O PT e a democratização da mídia

Nada como um dia após o outro. O Partido dos Trabalhadores finalmente tomou coragem e incluiu a regulamentação democrática da mídia no programa de governo da presidente Dilma Rousseff.

Entretanto, evitemos o oba oba. Essa luta ainda está só começando. O processo de regulamentar a mídia deve passar pelo congresso, então é um assunto que ainda vai demandar muita luta política, e a mídia tem um lobby parlamentar poderoso, a começar pelos caciques do PMDB.

Então não adianta propor uma guerra se não se preparar para a luta. Há coisas que o PT pode fazer desde já. Uma delas é pressionar para que o Blog do Planalto seja um instrumento de comunicação política efetivo, e não apenas um depósito de vídeos e áudios da presidenta. Sendo que nem isso ele faz direito, visto que esnobou o vídeo da presidente discursando no congresso da UJS, durante o qual ela anunciou uma proposta corajosa de reforma política com participação popular. Dilma quase nunca faz discursos assim, fortemente politizados, duros. Quando ela faz o governo esconde?

Não estou falando para o Blog do Planalto adotar um tom carbonário, mas simplesmente externar, em linguagem de blog, as mesmas opiniões que a presidente emite em seus discursos.

Dilma tem opiniões progressistas fortes. Suas opiniões deveriam aparecer mais, em vários formatos. É assim que a mídia faz com suas celebridades: a mesma figura aparece no rádio, na tv, no blog, em livro, etc. Se há interesse em ganhar as eleições (o que às vezes parece não ser o caso), é preciso maximizar a imagem de Dilma.

Até mesmo a história do “controle remoto”, que é a desculpa da presidência para não debater a mídia, só tem sentido se a presidência oferecer a sua opinião própria. Aí o brasileiro usará o controle remoto para desligar a tv e assistir a presidenta falando e escrevendo no blog. Falar em controle remoto e não oferecer alternativa é contraditório. A internet é uma plataforma de mídia completa, não podemos esquecer. A presidenta pode gravar vídeos apenas para o blog.

A gente, na blogosfera, tem dado um cacete danado no PT pela covardia em não discutir a mídia, em não criar um sistema de resposta. Então agora eu parabenizo a legenda por comprar essa guerra, que sabemos ser, talvez, a mais difícil de todas. Afinal, a mídia é a voz do capital, desse capital tenebroso e sem pátria que oprime a soberania e a democracia no mundo inteiro. Lutar por uma mídia mais democrática é uma tentativa de ampliarmos nossa soberania, de democratizarmos efetivamente nossa agenda política. É claro que os donos do poder econômico, e o capital internacional, não gostarão nada disso.

Mais uma razão, portanto, para que as eleições deste ano sejam a mais difícil de todas. Aécio Neves é o candidato da mídia, e Eduardo Campos já se escondeu, há tempos, sob a barra da saia dos jornalões. Só mesmo o PT tem força para enfrentar esse monstro. É uma batalha pela democracia, pela soberania, pelo país. Sua complexidade reside no fato da mídia dominar a narrativa. É uma luta em que a mídia controla as regras e é dona do ringue.

A solução está, evidentemente, na internet, esse território livre ainda não dominado pelas corporações midiáticas. Nesse ponto, o governo e o PT ainda tem muito a avançar. Por exemplo, me desculpem se me repito, mas não engulo a decisão da presidência da república de sumir do twitter após as eleições de 2010. Quem tomou a decisão? Foi um erro político colossal! Um erro estratégico! E não me refiro apenas a um erro de “propaganda”. Ao menosprezar a internet, o governo piorou a sua administração, afinal a rede permite o governo aprimorar seu trabalho, ouvir melhor a população.

A internet ajuda a acelerar obras e a melhorar os serviços públicos!

Por que fizeram isso? O que houve foi uma sabotagem política de proporções grandes demais para esquecermos. Parte do que vimos em 2013, nasceu desse apagão absurdo na comunicação do governo. A sociedade reagiu, desesperada, a mudez e surdez governamentais. O governo tampou os ouvidos, e o país se ergueu para dar um grito tão forte que seria impossível não ser escutado!

A comunicação permaneceu apática, catatônica, por quatro anos, e agora, às vésperas da eleição, há uma corrida para montar uma estratégia improvisada.

O blog da Petrobrás está melhorando, a duras penas, mas ainda deixa muito a desejar. O Blog do Planalto tem uma média de curtidas de Facebook totalmente incompatível com a sua importância. Tem posts que tem apenas 4 curtidas! Ora, parece que nem o próprio staff responsável pelo blog curte o que escreve.

