10 medidas contra Corrupção ou Muitas Medidas contra a Constituição?

por Marcelo Semer, em seu blog

“São novos tempos, meu senhor. Está em marcha uma trama nebulosa tão sutil que seria um crime nós nos apegarmos a velhos respeitos e amizades antigas…. o Diabo está vivo em Salém e nós ousamos não ceder ao seguir para onde aponta o dedo acusador”.

The Crucible (Arthur Miller)

Considerando a clara predisposição a infringir à Constituição, o projeto mesmo não resistiria a seu “teste de integridade”.

Embora o nome-fantasia do documento que se transformou em projeto de lei que se discute nesta data seja o de “10 medidas contra a corrupção”, observa-se no referido conjunto de proposições que há muito mais do que 10 medidas e não são propriamente, ou exclusivamente, “contra a corrupção”.

Em alguns casos, as medidas se aplicam a crimes contra a administração pública, em outros a uma diversa relação de tipos não coincidente (como exemplos, os do art. 4º e 22, do Projeto); em muitas oportunidades, todavia, as inovações de lei se aplicam indistintamente a todo o Código Penal (como no caso da prescrição), ao Código de Processo Penal (nos importantes capítulos do sistema recursal, das nulidades, provas ilícitas e do Habeas Corpus).

Não é certo dizer, todavia, que não tenham entre si um vínculo, a despeito de uma junção claramente artificial. Mas diferentemente do que se apregoa, o mote que une as ditas medidas não é propriamente a “luta contra a corrupção”. Mas um documento feito à imagem e semelhança do acusador.

Esse é o ponto central; é o paradigma que lhe dá liga: o Código da Acusação.

O carimbo “contra a corrupção” atrai olhares e seduz filiações. Pouco se discute na mídia, por exemplo, o conteúdo das medidas.

Ora, contra a corrupção são todos.

Não surpreende um abaixo assinado tenha colhido dois milhões de assinaturas neste sentido; com o volume de dinheiro público e de mídia envolvido, é de se estranhar que não tenham sido colhidas 20 milhões de assinaturas.

Para entender um pouco do que se trata, e mesmo assim de forma embrionária, eu que sou juiz há 26 anos, 24 dedicados ao direito penal, levei mais de uma semana. E tenho a certeza de que ainda não o compreendi em sua totalidade. Há uma série de questões ainda em aberto.

Sei que a pressão popular é sempre relevante dentro desta Casa do Povo, mas não se pode olhar as centenas de disposições presentes neste pacote e acreditar que existam dois milhões de pessoas que compreendam inteiramente seus limites e suas consequências.

Os membros do MPF tem importantes serviços prestados à sociedade e isso está fora de dúvida. Não vai aqui qualquer reparo à sua atuação. Relevante, essencial diria. Mas ninguém, nem mesmo eles, têm o monopólio da razão, por isso a necessidade de uma discussão mais detida pela sociedade e especialmente pelo universo jurídico.

De tão volumoso, esse pacote de medidas é quase como se estivéssemos diante de um Código. Mas esse “quase código” assim não se denomina e, por consequência, tem um grau de discussão pública muito inferior ao que teria se tivéssemos abertamente tratando de um código.

E este “quase código” vem alterar significativas normas de outros estatutos, na tramitação ativa de duas reformas complexas, como o Código Penal e o Código de Processo Penal. No caso do Código de Processo Penal, o relator tem feito viagens pelo Brasil para ouvir diversos especialistas.  Esteve, por exemplo, semanas atrás, no Fórum Criminal em São Paulo, para ouvir juízes e promotores.

Mas temas essencialmente relevantes a uma reforma de CPP, como a estrutura de recursos, de nulidades, e todo o regramento do HC, estão sendo discutidas aqui, de forma mais apressada, sem amplitude de discussão que merecem. E, ao que temos conhecimento, em sentidos distintos daqueles propostos na reforma. E essa é a primeira advertência que faço.

O mais correto, creio, seria o apensamento dessas medidas no processo das respectivas reformas, pois umas interferem decisivamente em outras. Toda a tentativa de sistematização dos regramentos, que tem sido promovida por vossas excelências, a partir de novos códigos e novos estatutos, vai por terra com discussão apartada de um conjunto de projetos que dialogam intensamente com os novos códigos.

Pois bem, ainda que subscrito por nobres deputados, todos nós sabemos que as propostas se originaram do MP. Mesmo se não soubéssemos não seria difícil de constatar.

A proposta é toda ela, sem qualquer modéstia, margeada na ampliação de competências atribuídas ao Ministério Público e um viés acusador que fragiliza não apenas a defesa (em desequilíbrio nunca visto antes na história legislativa), como também o próprio juízo.

