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Exclusivo! David Miranda conta ao Cafezinho sobre os bastidores do vazamento do século

(Foto: Facebook de David Miranda) Tem aquela frase – que hoje soa meio antipática e machista – de que “por trás de um grande homem, há uma grande mulher”. No caso de Glenn Greenwald, se poderia dizer, tranquilamente, que por trás de um grande homem há um outro grande homem. E vice-versa. O escândalo envolvendo […]

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(Foto: Facebook de David Miranda)

Tem aquela frase – que hoje soa meio antipática e machista – de que “por trás de um grande homem, há uma grande mulher”.

No caso de Glenn Greenwald, se poderia dizer, tranquilamente, que por trás de um grande homem há um outro grande homem. E vice-versa.

O escândalo envolvendo as revelações de Edgar Snowden desvela outras histórias além daquela principal, sobre a espionagem em massa do governo americano, que ainda não foram devidamente contadas. Como, por exemplo, a história da blogosfera política americana, que Glenn e Miranda ajudaram a construir. Essa blogosfera produziu uma massa crítica sem a qual  Snowden não teria existido.

Provavelmente Snowden jamais se decidiria a revelar ao mundo os segredos sombrios, chocantes, do governo americano, não fosse a constituição, desde meados dos anos 2000, de uma blogosfera americana sólida, independente e, sobretudo, antihegemônica.

O Glenn que o mundo conhece hoje, um dos jornalistas mais respeitados dos Estados Unidos e do mundo, talvez jamais existisse, não tropeçasse, numa ensolarada tarde do verão carioca de 2005, com David Miranda, um atlético garoto de vinte anos de origem muito simples.

Do encontro dos dois, daquela relação de amor, nasceria a força moral que abalaria os alicerces do império.

Sem Glenn, não temos certeza se a história de Snowden seria contada com tanta coragem e honestidade como foi. E sem David como seu braço direito, em questões de trabalho e coração, talvez não existisse Glenn.

Por isso, é importante conhecer os bastidores dessa bonita história, de amor, trabalho, aventura, risco, e vitória, que marca a relação entre Glenn e David, e a relação de ambos com o mundo.

É roteiro para mais um filme.

Culminando a aventura, David Miranda tornou-se, em 2016, desbancando candidatos patrocinados por estruturas milionárias, um corajoso vereador na cidade do Rio de Janeiro, disposto a comprar qualquer briga para ajudar as camadas mais humildes da população. E aqui confesso, com orgulho: eu votei em David Miranda.

Foi este David moderno o único que conseguiu, até o momento, acertar uma pedrinha semiótica na testa do Golias brasileiro, a família Marinho, fazendo-o sangrar em público.

No dia 22 de abril de 2016, Miranda publicou um artigo tão duro, tão dolorosamente verdadeiro (e à luz de tudo que aconteceu desde então, profético), no The Guardian, sobre o papel sórdido da Globo na orquestração do golpe, que um dos irmãos Marinho, a família mais poderosa e rica do país, desceu do palácio ancien regime onde vive isolada, para fazer um comentário cínico em defesa de seu monopólio.

Na segunda-feira, estive no gabinete do vereador, uma sala simples no sétimo andar de um prédio na Cinelândia, para conversar um pouco sobre essas histórias.

Partilhamos abaixo os trechos mais importantes dessa conversa.

Agradeço, encarecidamente, à jornalista Lia Bianchini pela agilidade e competência na transcrição do áudio.

***

O Cafezinho: David, só pra gente se situar: como você conheceu o Glenn Greenwald e como você começou a trabalhar com ele?

David Miranda: Eu conheci o Glenn ali na Farme de Amoedo, em Ipanema. Eu estava jogando futevôlei com uns amigos meus e o Glenn estava sentado, tomando caipirinha ali. Eu chutei a bola, bateu perto do negócio da banquinha que tinha lá e derrubou o drink dele, aí eu fui pedir desculpa e tal, a gente ficou se olhando, flertando, e a gente começou a sair depois, naquela noite. Então, a gente se mudou pra mesma casa em cinco dias.

O Cafezinho: Isso foi em que data?

David Miranda: Isso foi no dia 19 de fevereiro de 2005. A gente se mudou para o mesmo apartamento cinco dias depois e a gente continua juntos hoje, depois de 12 anos.

