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O mensalão e a prostituta

O criador do Monsieur Hulot, embora famoso e rico, geralmente andava de bonde ou no metropolitano de Paris, com o seu indefectível caderninho, onde anotava os mais variados tipos e cenas inusitadas, umas engraçadas outras patéticas. Por José Abelha.

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O MENSALÃO E A PROSTITUTA

José Flávio Abelha, em seu blog.

“ Allegatio et non probatio, quase non allegatio”

(Quem alega e não prova, faria melhor se estivesse calado)

– Todos sabem que sou cinemeiro, sempre atravesso a madrugada vendo um filme e, ontem, revi Jacques Tati, um gênio do cinema francês que poucos brasileiros sabem quem foi.

O criador do Monsieur Hulot, embora famoso e rico, geralmente andava de bonde ou no metropolitano de Paris, com o seu indefectível caderninho, onde anotava os mais variados tipos e cenas inusitadas, umas engraçadas outras patéticas. Chegando ao seu estúdio, juntava todas as suas observações segundo o seu critério de organização e criatividade, com inteligência e talento, amarrava tudo e compunha uma história, daí a decupagem e, finalmente, mais um filme genial.

A genialidade de Tati estava em criar uma história, com início, meio e fim, mas, sempre, uma seqüência de gags, concatenadas de tal forma que agradava mas, com pouco ou nenhum conteúdo.

As Férias do M.Hulot nada mais é do que um cidadão saindo de férias, rumo ao mar e um amontoado de cenas engraçadíssimas. Simples? Não! Tudo com a marca pessoal de Tati e a sua genialidade em compor uma história, verdadeira colcha de retalhos que ele recolhia durante meses, senão anos, nas ruas de Paris, nas praças e bares , e que ele sabia costurar muito bem. No final, uma história verosímil, na acepção exata da palavra: que parece verdadeira!

Antes do filme de Tati eu me aboletei numa confortável cadeira do papai, defronte o aparelho de TV para assistir a mais um capítulo da chanchada que a amestrada mídia antilulista apelidou de “mensalão”.

E o artista da tarde era um arremedo de Jô Soares e Jacques Tati, claro, de segunda categoria. Porte do humorista e tentando compor uma história, igual Tati, com poucos fatos e muitas historinhas de orelhada, aquelas “por ouvir dizer”.

Seria cômico se não fosse trágico, visto tratar-se da honra, do futuro de pessoas, umas, figuras importantes da recente história do país, outras, um amontoado de gente desconhecida e uma bandalha que não merece registro.

Foram trezentos minutos de um monólogo enfadonho, com direito a trinta minutos de intervalo para o que o ministro Marco Aurélio, com o seu humor ferino disse necessitar para a chamada pausa para atender aos reclamos da fisiologia. Elegância para dizer que juiz da Suprema Corte também faz xixi.

Satisfeitas as necessidades fisiológicas, voltou o monocórdico, enfadonho discurso do bojudo orador. Falou o que quis, delirou, divagou, montou uma tragédia em três partes onde personagens entravam e saiam e vociferou o quanto lhe era permitido, com comentários desagradáveis, agressões estapafúrdias e, dizendo, em alto e bom som, que a maior parte das acusações contra os indiciados partia dos próprios indiciados, em depoimentos, muito dos quais, na base do “por ouvir dizer”.

– Dizia uma testemunha, também indiciada, que recebia dinheiro, segundo lhe informaram, do senhor José Dirceu. Outra, que o fulano disse ao sicrano que não sabia a origem do dinheiro mas que lhe contaram, em segredo, tratar-se de uma ordem emanada de uma sala do Palácio do Planalto.

E a leréia foi por aí. Poucos documentos e, esses, autenticados pelas autoridades competentes. Sob a ótica do acusador-mór, documento vale menos que uma informação de quem faz parte do que ele chamou de “quadrilha” Ora! Ora! Ora!

Mas, o Jacques Tati tupiniquim navegava na maionese das elocubrações.

– Nada era gravado, filmado ou fotografado. Tudo, entre quatro paredes, essas, sem dúvida, do Palácio dos Despachos, dizia o monocórdio Jô-Tati.

Perdeu-se o orador quando afirmou ser até um tipo de lavagem de dinheiro quem detinha cargo público e nomeava parentes, para receber dinheiro, prestígio e mando.

Será que o cansativo orador esqueceu-se de um escândalo que foi denunciado pelo senador Collor de Mello, sobre a situação do próprio orador mantendo em seu gabinete a sua esposa e encarregando-a de assuntos que lhe pertenciam?

Se não estou enganado, o monocórdio orador está intimado a prestar esclarecimentos sobre essa pinta branca na batina (ops!) na beca de Sua Excelência.

Jacques Tati, com o material contido nas toneladas de um processo fantasioso, faria um filme ou uma novela global muito mais interessante.

E o monocórdio orador, destilando veneno com a sua voz mansa, pausada e enfadonha, meteu os pés na maionese, entornou, como se diz mineiramente, o caminhão de abacates, lambuzando, emporcalhando o que a Vênus Platinada costuma chamar de “o processo do século” ( 12 anos e já é UM SÉCULO).

Baseou-se Sua Excelência na sua verberação pra lá de acre, em depoimentos, no disse-me-disse dos próprios acusados, uns confessando, outros, tirando o ron-ron-ron da seringa, num jogo de acusações cujas páginas que registram a barafunda já está pesando toneladas.

O monocórdio acusador baseou-se, no seu destempero acusatório, nos DEPOIMENTOS, quase nunca nos poucos documentos que nada provam, e todos sabem que PROBARE OPORTET, NON SUFFICIT DICERE, lição milenar que ensina:

“Não basta dizer; é preciso provar”.