A proposta cria tipos penais, aumenta (e muito) alguns outros, amplia a competência do MP (como no caso do acordo de leniência e a supervisão de “teste de integridade”), abre largos espaços para a convalidação da prova ilícita. Ao mesmo tempo, fragiliza recursos, esmigalha um remédio histórico como o Habeas Corpus, esvazia o conceito da legalidade (com as restrições à declaração de nulidade) e fulmina o instituto da prescrição (aumentando prazos e criando fictícios marcos interruptivos).

Não se trata apenas de um desequilíbrio entre acusação e defesa –que é, de fato, abissal. Mas também de um esvaziamento da própria função do processo (a ideia de garantia trocada pela ideia de instrumentalidade) e ainda das funções do juiz –criando para ele uma preclusão e amputação de concessões de liminar e decisão de ofício.

Na versão original, abria-se uma absurda hipótese de convalidar decisão judicial sem fundamentação (claramente dirigida a casos de decretação da prisão preventiva). Pelo que vejo, tal dispositivo, que alterava o artigo 157, do CPP, não está presente na versão enfim consolidada –mas era uma mostra para conhecer a “vontade do legislador”, no caso, de exigir extensa fundamentação para a liberdade, mas dispensar para a prisão.

O projeto é na verdade, uma negação do processo penal constitucional.

O esforço de esvaziar a função de garantia do processo (que é a marca distintiva do processo penal no estado democrático), prestigiando a convalidação do nulo e do ilícito, demonstra a premissa principal do projeto: a ideia, equivocada, de que não é possível julgar crimes atendo-se à legalidade; ou seja, por mais contraditório que possa parecer, seria possível, às vezes até desejável, desprezar a lei para “combater o crime”.

Nosso sistema constitucional, todavia, não admite uma “tropa de elite” acusatória. A que esteja autorizada a matar dispositivos de lei para atingir condenações.

Combater a corrupção fragilizando a lei é o mesmo que apagar fogo com querosene.

Ninguém vai me convencer de que dependemos de alguma prova ilícita, tortura, algum grampo ou invasão de domicílio sem autorização. Ao revés, tudo o que não precisamos, nesse momento, é estimular produção de provas ilícitas, com o grau reconhecidamente alto de violência policial que existe no país.

Eu estaria tentado a dizer, desse primeiro olhar, mais geral sobre o projeto, que o lema que melhor se adequa a ele é: “os fins justificam os meios”, interpretação que por si só é desautorizada pelo Estado Democrático de Direito, em que tantos fins quanto meios devem ser legítimos.

Mas penso que os meios não são apenas ilícitos, são também potencialmente ineptos.

O mecanismo multiplicador de penas foi um verdadeiro fracasso na Lei dos Crimes Hediondos, o qual o projeto tenta, de uma forma disfarçada replicar (mais penas, mais prisões, menos progressões etc). Não há qualquer indicação de que seja um sucesso agora.

Não há medidas destinadas a aumentar internamente controles administrativos  gerando passos de maior transparência ou competitividade nas licitações e contratos, por exemplo –ponto nevrálgico da corrupção na administração pública. A flexibilização das licitações em sociedades de economia mista (como no caso a Petrobrás, pivô dos maiores escândalos) não é pelas medidas sequer tangenciada.

Isto se dá justamente pelo desvio de encarar a corrupção como um problema “moral”, não sistêmico. Que se imagina poder resolver com testes para apurar a conduta futura, em busca de predisposições para a prática de ilícitos….

Em resumo, formalmente, não me parece que esse conjunto de propostas díspares tenha sentido como um projeto único, que tramite em paralelo com alterações mais consistentes dos códigos que redesenha;

Materialmente, penso que tem um compromisso ideológico e corporativo com a acusação, buscando transferir a responsabilidade por eventuais erros ou a truculência de investigação criminal para supostas estratégias abusivas de defesa, alienação de juízes ou a omissão de parlamentares.

Passo, então, a tratar de alguns pontos do projeto, naquilo que mais desperta a atenção –mesmo sabedor que, pelo tempo disponível, será impossível traduzi-lo por inteiro.

1-) O projeto aumenta a pena de diversos crimes contra a administração – o que, de forma vulgar, poderia se chamar de “crimes de corrupção”.

A diferença entre a punição de crimes contra a propriedade privada e a administração foi sempre algo que despertou atenção. Não se pode dizer que sejam altas as penas para os crimes de corrupção (de fato não o são) –como tampouco o são as que tutelam, por exemplo, a vida e a integridade física.

Todavia, fazer algumas alterações de pena, durante a tramitação de um projeto de novo CP, pode ser extremamente improducente.

Cada vez que as penas são aumentadas isoladamente vão surgindo desproporções no direito. Assim, a alteração no CTB fez aumentar a pena do homicídio culposo no trânsito, mas não interferiu com a do homicídio culposo na negligência médica, por exemplo. Ou as lesões corporais, punidas de forma muito mais leve que crimes contra o patrimônio.

Apenas como observações, aponta-se que não houve proporcional acréscimo de penas do crime de sonegação fiscal –ainda que a lógica que sustenta o maior apenamento (corrupção desvia dinheiro público, que fulmina direitos sociais etc), possa ser igualmente empregada nos casos de sonegação).

