O golpe na Venezuela

(Nicolás Maduro era motoristo de ônibus)

Eu tenho tentado escrever sobre esse tema há dias, mas a crise política brasileira não me deixa tempo nem para respirar, mas já tinha lido, por várias fontes diferentes, que se trata de mais um grande factoide, mais um exemplo de “pós-verdade”. Depois a imprensa corporativa vem com suas ridículas campanhas sobre “jornalismo de verdade”, contra as Fake News, quande é ela, a imprensa corporativa, a principal produtora de Fake News. Com a diferença que suas mentiras não são essas boatos inocentes de internet, e sim mentiras de grande envergadura, meticulosamente construídas, e que subsidiam ações violentas de governos imperialistas para destruir países inteiros e subjugar suas populações.

O Levante publicou uma excelente matéria sobre o tema, que eu reproduzo abaixo. É uma matéria que eu avalizo totalmente. Aliás, sugiro que leiam também o post do Levante explicando o ato que fizeram diante da Globo, no Rio e em Brasília.

No site do Levante da Juventude

Na Venezuela, quem dá o golpe é o parlamento

O que de fato está acontecendo na Venezuela? Essa é a primeira pergunta que todos nós, que desejamos e lutamos por um América Latina livre e soberana devíamos fazer antes de reproduzir notícias falsas fabricadas nas redações da mesma mídia golpista que derrubou o governo eleito democraticamente no Brasil.

A morte de Hugo Chávez e a crise internacional fizeram com que a complexa situação na Venezuela entrasse em outro patamar. A direita venezuelana colocou em marcha uma nova estratégia para derrubada do governo, pois a tentativa fracassada de golpe clássico em 2002 – uso de setores das forças armadas e sequestro do presidente – lhe impôs quase uma década de derrotas. A atual estratégia é a mesmo aplicada no Paraguai em 2012 e no Brasil em 2016, porém com intensidade correspondente ao conflito do país: utilizar as vias legais para dar o verniz democrático ao golpe parlamentar.

A crise econômica internacional – que provocou a queda brutal nos preços do barril de petróleo (de 125 dólares em 2012 para 50 hoje) – impôs a Venezuela, quarta maior produtora de petróleo do mundo, mudanças econômicas profundas. Assim como a maior parte dos países do mundo, ela viu sua economia perder recursos e, com isso, seus programas e medidas que beneficiavam o povo pobre passaram a enfrentar grandes dificuldades. Estas dificuldades foram muito bem utilizadas pela oposição para criar uma situação de ingovernabilidade e caos através da guerra econômica declarada pela burguesia e, portanto, forçar a renúncia ou a retirada de Maduro do poder. Neste contexto, a oposição conquistou maioria do Parlamento nas eleições de 2015.

De lá para cá, praticamente todas a medidas de recuperação econômica enviadas pelo poder executivo ao congresso foram automaticamente rejeitadas e, assim, aprofundam e atrasam qualquer possibilidade de recuperação da economia gerando enormes sacrifícios ao povo venezuelano como o desabastecimento resultante da guerra econômica. A escalada do conflito obrigou então o governo a adotar uma série de medidas legais para continuar governando o país mesmo com a declarada sabotagem do parlamento.

A nova escalada do conflito tem início em 9 de janeiro de 2107, quando a Assembleia venezuelana simplesmente decidiu não reconhecer o presidente eleito como chefe da nação. Alguém viu a mesma gritaria como agora? Alguém viu a palavra “golpe” ser usada nesse caso? Não, nenhuma palavra sobre uma Assembleia que simplesmente resolveu destituir o presidente eleito, rompendo com a constituição daquele país. Diante disso, uma série de leis especiais foram promulgados pelo governo, visto que agora a Assembleia não somente faz oposição e sabota mas, também, desconhece legalmente o presidente. A partir de então, o conflito entre poderes passa a ser um fator constante e o TSJ – Tribunal Supremo de Justiça -, equivalente ao STF no Brasil, passa atuar para a sua resolução.

O que de fato ocorreu na última semana?

Não foi, nem de perto, um “autogolpe” como saíram às pressas a proclamar nas redações da mídia golpista e, infelizmente, nas análises de setores da esquerda. O TSJ já havia solicitado que a Assembleia não nomeasse três deputados eleitos pelo Estado do Amazonas que, comprovadamente, cometeram crimes eleitorais (imaginem se o STF resolve de fato atuar aqui nessas questões…) e que, portanto, não deveriam ser empossados. Por se tratarem de três opositores ao governo a Assembleia descumpriu a ordem do TSJ (lembram do caso Renan e STF?) e, dessa forma, o TSJ considerou a Assembleia incapaz de cumprir suas funções e assumiu o controle dessas.

Em nenhum momento o parlamento foi fechado ou dissolvido, muito menos a pedido do executivo. Portanto, em nenhum momento se descumpriu a constituição e a lei e nenhuma ditadura foi implantada. Isso tudo só existiu na bem articulada rede golpista que, através de suas mídias, rapidamente divulgou uma avalanche de mentiras e cenas de uma ditadura que nunca existiu. O governo de Nicolas Maduro atuou inclusive para restabelecer a ordem, pois acatou a interpretação de inconstitucionalidade proferida pela procuradora-geral e, através do Conselho de Defesa do país (órgão previsto na constituição venezuelana) solicitou ao TSJ que revisse a decisão e devolvesse o poder da Assembleia aos parlamentares.

Portanto, estamos diante de uma articulação que já derrubou dois governos legítimos na América Latina com este mesmo método. É mais uma tentativa de golpe por parte da direita venezuelana via parlamento e grande mídia continental – que conta agora com a força do governo golpista brasileiro que reuniu as pressas o Mercosul para expulsar e isolar a Venezuela. Por sorte, a Venezuela conta com um Judiciário que não se acovarda nem se rende diante dos golpistas como no Brasil.

É dever nosso defender esse projeto de soberania e que luta bravamente em meio à crise e problemas internos, que são manipulados pelos inimigos que nada desejam a não ser a volta ao modelo servil e de miséria que reinava na Venezuela. Denunciar essa rede de mentiras é a tarefa para manter um presidente eleito democraticamente de um país símbolo de soberania diante do imperialismo e de conquistas inigualáveis para o povo latino-americano nas últimas décadas.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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