferramenta para se defender.

Esse tipo de transparência reduz o poder da mídia, porque permite ao cidadão informar-se diretamente, sem intermediários. Não é por outra razão que os jornalões investem cada dia mais em infográficos deslumbrantes: é o único diferencial que eles podem oferecer ao cliente.

Por falar em infográfico, os jornalões vieram hoje com notícias catastróficas em relação a produção industrial. Eu já esperava isso. Vou repetir aqui alguns argumentos que já expus ontem, num post para assinantes.

Os números do IBGE não mostram uma indústria em queda, mas sim em recuperação dos baques sofridos nos últimos meses, por causa da crise vivida na Europa e EUA. As coisas estão tão bem no Brasil, que às vezes se esquece que o mundo desenvolvido viveu uma (outra) grande crise no ano passado, e ainda respira com dificuldade.

Em março, houve recuo de 0,5% na indústria geral, na comparação com o mês anterior, mas o setor de bens de capital, avançou 3,8% em março, depois de ter disparado 5,7% em fevereiro.

(Gráfico do Estadão).

O crescimento do segmento de bens de capital é sinal de recuperação, porque indica investimento na infra-estrutura industrial do país.

O forte crescimento de 3,4% dos bens duráveis, em março, também é um excelente sinal de que os setores mais estratégicos da economia mostram-se bastante dinâmicos.  Bens duráveis referem-se à produtos industriais de maior valor agregado, como carros, geladeiras, ar-condicionados, aviões, etc.

O setor de veículos automotores, por exemplo, que é o principal eixo da indústria de transformação no país, registrou crescimento de 11,54% em março. Outro segmento estratégico que apresentou um crescimento razoável foi o item Máquinas para Escritório e Equipamentos de Informática, cujo crescimento em março foi de 3,17%.

Algumas quedas verificadas em março foram pontuais, como a de produtos hospitalares: depois de crescer 24% em fevereiro, o item recuou 10% em março; no acumulado do primeiro trimestre do ano, este item registra alta de 15% sobre o ano anterior.

Vale a pena analisar esse gráfico, com os melhores e piores do trimestre. Repare que, entre os piores, há liderança dos veículos automotores, justamente o setor que registrou a maior recuperação em março:

(Gráfico da Folha).

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O senador pernambucano Humberto Costa (PT) divulgou ontem o relatório sobre o caso Demóstenes no Conselho de Ética. Eu achei particularmente interessante o seguinte trecho:

Em outro trecho, com riqueza de detalhes, Humberto Costa destaca a atuação de Demóstenes, em 2003, para questionar a renovação do contrato entre a Caixa Econômica Federal (CEF) e a Gtech do Brasil, para operação da loteria: nove meses antes de vir à tona o vídeo em que Waldomiro Diniz, ex-assessor de José Dirceu, aparece pedindo propina a Cachoeira, o senador fez um requerimento de informações ao Ministério da Fazenda, sobre o contrato fechado entre a Caixa e a Getch.

Humberto Costa, tendo por base relatório da CPI dos Bingos, mostra que Cachoeira queria fazer negócio com a Gtech e contava com a ajuda de Waldomiro. Quando a negociação fracassou, no início de 2003, Demóstenes começa a agir no Senado. Em agosto de 2003, ele reclama, no plenário do Senado, que recebeu documentos da Fazenda “mutilados” e denuncia, então, irregularidade no contrato CEF-Gtech. Quando o vídeo veio à tona, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) elogia a “capacidade de antevisão de Demóstenes”.

O relator pergunta: “O que balizou o requerimento, feito nove meses antes que os fatos se tornassem públicos? Qual o interesse de um senador da República em um procedimento licitatório que não possuía, àquele tempo, qualquer questionamento público? Quem estaria a par das tratativas não oficiais entabuladas?”. E arrisca um palpite: “Tudo leva a crer que seriam os vínculos que já ligavam o senhor Carlinhos Cachoeira ao autor do requerimento: o senador Demóstenes Torres“.

Ou seja, Humberto matou uma charada. A denúncia contra Waldomiro Diniz, o primeiro grande golpe no ministro José Dirceu, e um dos prelúdios do “mensalão”, teve como pano de fundo a tentativa (mal sucedida) de Cachoeira de montar um esquema com a Gtech. E mostra, também, que Demóstenes operava em favor de Cachoeira desde o início do mandato.