O aumento das penas, nestes projetos, ademais, é progressivo de acordo com o volume do prejuízo, tarifação até atingir o patamar de hediondo.

A justificativa nos traz exemplo de apenamento norte-americano, com recomendações para sentenças. Mais uma importação seletiva de instituto que não tem qualquer ligação com nosso direito –e, a bem da verdade, o desorganiza bastante. Seria até o caso de perguntar: essa tabela de valores também vai servir para os crimes patrimoniais? E para as sonegações fiscais? A apropriação indébita previdenciária?

A preocupação sistemática é zero.

A par do estranhamento de fixar um patamar monetário para a hediondez (o que é jurídica e filosoficamente inexplicável), o projeto despreza o aumento que a própria lei penal no art. 59, já confere, ao juiz para aplicar a pena de acordo com “as consequências do crime” –fato, aliás, que já se tem visto em recentes condenações, inclusive nos próprios processos da LavaJato. Ou seja, diversamente do que se afirma aqui, não é preciso alterar a lei para aplicar penas mais altas em relação ao prejuízo sofrido.

O problema, então, não é a falta de lei. A ideia é a de tirar do domínio do juiz essa consideração individualizada, mais um exemplo de desconfiança na atividade jurisdicional.

Enfim, a monetarização da pena pelo valor do prejuízo traz ainda como subproduto a transformação da perícia contábil no principal incidente do processo (para discutir índices de atualização, correção monetária e formas de reajuste).

E, completando a mesma linha de produção, a liberdade também é monetarizada: vedando-se progressão de regime caso não haja ressarcimento.

Enfim, a utilização de prisão para constrangimento a pagamento de dívida –aqui de forma indireta- já é vedada pela Constituição (art. 5º, LXVII); e há mais de dez anos o STF decidiu ser inconstitucional a proibição genérica de progressão de regime, a que não leva em conta caracteres pessoais ou prognósticos em relação ao condenado.

Também, mesmo fora do direito penal, tem impedido sistematicamente outros atos de constrangimento para quitação de ilícitos tributários (Súmula 70: inadmissível interdição do estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo; Súmula 323: inadmissível apreensão de mercadoria como meio coercitivo para pagamento de tributos; Súmula 547: não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito …. exerça suas atividades profissionais).

A exceção admitida constitucionalmente para que a prisão seja utilizada como coerção para dívida é a prisão civil do devedor de alimentos.

O crime de enriquecimento ilícito, de outro lado, precisa ser melhor pensado.

Seu princípio desvirtua, por completo, a ideia de presunção de inocência. Trata-se de um tipo penal que nasce na dificuldade de prova em relação a outro delito (corrupção, por exemplo) e inverte o ônus: se o acusado não prova a origem lícita, resta condenado pelo próprio enriquecimento.

A despeito da duvidosa constitucionalidade do dispositivo, vê-se que a sugestão dele é ainda extremamente ampla. O “enriquecimento”, segundo o projeto, pode-se dar apenas pelo “uso” de bens ou valores “incompatíveis com o rendimento” –embora seja difícil aquilatar-se um “enriquecimento”, ou seja, crescimento patrimonial apenas com utilização de bens.

Parece-me que o enriquecimento não comprovado tem mais a natureza de sanção disciplinar (já que é dirigido mesmo aos servidores ou agentes) ou expressamente como elemento de prova em crime contra a administração pública –até para evitar duplicidade de penas.

Enfim, uma questão que pode ser mais amplamente equacionada no próprio projeto do CP.

2-) No âmbito processual, são inúmeras as alterações, atingindo por tabela até o recém-nascido NCPC (de longuíssima tramitação e discussão extremamente aprofundada), através da estranha figura do “recurso abusivo” que seria “verificado pelo tribunal” e causaria o trânsito em julgado, sem efeito suspensivo contra essa decisão.

Não está claro o que seria propriamente o “recurso abusivo”.

Ou o recurso está previsto legalmente e utilizá-lo é um direito ou não está e não deve ser conhecido. O projeto até poderia ter caminhado na direção do NCPC em relação à decisão monocrática que considera o recurso impertinente ou prejudicado, cabendo agravo interno à Turma Julgadora.

Mas optou em fazer uma nova sistemática mal definida. Como já prevê dispositivo expresso em relação a embargos de declaração protelatórios (inclusive com multas altíssimas), não se vislumbra o quê exatamente se pensou neste recurso abusivo.

Abusiva parece ser, neste contexto, a própria criação de obstáculos aos recursos.

A mutilação aos embargos infringentes, de outro lado, segue sistemática completamente inversa a que foi contemplada no NCPC – e, diga-se de passagem, está funcionando muito bem.

Aqui registro uma dúvida. Pela Justificativa, os embargos infringentes estariam reduzidos à divergência condenação/absolvição. Pelo teor do art. 66 do projeto, estariam simplesmente revogados.