Post do blog do Planalto: publicado às 21:24, zero curtidas seis horas depois.

Ainda não há investimento real na internet. Ainda não há decisão política concreta de mergulhar de cabeça nesse universo.

O PT está esperando o início da propaganda eleitoral para mostrar os feitos do governo, o que é um absurdo. Os tais vídeos geniais, que mudarão o cenário eleitoral, poderiam ser veiculados desde já, na internet.

Não quero culpar as equipes, da EBC, do blog, da TV Brasil, etc, pois a culpa não é dos funcionários, que são competentes. Mas não há uma diretriz de governo para fazer da comunicação pública uma prioridade na administração.

Caso Aécio Neves ou Eduardo Campos vençam as eleições, podem ter certeza, esess escrúpulos vão ter fim. A comunicação pública será transformada radicalmente. O governo passará a defender a si próprio com unhas e dentes via todos os instrumentos públicos de que dispõe, e a mídia, amiga, não irá falar nada. Não estou seguro de que os programas sociais sejam preservados, ou que sejam prioridade, mas a comunicação, com certeza, será aprimorada, provavelmente integrada à grande mídia. Porque a força do conservadorismo brasileiro está na mídia, na comunicação.

Não é por outra razão que eles atacam os blogs com tanta virulência, e sempre abaixo da cintura. Os comentaristas tucanos ou proto-tucanos entram aqui não para discutir o mérito dos textos, mas para acusar o blogueiro de receber verba clandestina do governo. O que é uma acusação irônica e até meio trágica, pois o governo, nos últimos anos, tem dado milhões para portais da grande mídia, e até mesmo para portais de propriedade norte-americana, como o site da Fox, mas jamais ofereceu nada ao Cafezinho. A explicação é simples: outro dia mesmo, descobrimos que a Secom contratou um veterano direitista da Veja, um cara que perseguiu Brizola, Gushiken, e tantos outros quadros. Depois de um post no Viomundo, conseguimos derrubar o sujeito. Só que isso faz pensar: depois de tudo que a gente tem falado, eles ainda contratam uma pessoa assim?

Não basta, portanto, defender uma regulamentação da mídia. Até mesmo para que essa não seja uma guerra perdida, precisamos empreender outras batalhas. A comunicação pública do governo tem de ser aprimorada. Até hoje, nos sites de clipping dos ministérios e da RadioBras, por exemplo, consta apenas as mesmas fontes de sempre: Veja, Globo, Folha. O ministério do Planejamento tem um sistema de busca, em que chega a listar todos os colunistas da Veja!

Isso tudo ajuda a marginalizar a blogosfera. E não há necessidade de esperar regulação da mídia para mudar esse tipo de coisa. Mas parece que o governo não tem, definitivamente, uma estratégia de comunicação. Não há um trabalho mínimo de inteligência, que faça uma análise de toda a comunicação pública federal e proponha uma estratégia centralizada e otimizada.

Repito: a importância disso não é fazer propaganda ou “falar bem” do governo! A importância maior disso é aprimorar a administração pública! Uma comunicação falha, não-democrática, gera ruídos em todas as esferas da administração. Mas a questão ideológica e política não pode ser menosprezada. Sem um trabalho de conscientização política, a mídia vai minando o governo por dentro, convertendo o próprio corpo administrativo em agentes de oposição. A “vergonha” da EBC e da TV Brasil de mostrarem realizações do governo, vergonha que às vezes flerta com uma sabotagem surda, como foi caso da presidenta no congresso da UJS, cujo discurso não foi gravado ou filmado, provavelmente está ligada a esse sentimento, a essa falta de ambiente político para defender o governo. Ora, o resultado é um desempenho medroso dessas agências, quase agradecendo pela falta de audiência. Não podem criticar, não podem defender, então fazem um jornalismo café-com-leite, insosso, fugindo de qualquer polêmica.

O ideal é que o jornalismo público tivesse independência para fazer críticas duras aos desmandos da própria administração pública, mas com um diferencial em relação à grande mídia: que também pudesse defender as grandes realizações e conquistas do governo.

Enfim, há muito o que fazer. Desculpem-me a presunção em simular que sei alguma coisa. Não sou nada, como diria Fernando Pessoa. Não diria que tenho todos os sonhos do mundo, mas alguns, sim, eu tenho.

 

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
Related Post

Privacidade e cookies: Este site utiliza cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com seu uso.