O Glenn, eu o conheci, ele era advogado. Ele começou a escrever em outubro de 2005, a gente estava juntos já tinha uns seis meses. Em fevereiro de 2006 foi lançado o primeiro livro dele, o “How Would a Patriot Act?”, e eu vi que tinha a possibilidade de a gente começar a trabalhar muito com isso juntos. Eu estava fazendo supletivo, terminei e comecei a fazer faculdade. Passei pra PUC e pra ESPM. Como eu já estava trabalhando com ele em viagens, fazendo a relação todinha de manager (desde fechar contrato, ver qual evento, pegar carro, era bem aquele serviço básico, porque éramos só eu e ele, no começo foi muito assim).

Eu fui pra área de marketing e comunicação, porque eu queria ajudar exatamente nessa parte, em toda essa esfera. Marketing serviu muito, eu consegui escolher bons títulos de livro pra ele, consegui encaixá-lo em matérias em vários lugares diferentes. Acho que no final de 2006, ele foi pro Salon, que foi uma revista online, pra onde ele levou o blog dele. A gente fez um acordo com eles, onde ele poderia ter liberdade.

O Cafezinho: Ele foi pro The Guardian mais tarde, né?

David Miranda: Isso, mas foi em 2012. A gente foi, eu trabalhei um tempo no The Guardian com consultoria e também como jornalista.

O Cafezinho: O Glenn começou a escrever em 2005, por conta própria. Aí mais tarde, ele começa a escrever pra esse Salon, que é um blog americano.

David Miranda: Isso. E aí, depois, ele escreveu mais dois livros, se eu não me engano, e aí a gente já estava participando da blogosfera, que foi aquele movimento dos blogs nos Estados Unidos, que cresceu muito, já estava grande em 2006. Isso, no Salon ainda. Teve uma grande estrutura, os blogs dos Estados Unidos se auto-organizaram e tinham um evento anual e eles fizeram essa superestrutura e lá tiveram bastante crescimento. A gente fazia a construção desse movimento lá nos Estados Unidos.

O Cafezinho: Ajudando a organizar, a articular?

David Miranda: Isso, eram grupos que se encontravam uma vez por ano, numa grande conferência, mas a gente tinha e-mails para contato direto, troca de artigos e matérias, para potencializar o alcance também.

E aí, em 2010, teve a grande abertura com o WikiLeaks, daquele hack-ativismo, o Glenn tinha se tornado muito grande e a gente se tornou um importante aliado [do Wikileaks], a gente foi um dos primeiros a levantar dinheiro pro WikiLeaks, quando isso ainda nem era tão conhecido, antes de eles fazerem aquele grande vazamento. O governo dos Estados Unidos, em 2009, tinha um documento classificado, que vazou, que os EUA estavam botando como alvo o WikiLeaks, que era uma organização muito perigosa, e aí foi quando a gente fez uma arrecadação de dinheiro para ajudar o WikiLeaks.

O Cafezinho: Isso em 2009…

David Miranda: 2009, 2010. Antes do grande vazamento. A gente ajudou bastante. A Laura [Poitras, diretora do documentário Citizenfour] também começou a trabalhar [nessa época, com o tema Wikileaks]. Mas a gente só veio a ter contato com a Laura em 2012.

O Cafezinho: Ela está no The Intercept, hoje?

David Miranda: Ela saiu do The Intercept e está no Field of Vision, que é uma divisão, fora do Intercept, onde ela faz toda a parte de documentários gráficos. Nasceu dentro do The Intercept, mas saiu e virou sua própria célula, tem um budget separado, ela tem toda a equipe dela, tem o próprio escritório, então, a Laura não faz mais parte do The Intercept hoje. No The Intercept, só o Jeremy Scahill e o Glenn, que são os editores fundadores. A Laura ganhou o Oscar pelo Citizenfour e também fez o documentário sobre o Assange, bem controverso.