Qualquer que seja a proposta que valha a esse momento, trata-se de restrição incabível.

Toda o arcabouço processual se dirige a não se condenar em caso de dúvida. A dúvida, nos casos de julgamento em órgão colegiado, se corporifica na divergência.

O volume de embargos infringentes é pequeno em relação a das apelações (é certo, falta aqui uma estatística a mostrar aos senhores, acompanhando a proposição, quanto representam no conjunto de processos). O pequeno tempo que se economiza é muito pouco perto da violência que se pratica à amplitude de defesa (e à proibição de retrocesso).

E mesmo se vingue um texto mais próximo à justificativa, também não anda bem. Porque, restringir embargos infringentes à divergência de absolvição é praticamente extingui-lo. Parte significativa das divergências, nos processos penais, se fundamentam na aplicação da pena (que tem uma relevância expressiva, tanto quanto o mérito da condenação).

A fixação de regime aberto, semiaberto ou fechado, a dimensão da pena ou a substituição de penas privativas por restritivas de direito, não podem ser simplesmente eliminados do código.

Mais razoável seria adotar o julgamento estendido do novo CPC, que permite a discussão da divergência, sem atrasar o julgamento, muitas vezes na própria sessão, por se tratarem de matérias de direito, em que os julgadores já tem posições consolidadas. Esse expediente tem servido, no cível, para a gradual uniformização de entendimentos. Sem restringir nenhum direito.

3-) Mas a redução da amplitude de defesa mais significativa é mesmo a do Habeas Corpus, um remédio que parece incomodar em excesso –e é estranho que o faça no período democrático; são as ditaduras que tem apreço por mutilar o Habeas Corpus.

No ano passado, estive no Senado para discutir um projeto de lei encaminhado pela Ajufe, postulando a execução provisória da pena, antes do julgamento dos recursos –tema que mesmo com julgamento em plenário, ainda não se pacificou no STF.

Na ocasião, dizia-se que não havia qualquer perigo em iniciar a execução antes do julgamento de recursos especial e extraordinário, porque sempre haveria o Habeas Corpus para corrigir erros graves. E os defensores do tema no STF também se utilizavam do mesmo discurso: recursos são pouco providos, os HCs é que são com mais frequência.

Pois superada, a princípio, a questão da execução provisória, dirige-se agora o ânimo acusatório em fragilizar a centenária instituição do Habeas Corpus.

A primeira restrição é quanto ao Habeas Corpus de ofício – mais uma desconfiança em relação ao juízo. Proíbe-se a concessão, salvo quando para evitar prisão manifestamente ilegal ou implicar a soltura imediata do paciente.

A finalidade do HC é sempre fazer cessar ou impedir constrangimento ilegal que se dirija à liberdade de ir e vir. É isso o que o distingue enquanto remédio constitucional.

Por isso, é utilizado nas medidas penais (onde a privação da liberdade é regra) e em outros casos em que a liberdade também pode ser suprida, como no caso da prisão civil. Mas não se restringe, na seara penal, a medidas que signifiquem imediata inserção em estabelecimento prisional.

Um processo penal sem fundamento, que no limite, pode levar o paciente à prisão, mas nem sempre no primeiro momento, também é caso de Habeas Corpus. E a aplicação errônea de pena, que pode postergar (e muito) sua soltura também.

Essa restrição da “imediata soltura” amputa parte das funções do Habeas Corpus –que, vale relembrar, é cessar o constrangimento ilegal. Porque devemos temer o HC? Qual o fundamento para postergar constrangimentos ILEGAIS?

A justificativa do projeto é a de eliminar “expedientes destinados a anular processos de forma açodada”.

Aí bem se vê que a ideia de legalidade como “expediente”, ou seja, ardil. E isso não se aplica à defesa, mais aos próprios tribunais.

“Anular processos de forma açodada” é uma acusação tão contundente quanto sem sentido: se o processo deve ser anulado (porque se procedeu em desconformidade com a lei), o melhor é que seja o quanto antes, para que possa recomeçar sem vícios.

Na verdade, a ideia não é propriamente combater o “açodamento”, mas a anulação. Porque a lei, novamente, a lei, não deve ser vista como um empecilho para atingir-se a “condenação”.

A liberdade claramente não é tratada não como um direito, mas como uma oposição a combater –manifestação típica de um “código da acusação”, que não pretende propriamente combater a impunidade, mas a liberdade.  E repita-se, em TODOS os processos, não apenas naqueles “contra corrupção”.

Pois bem. Dá-se o HC de ofício, quando o Tribunal reconhece o constrangimento ilegal, mesmo que nenhuma das partes o tenha suscitado. Enfim, com que finalidade (e com que legitimidade) o juízo manteria alguém preso ou ameaçado de prisão, diante de um ato ilegal, apenas por não haver pedido formulado? Que sentimento de justiça estaríamos cultivando?