E foi então que a acusação introduziu no augusto plenário do STF a figura da PROSTITUTA. Isso mesmo, paciente leitor.

Os mais renomados mestres do Direito chamam os depoimentos nos processos como A PROSTITUTA DAS PROVAS !!!

Vou chegar lá. Antes, desejo lembrar o nosso Código Civil :

CC – Lei nº 10.406 de 10 de Janeiro de 2002

Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:

I – os menores de dezesseis anos;

II – aqueles que, por enfermidade ou retardamento mental, não tiverem discernimento para a prática dos atos da vida civil;

III – os cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar dependa dos sentidos que lhes faltam;

IV – o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes;

V – os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes, por consangüinidade, ou afinidade.

Parágrafo único. Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o depoimento das pessoas a que se refere este artigo.

Muito claro o Art. 228. NÃO PODEM SER ADMITIDOS COMO TESTEMUNHAS:

IV – o interessado no litígio, o amigo ou o inimigo capital das partes.

Poderíamos entender que o monocórdio acusador teria se valido do § único do Art.228 mas, se essas testemunhas possuíam “fatos” que só elas conheciam, como ficaria a proibição contida no mesmo artigo? E que fatos seriam esses?
Que lhe contaram sobre a origem do dinheiro, possivelmente enviado pelo senhor José Dirceu?

O parágrafo único é muito claro: “para a prova de fatos”. Ora, um fato só se prova com alguma coisa palpável, um documento, um CD etc. senão, o fato vira boato, vira disse-me-disse. E é o que se está tomando conhecimento, pela voz do próprio acusador-mór.

E, mais uma vez, aqui entra o chamado processo do MENSALÃO de braços dados com a velha PROSTITUTA.
Causa espécie, também, que surjam na peça acusatória, citação de pagamentos curiosos, visto que, importâncias com centavos.

Em se tratando de pagamentos mensais, será que algum político, com certeza deputado, pediria, para votar em tal ou qual matéria de interesse do governo, a importância, p.exemplo, de R$ 50.320,72 mensais? Não seriam essas importâncias com “centavos”, pagamentos de faturas de combustível, gráficas e que tais?

Ou os envolvidos no chamado “escândalo do mensalão” seriam tão sofisticados que, para “não dar na vista” uma importância fixa, 50 mil zero,zero,zero, resolveram inovar, pedindo “mensalmente” uns “quebrados e centavos”?.
Diria o grande Gerson canhotinha: brincadeira!

Esse, o bródio, a patuscada, a farra em que se transformou um processo que chegou no STF, transformando-o em delegacia de polícia. Todo processo tem início no primeiro degrau da escada e vai subindo até o último degrau, o STF.
Este, já foi direto para o STF e, de lá, esperam uns incautos, sairão todos algemados.

E A PROSTITUTA ?

…” É muito conhecida no meio jurídico a afirmação de que “a testemunha é a prostituta das provas”(http://www.poisze.com.br/livro/prostituta-das-provas/). Isto tem mais de verdade do que se supõe. A prova testemunhal é quase sempre uma lástima…”

***

…”Além de haver inúmeros casos em que pode existir uma

percepção errônea por parte da testemunha em relação ao fato

presenciado, causada por fatores alheios, também há, infelizmente,

diga-se de passagem, o conhecimento sobre outros

tantos inúmeros casos em que existe a manipulação de testemunhos,

prática nem tão incomum mas que, utopicamente,

deveria ser extirpada do mundo jurídico.

O fato é que é muito comum haver processos nos quais as

provas baseiam-se apenas em testemunhas e também muito

comum estas testemunhas não serem de confiabilidade absoluta.

(http://www.modro.com.br/cinema/Livros)

***

Este blogueiro não foi buscar nas lições dos grandes mestres o apelido da prova testemunhal. Preferiu o que roda nas mãos daqueles que não lustraram as cadeiras de uma Escola de Direito.

Como bem afirmou o jornalista Paulo Henrique Amorim, depois da laudatória e cansativa peça acusatória, José Direceu pode ir se preparando para ser candidato a senador por São Paulo.

Não vou a tanto, visto que, nos bastidores do STF há uma briga-de-foice para liquidar urgentemente com o processo, sob a alegação de que um ministro vai aposentar-se já nos primeiros dias de setembro e é preciso que ele deixe registrado o seu voto, AGORA.

Mas o problema é mais complexo. O atual Presidente também aposenta-se ainda este ano e o Ministro-decano já anunciou que, também este ano, vai aposentar-se. Ficaria a Presidenta Dilma com três indicações e o placar poderia ser alterado, hoje, segundo dizem, 6×5 contra os “mensaleiros”.

Enquanto o Ministro Gilmar, com a sua estudada fala, alterando palavras inaudíveis com expressões de profunda raiva expressava sua posição de que o julgamento do chamado “mensalão” era o ponto histórico daquela casa, o senhor Procurador Geral , ao final da sua leréia, deu uma entrevista onde disse textualmente que, não argüiu o impedimento do Ministro Tóffoli para não atrasar o processo.

Ou seja, ele mesmo reconhece que “pisou na maionese”, fez vista grossa em um problemão interno…para não atrasar o processo?

E onde anda a moralidade que ele tanto apregoou no laudatório e cansativo discurso acusatório?

Na próxima semana tem mais.

Nunca é sem propósito lembrar que o processo da chamada Inconfidência Mineira estava se arrastando por longo tempo e, de Portugal, veio a ordem expressa:

-Encerrem esse processo imediatamente. Encerraram.

Enforcaram Tiradentes!!!

Quadrinhos de Arnaldo Branco (fonte).

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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