Em 2011, a gente começou o relacionamento com o The Guardian, eles sempre pediam para o Glenn fazer algum artigo, uma vez a cada quatro meses eles faziam isso. E a gente estava começando a ter um público legal. Em 2012, em abril de 2012, eu sentei com o Glenn e conversei com ele, porque tinha acabado de chegar uma ordem de pagamento do The Guardian, e eu falei “porque a gente não muda do Salon para o The Guardian?”, aí a gente começou a negociação, que culminou em julho de 2012, quando a gente fechou contrato com eles e, em agosto, o Glenn mudou pra lá. No final de agosto, teve uma grande história, que a gente fez, sobre o CNN, que uma jornalista de lá tinha sido assediada, e foi uma história muito forte, foi um divisor de águas. Quando a gente chegou, já criou um grande impacto lá. Dezembro de 2012, foi quando o Snowden entrou em contato com a gente pela primeira vez, enviando os e-mails, pedindo pra gente poder fazer a instalação do e-mail com criptografia, tentando ensinar a gente como fazer.

Aí, o Snowden entrou em contato com a gente em 2012 e a gente não deu muita bola, achando que ele era um louco e tal e aí ele entrou em contato com a Laura em fevereiro/março de 2013. A gente estava numa viagem no norte de Nova Iorque e a Laura encontrou com a gente lá, em abril. E ali foi muito intenso, em seis meses, eu acho que a gente viveu dois anos. Ela encontrou com a gente, mostrou alguns fragmentos e tal e em maio, dia 25, o Snowden já tinha saído dos Estados Unidos e ido pra China. Aí ele foi pra lá e começou a combinar com a gente.

O Cafezinho: Ele tinha ido pra China, só que ainda estava dentro da NSA?

David Miranda: Acho que ele já tinha saído. Só que ele não era da NSA, ele era da CIA. Ele trabalhou lá como agente e teve acesso aos documentos da NSA. Aí ele pegou e levou esses documentos. Acho que ele foi no dia 20 de maio de 2013 pra lá, se não me engano. Eu e o Glenn sentamos no dia 25 de maio, ficamos umas cinco ou seis horas conversando sobre tudo que ia mudar nas nossas vidas se essas publicações fossem reais – e eu tinha a minha banca de TCC na ESPM, estava me formando, então, eu não fui pra China com eles.

O Glenn foi pra Nova Iorque, encontrou a Laura e o jornalista britânico que estava com eles lá (que o Guardian só botou ele lá porque nem o Glenn nem a Laura têm diploma de jornalista, então eles queriam botar alguém de extrema confiança, que trabalhou com eles a vida inteira), e aí os três foram pra lá e depois disso se deu toda aquela situação.

A gente se falava constantemente por telefone. Se vocês vissem o quanto de material que a Laura tinha. Ela é muito boa, ela consegue captar todo o movimento, toda a tensão do lugar. Tinha muito material, meu, do Glenn, do Snowden. Ela filmou vários lugares.

E a gente começou a fazer as publicações de lá mesmo. A gente tinha que fazer a negociação pra ele ganhar a publicação no nome dele. Tinha um jornalista do Washington Post, que tinha ganho um Pulitzer já, interessado na história, e a Laura entrou em contato com ele. Ele não viajou, não estava arriscando a vida dele, o Glenn viajou o mundo inteiro, chegou lá pra poder conseguir as informações, foi ver o real lá com a fonte. E aí foi uma correria, né, porque se o cara do Washington Post fosse o primeiro a publicar, então, o crédito todo da história seria pra ele. Aí o Adam, que é o editor chefe do The Guardian no mundo, tinha pego o avião, da Inglaterra para os Estados Unidos. Eu falei: “Glenn, a gente precisa publicar isso agora”. Quem estava no controle era a editora chefe do The Guardian nos Estados Unidos, a Janine. A Laura não estava querendo publicar enquanto o Adam não chegasse lá. Então, eu falei com o Glenn: “a gente vai sair, você vai escrever um e-mail agora pra ela falando que se não for publicado até às cinco da tarde, você vai se demitir e a gente vai pegar os documentos, vai levar pra outro lugar e vai publicar”. Foi aí que a gente criou a ideia do The Intercept, que começou como NSAleaks.com, que a gente tinha pensado – ele descreve isso no livro, é bem interessante – mas acabou que a gente conseguiu fazer pressão o suficiente [para publicar no The Guardian]. O Jeremy [Scahill] estava no The Nation e a nossa editora chefe também estava lá e eles queriam publicar. Aí eu falei: “não, ou a gente publica no The Guardian ou a gente publica sozinho e arruma um montão de jornalistas independentes no mundo pra poder fazer isso com a gente” e ali que, cinco meses depois, a gente criou o The Intercept.