Proibir o HC de ofício é contra o senso de justiça; é mais uma medida, tal como as diversas prisões por dívidas enrustidas nestes projetos, que visam transformar o processo penal de garantia a instrumento.

O réu tem “benefícios” no processo criminal.

A doutrina costuma chama-los pela locução latina (“favor rei” – sim, isso não é exclusivo do Brasil). Só a ele cabe a revisão criminal e os embargos infringentes; a dúvida e o empate sempre devem ser apurados a seu favor; a utilização da lei retroativa só é possível se lhe beneficia; o direito de falar por último e o de ter a liberdade restaurada mesmo sem seu pedido –entre outros.

Esses “favores” não são gratuitos.

Eles servem para igualizar uma situação desigual, na relação Estado-indivíduo. Pelo mesmo motivo, os princípios básicos do processo penal (ampla defesa, imparcialidade da jurisdição, inadmissibilidade da prova ilícita, limites de violação do domicílio, etc) são todos inscritos no rol dos direitos fundamentais. A liberdade é um limite ao poder estatal.

Este projeto de lei é uma espécie de “favor acusasatione”; inverte a dinâmica, comprimindo direitos fundamentais.

A redução pretendida, no caso, esvazia desnecessariamente o HC.

Porque nos casos em que não está em disputa a “soltura imediata”, pode-se tratar de trancamento de ação penal ilegalmente iniciada (e é melhor estancar ela no nascedouro do que criar falsas expectativas de sucesso) ou se trata de revisão de penas exageradamente aplicadas, em desconformidade com a jurisprudência dos tribunais. A concessão de ofício supre a ilegalidade e a injustiça. E evita cumprimento excessivo de penas, que, no limite, pode ser de responsabilidade civil do próprio Estado.

Restrição similar se impõe à medida liminar de HC – apenas para os casos de “soltura imediata”.

A par da absoluta imprecisão do termo “soltura imediata” (progressão de regime, por exemplo, se aplicaria ou não a essa categoria? Restitui a liberdade, mas não é “soltura”), não há motivo razoável para vedar a liminar de Habeas Corpus que ao final seja concedido.

Liminares em HC muitas vezes são concedidas para evitar atos que podem ser desnecessários ou potencialmente constrangedores (como promover um interrogatório de acusação sem justa causa).

Um processo nascido torto ou o cumprimento exagerado de uma pena estariam sendo prolongados sem qualquer objetivo palpável – apenas a desconfiança do órgão acusatório ao juiz e tribunais e a compressão gratuita da liberdade.

Mas, se existe desconfiança do juiz, a compressão da liberdade também vem acompanhada de um requisito a mais sem o qual a ordem não pode ser concedida: a esdrúxula “requisição de informações ao promotor natural”.

O promotor se manifesta em todos os HC obrigatoriamente. Exigir, nos tribunais, que além da manifestação do membro do MP lá oficiante, aguarde-se as “informações do promotor natural” é postergar propositadamente o que deve ser o mais ágil dos instrumentos. Sem contar o fato de que, não sendo em regra a “autoridade coatora”, nada teria propriamente a “informar” – apenas contraditar.

A questão aqui não é aumentar o conhecimento do julgador, mas a contrariedade. Enfim, atrasar e reduzir a concessão.

As restrições prosseguem com a genérica limitação de discutir nulidade (mais uma vez as nulidades) por via de Habeas Corpus ou, quando necessário, como sucedâneo de recurso.

A mesquinhez do projeto para com o HC chega ao ponto de instituir em seu julgamento um voto de minerva para impedir o empate, tradicionalmente favorável ao réu (o empate é raro, porque os órgãos julgadores são compostos de membros ímpares; é exceção da exceção; mas se existe tamanha dúvida, porque o esforço de manter a prisão?).

Enfim, o projeto propõe um agravo contra concessão de Habeas Corpus para Tribunal Pleno, ou Órgão Especial.

Só faltou tipificar o crime de conceder Habeas Corpus…

O processo penal que eu aprendi preferia soltar 9 culpados a prender 1 inocente. Esse novo parece preferir prender a todos, culpados e inocentes.

Outros tantos mecanismos de limitação do poder do Estado vão sendo desconstruídos pelos projetos: a proposta extingue a fase de notificação prévia nas ações de improbidade; pulveriza o instituto de prescrição, aumentando seus prazos e criando ilegítimos marcos interruptivos.

4-) Mas nada é tão ostensivamente revelador do que a disciplina das nulidades e da admissão da prova ilícita, que descortinam, basicamente, uma mesma finalidade: evitar a anulação de quaisquer atos praticados na investigação, ainda que contra a lei.

O projeto trabalha com a premissa de que a lei é um estorvo para a investigação e apuração de ilicitudes. O que é, no mínimo, uma grande contradição, posto que todo o trabalho de quem é “contra a corrupção” deveria ser justamente o de prestigiar a lei. Quando a ideia de combate ao crime se faz sem a lei, apesar da lei ou ainda fora-da-lei, vai ficando cada vez mais difícil distinguir quem está de cada lado dela.