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Apertem os cintos:  os juros devem cair muito ainda este ano. Não sou eu que digo, e sim economistas entrevistados pelo Estadão, que não é exatamente um jornal governista. Eles esperam juros de 8% ou menos até o fim de 2012. A queda dos juros básicos, somada à redução do spread, das taxas administrativas e dos juros reais cobrados pelos bancos, já estão promovendo uma nova revolução no crédito, que deverá se aprofundar até o fim do ano.  Como de praxe, os jornais não estão informando a população corretamente, escondendo as notícias mais importantes. Por exemplo, confiram essa informação oculta ao final de uma nota na página 31 do caderno de Economia, do Globo:

Considerando as diferentes linhas de financiamento para pessoa física, a média diária de desembolsos em novas operações do BB cresceu 48,16% nos últimos 20 dias, passando de R$ 190,5 milhões, antes do corte, para R$ 288,5 milhões. Já os desembolsos em operações para empresas cresceram 20% na mesma comparação.

O BB informa ainda que, apesar do lucro ter caído nos últimos meses, a inadimplência está sob controle, jogando por terra as projeções urubuzísticas de que haveria a formação de uma bolha de crédito no país.

(Gráfico da Folha).

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Notícia histórica: o primeiro grande petroleiro totalmente brasileiro, produzido no estaleiro Atlântico Sul, ficou pronto. Atrasou dois anos, um erro perdoável por ser o primeiro. Serviu como uma grande escola técnica para milhares de trabalhadores.  Elio Gaspari, que andou falando besteira sobre “mico na construção naval“, terá que rever sua análise.

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Leandro Fortes publica uma matéria contundente na edição desta semana da Carta Capital, denunciando as ligações da máfia Cachoeira com o governo Perillo e a revista Veja.

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Brasil se torna segundo maior país do Facebook, com quase 50 milhões de usuários.

Aliás, tenho um comentário a fazer sobre a questão da internet no Brasil. Na matéria do Globo sobre a reunião política de Dilma com parlamentares, para arregimentar apoio às mudanças nas regras da caderneta de poupança, a presidenta menciona a “injusta tributação de produtos de primeira necessidade e o alto preço dos impostos de energia e serviços de comunicação.” Nos últimos meses, tenho lido várias notícias sobre avanço dos investimentos na área de internet e banda larga, incluindo aí o lançamento de um satélite de US$ 750 milhões, mas a divulgação dessas notícias tem deixado muito a desejar. Tanto que fica a suspeita no ar de que não são verdadeiras. Sugiro ao governo planejar um evento exclusivamente para anunciar os planos para a banda larga para os próximos anos. A maneira como foi anunciado o PNBL foi um desastre. O plano foi considerado medíocre pelos ativistas digitais e acabou provocando uma hostilidade muito grande contra o ministério da Comunicação e contra o governo Dilma.

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Merval Pereira escreveu hoje um artigo cujo objetivo principal é blindar a revista Veja.

Trecho:

Mas, mesmo assim, ainda enfrentamos ameaça à liberdade de expressão, que se configura de diversas maneiras. No momento, ela se revela na tentativa, frustrada de início, de levar a grande imprensa representada pela revista “Veja” à investigação na CPI do Cachoeira.

Os documentos surgidos até o momento, no entanto, nada revelam de transgressor no comportamento de seus profissionais, e todas as pseudoacusações se baseiam mais em ilações tiradas de versões do bicheiro e de seus asseclas do que em fatos comprovados.

Como diria aquele travesti, pohan! Não revelam nada de transgressor! Ora, há aí uma contradição gritante. Se não há nada de “transgressor”, porque o Globo jamais sequer menciona alguma coisa a respeito? Se um político governista solta um pum, o Globo diz que ele é detentor de armas de destruição em massa. Quando uma revista se associa a bandidos para queimar políticos adversários, são “pseudoacusações” e “ilações”.  É muito corporativismo! É assim que a mídia pensa em fazer “auto-regulação”?

O interessante no artigo de Merval é a imensa ironia de ver um dos prepostos da mídia se referir a governos populares, num tempo em que esses países vivem seus momentos mais intensamente democráticos de sua história, inclusive no sentido de inclusão social, como “ditaduras” ou “autoritários”. Quando houve efetivamente ditaduras, havia cópias desses mesmos prepostos dizendo que vivíamos numa democracia. Ou Merval acha que o Brasil esqueceu que o Globo, Folha e Estadão comemoraram o golpe de 64 como uma “vitória das forças democráticas”?  Relembrando: o título do editorial do Globo, no primeiro dia após o golpe, foi “Ressurge a Democracia“.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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