O Cafezinho: Teve a ideia, né, mas a história foi publicada no The Guardian?

David Miranda: Isso, foi publicado no The Guardian. A gente conseguiu publicar. Foi o primeiro, a história passou a ser dele, tanto que ele ganhou o Pulitzer. Aí foi um trabalho muito difícil depois disso, porque eram todos os jornais do mundo inteiro entrando em contato com a gente. Eu conversava mais com os jornalistas e tinham duas coisas que a gente precisava sempre: eles tinham que entregar o material pra gente antes de publicarem, pra gente dar o OK. Sempre tínhamos que dar o OK e a gente fez isso com mais de 30 países, trabalhamos com França, Índia, Holanda, Nova Zelândia, Austrália. Inclusive, ele está na Austrália agora, fez mais publicações lá essa semana.

Aí, a Laura veio para o Rio de Janeiro, fazer a análise dos documentos com a gente. A gente fez mais publicações. A Laura trabalhou muito com o Der Spiegel, que é um jornal alemão, ela estava baseada lá na Alemanha, fazendo edição do filme, aí ela voltou do Rio e foi pra lá. Sendo que um dos arquivos que estavam com a gente, que era sobre o DCHQ, que é o comando da Inglaterra, de análise deles, que o Snowden entregou pra gente, estava com o arquivo corrompido e a gente não conseguia acessar. A Laura, que tinha muita experiência nisso, conseguiu fazer esse acesso. E ela não podia enviar aquilo pelos Correios, então, tinha que ser uma pessoa de confiança que pudesse ir lá e pegar. O Glenn, naquela época, a gente não sabia se ele podia sair do país, então, eu me prontifiquei a fazer isso. Enquanto isso, o Snowden tinha saído da China e já estava na Rússia.

A Laura voltou para a Alemanha, sem problemas. Antes de sair de casa, quando o Glenn estava me levando pra poder pegar o táxi para o aeroporto, eu ainda falei com ele: “eu vou pro Heathrow [aeroporto de Londres], você não acha que vai dar problema passar por lá, não?”. E aí eu fui, fiz a conexão, tranquilo, na volta que eu tive problema.

O Cafezinho: Seu destino final era a Alemanha?

David Miranda: É, então, eu fui na Alemanha para fazer duas coisas: pegar os documentos e fazer a estratégia de comunicação com a Laura. Eu conversei sobre a estratégia de distribuição que a gente ia fazer, qual forma a gente ia fazer. Aí, a gente fez umas quatro reuniões sobre como seria o filme, o quanto de material que a gente tinha, qual seria a abordagem ali. E aquele período ali a gente tinha muito material, a gente ia fazer só sobre a China. Acabou que a gente fez sobre a China, sobre o desenrolar da história, o que aconteceu com a gente nesse período e colocamos informações de outras pessoas, como os agentes, como especialistas na área e ficou um filme bem completo. Foi maravilhoso.

Mas aí, quando eu estava voltando, eu fui detido no aeroporto. Fiquei 12 horas lá: 9 horas dentro de uma sala, sendo interrogado, 8 horas e 15 minutos sem acesso ao mundo exterior, à qualquer outra pessoa, sete agentes diferentes me interrogando, só com uma camisa básica, num lugar sem janela, com uma câmera ligada no canto, uma máquina para poder coletar impressões digitais, duas cadeiras, uma mesa, um quadro, que falava os horários e as orações do Alcorão (porque, dentro dessa lei, 90% dos que são parados são homens de cor escura ou muçulmanos).

O Cafezinho: Essa lei que você fala é a lei antiterrorismo?

David Miranda: Antiterrorismo, de 2000. Dentro dessa lei, só pra você saber, você não tem o voto de silêncio, você não pode ficar em silêncio. Porque, dentro dela, especifica que se você não cooperar com o agente, ele pode te dar ordem de prisão de imediato. Então, cooperar está implicado que se você não falar e não responder, você não está cooperando com ele, você vai pra cadeia.