No processo penal, lei não é formalidade; é garantia.

Mas verdade seja dita, o que o projeto busca cassar não são as formalidades (quando interessa, criam-se formalidades, como a extensa forma de fundamentação para a declaração de nulidade e a criação da requisição de informações do “promotor-natural”).

O que o projeto busca cassar mesmo são as garantias.

Não mais se explora ideia de nulidade absoluta. Ao revés, como o juiz deve dar o “máximo aproveitamento aos atos do processo”, deve evitar o máximo possível a declaração de nulidade.

Se o fizer deve individualizar os atos atingidos, as circunstâncias que impedem o aproveitamento e ainda fundamentar os vínculos de dependência. O prejuízo jamais é presumido e a preclusão atinge o próprio julgador (ou seja, o juiz seria obrigado a prolatar uma sentença, mesmo constatando que houve, no processo, o cerceamento de defesa).

A preclusão da nulidade é extremamente complicada, porque muitas vezes o juízo sobre a nulidade só é possível apreender-se depois de terminada a instrução.

Em poucas palavras, o processo é reduzido à mera condição de formalidade e o juiz estimulado a não lhe dar muito crédito.

5-) Na disciplina de prova ilícita, esquece-se, sobretudo, da disposição constitucional por sua inadmissibilidade. Na prática, o projeto dissolve a ideia de prova ilícita e sinaliza, como se ainda fosse necessário, depois do aqui se disse sobre as disposições de nulidade, que o juiz deve buscar, sempre, prestigiar solução que não interfira nas provas já colhidas, independente de sua forma. Ou seja, reduz a amplitude de poder de controle do juiz sobre a prova produzida.

É nesse ponto que se inserem a ideia da prova ilícita de boa-fé (como se isso não fosse em si mesma uma contradição em termos), a ideia da “relação de causalidade remota” ou ainda a prova purgada­ – todos excludentes da ilicitude, para permitir a aplicação da prova ilícita e suas derivações.

Por fim, eis que são muitas as hipóteses que sirvam de excludente de ilicitude a ideia de que a prova ilícita pode ser usada para fazer a contraprova, ou seja, para opor-se, por exemplo, a um álibi (ou uma prova que hipoteticamente seria falsa).

Se para buscar a falsidade de uma prova, ou para reconhecer a inidoneidade do álibi, é preciso ANTES o Estado produzir uma prova ilícita, é sinal evidente que se trata de prova ilícita suportada quando muito, por um indício do ilícito (e se existe dúvida sobre o álibi, ele simplesmente vai ser desconsiderado).

Há aqui especialmente, como em outros cantos, um forte estímulo para a produção da prova ilícita, ou seja, um convite a abrir mão de limites legais. Quase uma justificativa: o policial pode cometer o crime se for para revelar a mentira do réu.

A prova ilícita é transformada, praticamente, em um exercício regular de direito.

A discutível tese do projeto, neste ponto, se baseia na importação de excludentes à inadmissibilidade das provas ilícitas do direito norte-americano, onde parte desses dispositivos é tratada na jurisprudência.

Há duas considerações a esse respeito:

A inadmissibilidade da prova ilícita é de estatura constitucional. Os direitos e garantias fundamentais são, ademais, cláusulas pétreas –não podem ser objeto de emenda, revogados ou diminuídos;

A ideia de importação de precedentes norte-americanos jamais pode ser automática: há um enorme diferencial de sistema, de multiplicidade de legislação e de processo. Basta dizer que sob nenhuma circunstâncias seria possível nos EUA tanto protagonismo na fase pré-processual por parte de um juiz.

A admissão da prova ilícita (ou daquela que foi dela derivada) se inclui na vedação constitucional: sendo cláusula pétrea, não pode ser excluída nem DIMINUÍDA. Veja-se que a própria Exposição de Motivos alertou para o fato, com certo desalento:

“Nos EUA, as exclusionary rules não são elas próprias um direito constitucional, isto é, não estão previstas nem na CF, nem em qualquer uma de suas emendas…..

A sua importação para o Brasil, onde vigora o sistema da Civil Law, deu-se mediante positivação da regra no texto constitucional…A inadmissibilidade das provas ilícitas, por aqui, é irrestrita”.

Isso seria o suficiente para não alongar mais a discussão neste particular.

A prova ilícita produzida de boa-fé continua inadmissível ao nosso direito.

Apenas uma observação sobre a análise deste modelo comparativo. A disciplina de provas ilícitas pode estar sendo restringida nos EUA (por não estar prevista na CF). Todavia, sabe-se que sua aplicação lá sempre foi muitíssimo mais rigorosa do que aqui. A jurisprudência brasileira engatinha, quando é o caso de inadmitir provas ilícitas.

Para quem convive no cotidiano forense, sabe que as violações de domicílio são frequentes, mas pouco demonstradas, porque a palavra do réu é sempre desprestigiada; a tortura persevera na ação policial; e muitas escutas clandestinas são legalizadas, chegando ao processo como “denúncia anônima” ou apuração de um “informante”.

Se estamos pensando em mudar radicalmente a forma de tratar prova ilícita, seria o caso de apurar, de forma estatística, quantas decisões judiciais invalidaram prova por sua ilicitude. Se tivéssemos essa estatística em mãos, tenho a certeza de que sequer estaríamos discutindo esse tema.

6-) Outra consideração que afronta a constitucionalidade é a criação de (mais) duas causas de prisão preventiva.

Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada: I – em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4°);

A lei que tratou especificamente do assunto (lei recente aprovada por vossas excelências, 12,403, disciplinando as medidas cautelares penais, impôs a prisão preventiva como última alternativa, mesmo em caso de descumprimento de outra cautelar (§ 4o  No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único).

A ideia é: se a prisão preventiva não parece ser necessária -e por isso o juiz decide por outra cautelar, como, por exemplo, o recolhimento noturno, o fato de o acusado ter sido flagrado fora de casa às 20h00 pode não ser necessariamente caso de decretação da prisão preventiva.

O projeto genericamente, e não apenas para casos de corrupção, de passagem, estraçalha o coração da Lei que tratou especificamente do assunto, para impor a decretação da prisão pelo mero descumprimento.

II – para permitir a identificação e a localização do produto e proveito do crime, ou seu equivalente, e assegurar sua devolução, ou para evitar que sejam utilizados para financiar a fuga ou a defesa do investigado ou acusado, quando as medidas cautelares reais forem ineficazes ou insuficientes ou enquanto estiverem sendo implementadas.” (NR)

Aqui, trata-se de nada mais do que uma confissão da finalidade da prisão preventiva, completamente dissociada de sua natureza cautelar: prender para “permitir a identificação e localização do produto”. Ou seja, para constranger. Faltou tornar expresso: prender para obter delação.

É inconstitucional a prisão sem fundamento cautelar e, de toda a forma, para constrangimento, para forçar o réu a entregar-se ou entregar bens.

Como essas, são muitas inconstitucionalidades que percorrem o projeto.

Mas eu dedicaria o tempo final para pelo menos mencionar outras três “extravagâncias”.

a-) Primeiro, o teste de integridade. Simulação de situação para testar o funcionário em sua predisposição para o ilícito.

No direito penal, chamamos isso de crime de ensaio. E é um dos exemplos de situações classificadas como “crime impossível”, uma espécie de tentativa ineficaz, que o direito brasileiro não pune há mais de setenta anos.

O projeto institui um “teste” sigiloso como rotina para a administração e uma versão que pode ser utilizada “em investigações criminais” ou de “improbidade administrativa”.

Com relação à primeira, quer que sejam divulgadas apenas estatísticas – ou seja, quantos agentes teriam caído na “pegadinha”; mais ousada, todavia, é a versão investigativa com a qual o próprio MP pretende utilizar em suas apurações criminais ou de improbidade.

Não bastasse aumentar competências para seu próprio espectro de atuação, sob o álibi de combate a atos de corrupção, o MP quer ter acesso a intenções que não se materializam e seriam incapazes de ofender a qualquer bem jurídico. Punir a cogitação, enfim.

O MP quer que a administração conheça, e ele também, todos aqueles que tenham reparos na “conduta moral” ou “predisposição para cometer ilícitos”.

A tutela moral, todavia, escapa tanto à administração, quanto ao próprio MP. É um escárnio pretender que seu poder chegue a tanto. O Minority Report, enfim, é inconstitucional por desrespeitar violentamente a presunção de inocência.

Que as “pegadinhas” (não estranhem o nome, pois é exatamente isso o que se pretende fazer), poderão ter resultados usados “para fins disciplinares” e instruções de ações “cíveis, inclusive a de improbidade administrativa e criminais” passa do limite do bom-senso – além é lógico do constitucional.

b-) No vale-tudo no qual o projeto pretende transformar a investigação criminal – em que valem atos nulos, provas ilícitas, testes sigilosos – e da monetização da prisão e liberdade, não podia mesmo faltar a política de “recompensa”: 5% do produto obtido com a venda de bens, ao terceiro sem ligações com o delito quem tenha ajudado na recuperação.

Depois de monetarizar a pena, a prisão e a liberdade, monetariza-se o testemunho.

c-) Termino com uma monstruosidade constitucional: a pretensão de usurpar a figura jornalisticamente relevante do “sigilo da fonte”, como álibi para o “informante confidencial”.

O sigilo da fonte visa proteger a liberdade de expressão contra o poder estatal; que o jornalista não seja obrigado a revelar fontes da informação que publica, evitando ser comprimido pelos braços do Estado. No projeto, a finalidade é exatamente a inversa: a de que o Estado possa esconder do indivíduo a testemunha que usa contra ele.