O Cafezinho: Estado de exceção mesmo.

David Miranda: 9 horas que eles podem segurar você. Então, a primeira parte, quando eles têm que me falar sobre qual lei eles estão cumprindo, eles não me deram um intérprete, então, foi na minha segunda língua, o inglês, o tempo todo eu não tive acesso a ninguém que falasse português. Aí, você tem uma ligação para alguém tomar conta dos seus negócios, das coisas que você deveria estar fazendo naquele período. Então, eu mandei ligar para o meu marido, mas só conseguiram falar com o Glenn depois de três horas. Você pode ter acesso a um advogado do sistema (uma ligação) ou o advogado que eu escolher. Aí, eu escolhi meu marido. Quando eles perguntaram se ele tinha licença pra poder legislar lá, eu falei “com certeza”, mas eu sabia que era mentira, que ele não tinha, mas que eles iam entrar em contato com ele. E aí procuraram e falaram pra mim que o Glenn não estava no sistema e eles vieram com um telefone pra eu poder falar com o advogado que eles queriam me dar. Eu só tinha uma ligação, eles queriam me dar o telefone. Eu recusei o advogado do sistema deles e falei “vocês vão entrar em contato com o The Guardian, eu sou um jornalista do The Guardian e vocês precisam entrar em contato com eles, eles vão mandar meu advogado aqui”. Aí eles entraram em contato com o The Guardian e o The Guardian enviou meu advogado, mas só depois de oito horas e quinze minutos.

O Cafezinho: O advogado chegou já no final, então? Você ficou quanto tempo, no total?

David Miranda: Eu fiquei 12 horas. Só podiam me deter dentro daquela sala por 9 horas. As outras três foram do lado de fora, que eles ficaram segurando meu passaporte, pra poder conseguir a passagem para voltar para o Brasil.

O Cafezinho: Eles falaram pra você o que a lei dizia?

David Miranda: Eles só podem me deter ali, eles tem que me soltar depois desse período de nove horas ou eles têm que me prender. E aí, se eu não cooperar com eles, eles podem me dar ordem de prisão a qualquer momento. Ou seja, é um interrogatório, em que eles utilizam a ameaça de que você vai pra prisão a todo minuto quando você não responde a uma pergunta. Eles ameaçavam o tempo todo.

O Cafezinho: Qual expressão eles usavam?

David Miranda: “You are going to jail”. Eu, o Oliver Stone e o Glenn, em outubro de 2012, a gente estava fazendo uma série de conversas sobre como a gente poderia fazer uns documentários sobre as famílias dos prisioneiros de Guantánamo. E ali eu já sabia, porque tinha um livro com várias histórias sobre os presos e como eles foram presos e tal, e eu sabia que, quando você mexe com os Estados Unidos e seus aliados, ou eles vão matar você ou eles vão te botar em Guantánamo, para servir como exemplo. Eu achei que eu ia rodar ali. Na minha cabeça só passava assim “ainda bem que sou eu e não é o Glenn. Ele vai poder fazer muito barulho lá fora com isso. Ainda bem que não é o Snowden, não é a Laura”. Esse período foi muito interessante, porque a gente se conectou muito. Eu, o Snowden, a Laura e o Jeremy.

Depois eles me liberaram do aeroporto, mas pegaram meu celular, meu computador, meu smartwatch, meu PS Vita, pegaram tudo e ficaram, nunca mais me devolveram. Pegaram os dois pen drives, mas nunca conseguiram acessar, porque estavam em alta criptografia. Pra quebrar aquela criptografia, acho que precisavam de nove ou dez anos.

O Cafezinho: Uma coisa que eu fiquei curioso, foi a primeira vez que o Snowden enviou e-mail pra vocês e vocês acharam que era só um louco e que não era verdade. Você lembra como era esse e-mail?

David Miranda: Não lembro exatamente qual era o conteúdo, porque faz muito tempo. E foi ele que falou com a gente. Quando ele entrou em contato com a Laura, ele explicou pra ela que já tinha entrado em contato com a gente, mas a gente não estava respondendo aos e-mails dele.

O Cafezinho: Vocês tinham visto, mas vocês não tinham acreditado?