Ou há uma nítida confusão entre sigilo e proteção de testemunha (que já existe na nossa legislação) ou um grosso equívoco de finalidade.

O que está em discussão aqui ultrapassa até mesmo a questão ética: trata-se de não esvaziar a ampla defesa, dentro da qual o direito de confronto (confronto entre ideias e testemunhos, ressalte-se) está inserido.

Diogo Rudge Malan (Direito ao Confronto no Processo Penal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 206): “É direito fundamental indissociável de qualquer noção civilizada de devido processo penal, motivo pelo qual ele deve ser levado a sério pelo Estado.

Uma coisa é tornar sigilosas as informações sobre as testemunhas (o que já é feito no processo penal brasileiro, mas jamais vedando acesso aos advogados).

A prova do “informante confidencial” é tão pouco crível para os próprios propositores da medida que houve a ressalva de que “ninguém poderá ser condenado apenas com base no depoimento prestado por informante confidencial”. Na vida real, qualquer outro elemento de processo, por menos importante que seja, como aliás já ocorre em grande medida com os “elementos do inquérito” –fase na qual a defesa não é obrigatória.

Não demora e retornamos ao período inquisitório, no qual o acusado é nada mais do que um objeto. Lá também havia perigos que justificavam o poder da repressão…

Uma última advertência. Inúmeras leis norte-americanas, quando da explosão do neopunitivismo que acompanhou o êxito do neoliberalismo tiveram essas mesmas “boas intenções”, criando crimes, aumentando penas e reduzindo direitos. O aumento no volume de prisões era, portanto, esperado. E previsto (Truth-in-Sentencing Incentive Grants – Investimentos púbicos autorizados resultantes do maior endurecimento penal previa expressamente investimentos para o sistema penal).

A pergunta que faço é: quanto custaria a implantação dessas medidas? Foi feita uma estimativa no aumento do número de presos para que saibamos quanto dos orçamentos futuros devem estar destinados a cumprir esses objetivos? Os Estados, que estão renegociando dívidas em troca do congelamento dos orçamentos estarão preparados para os vultosos gastos que provavelmente virão?

A maior responsabilidade penal pode corresponder a uma irresponsabilidade fiscal?

Quando eu falo aqui que houve desmedido comprometimento corporativo, não estou reclamando, como juiz, que o projeto dá muita atenção (força e poderes) para o Ministério Público.

Mas que é, sobretudo, nele centrado (auto-centrado): esmigalha recursos da defesa, cria limitações para o juiz (como a preclusão e regras limitantes para aplicação das penas), e ignora quase que totalmente uma figura extremamente importante no combate à corrupção, a advocacia pública, primeiro controle de legalidade, interno à administração.

Fortalecer a advocacia pública é muito mais importante para o combate à corrupção do que leis que criam tipos e penas e despejam todas as fichas na cesta do processo criminal. Mas nem quando fala do “teste de integridade”, os autores se lembraram que advogados e procuradores públicos exercem também função disciplinar nas comissões processantes de servidores.

E, por outro lado, a competência que é sobretudo do próprio MP, o controle externo da atividade policial, tem de novo pouca atenção. Eu diria até que, considerando que o projeto estimula a colheita ilícita da prova, ele tende a aumentar e não diminuir a violência policial.

Timidamente, os autores inseriram dentro desse tal “teste de fidelidade” a menção a filmagens em viaturas. O importante a filmar na ação policial é a verdade que acontece nas ruas; não apenas encenações.

A “faca no pescoço” é a vigilância da mídia e a estapafúrdia ideia de que quem é contra o projeto é a favor da corrupção. Não visto a carapuça e penso que os senhores também não devem vesti-la.

É o projeto que está corrompendo direitos aqui; não o contrário.

Quero lembrá-los de uma coisa.

Tradicionalmente, o processo penal outorga garantias mais amplas para julgamento de crime mais graves. O júri é um exemplo, mas não isolado.

Os procedimentos sumários e ordinários sempre foram classificados pela gravidade da pena (detenção ou reclusão) e atualmente o rito se altera pela possibilidade ou não de transação penal. Crimes menos graves, processos mais simples.

O projeto inverte substancialmente essa lógica ao propor um pacote de aumento de penas e redução de garantias. Ou seja, de que para punir mais, devemos ter menos apreço à amplitude de defesa.

É uma inversão substancial de lógica processual que, no mínimo, deveria ser equacionada com o restante do código.

A aprovação aqui destas matérias de natureza genérica, que invadem e COLIDEM com os projetos de códigos em andamento, irá, muito provavelmente, impedir a votação destes.

Ninguém há de lhes acusar de não votar as “medidas contra a corrupção”; mas tampouco de, por intermédio delas, reformar, sem a usual maturação, sistemas inteiros de códigos tradicionalmente perenes.

Redação:
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