David Miranda: Se você tiver noção da quantidade de e-mails que eu recebo….

O Cafezinho: Mas vocês chegaram a ver o e-mail dele?

David Miranda: Chegamos a ver. A gente recebe coisas do tipo: implantaram um chip na minha cabeça, coisas assim. Hoje em dia, eu sou muito mais aberto a isso, mas não tem como saber se é verdade ou não. Imagina, em 2012, pensar que o governo dos Estados Unidos estava espionando…não tinha essa crença, não.

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Miguel do Rosário

Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.

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NRA Borges

27/08/2017 - 20h50

Nem o PT parece ter tido noção do alcance dos interesses internacionais. Há já algum tempo assisti a um programa na TV onde estrategistas políticos do governo então vigente do PT comentavam que a oposição – i.e., o PSDB e aliados – eram inoperantes: não sabiam fazer seu papel. Depois do desmonte que começou em 2013 e culminou com o impeachment será que ainda têm a mesma opinião?

ana s.

26/08/2017 - 16h12

O cara fala como se fosse coautor de tudo que Greenwald fez e faz. É um tal de “EU, o Oliver Stone e o Glenn…” Até aí, fica por conta do casal. Mas ele fala como se tivesse participado diretamente da preparação do documentário Citizenfour, de Laura Poitras! Se for verdade, esqueceram de colocar o nome dele nos créditos:

“Aí, a gente fez umas quatro reuniões sobre como seria o filme, o quanto de material que a gente tinha, qual seria a abordagem ali. E aquele período ali a gente tinha muito material, a gente ia fazer só sobre a China. Acabou que a gente fez sobre a China, sobre o desenrolar da história, o que aconteceu com a gente nesse período e colocamos informações de outras pessoas, como os agentes, como especialistas na área e ficou um filme bem completo. ”

Dá um tempo, né? O cara não sabe nem dizer qual era a vinculação de Snowden com a NSA – ele era de uma empresa terceirizada pela agência. Tinha sido da CIA, não era mais. Parece que ele nem leu o que o marido escreveu, que dirá ter sido coautor de tudo o que ele fez. Até eu, que só li uns trechos do livro de Greenwald sobre o caso, além de várias matérias, sei o que tinha nos primeiros e-mails que Snowden enviou pra ele: não adiantavam muita coisa, pois o informante queria que, antes, GG providenciasse criptografia; chegou a mandar um tutorial para instalação etc., etc. Outra: o Quartel General de Comunicações do Governo britânico tem como sigla GCHQ, e não DCHQ como ele disse (tá, pode ter sido erro d’O Cafezinho, que chamou Edward Snowden de Edgar).

O cara é um pastel e se elegeu vereador no vácuo do marido famoso. Com Gregório Duvivier e outros do tipo fazendo campanha pra ele. Esse é o eleitorado do PSOL que vive c***ndo regra pros outros. Meus sais!

Robson Segovia Chrysostomo

25/08/2017 - 17h00

Mil palvras e a reportagem nao disse nada…

RodrigoR

25/08/2017 - 10h13

Enquanto pessoas comuns lutam contra a espionagem americana, a esquerda brasileira brincou de espião nos 13 anos em que esteve a frente do governo.

O que fez o PT enquanto esteve no governo? Estruturou a inteligência brasileira, criou mecanismos contra o assédio americano? Não…..fizeram governabilidade p outros.

    ana s.

    26/08/2017 - 18h49

    Mas vc não sabe que tudo de errado que existe no mundo é culpa do PT? Até o nazismo.

Moyses

25/08/2017 - 09h41

…”em 2012, pensar que o governo dos Estados Unidos estava espionando…não tinha essa crença, não.”
É interessante ler isto! Um dos responsáveis por revelar o maior escândalo do “abuso de poder” do planeta, até então… ser um cético. À nós, crentes das “conspirações” falta, além de maior conhecimento, palavras e formas que nos ajudem a abrir a mente de todos para que estas “teorias” sejam vistas na forma que elas realmente são: A utilização de todo o sistema à favor de poucos, com benefícios aos próprios que jamais serão compreendidos na sua totalidade!

Josinaldo Sobreira

24/08/2017 - 20h32

Maravilha de entrevista!


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