Nem Bolsonaro foi tão aplaudido, nem Ciro foi tão vaiado, na CNI

As pessoas estão exagerando um pouco o que houve na sabatina com candidatos na Confederação Nacional da Indústria (CNI).

As palmas para Bolsonaro foram cerca de dez, mas não foram tão relevantes.

As vaias a Ciro, por sua vez, em relação à sua crítica à reforma trabalhista, foram pequenas, rápidas e circunscritas a um pequeno grupo. Elas vieram após o candidato dizer que irá chamar as “centrais sindicais” para a mesa de diálogo.

Assistam ao vídeo abaixo.

No caso de Ciro, além das vaias serem curtas, foram seguidas de palmas. E aqui cabe um comentário: a personalidade colérica de Ciro é positivamente engraçada. Ele parece não dar a mínima para o risco de perder votos com isso. Irritado com as vaias dos empresários, ele reage elevando a voz e dizendo que “pois é, é assim que vai ser”.

Vamos a Bolsonaro.

Tive o cuidado de assistir há pouco, com um bloco de notas aberto na metade da tela, à sabatina de Jair Bolsonaro no evento da CNI. Minhas anotações podem ser vistas aqui.

Ele não foi tão aplaudido assim, muito menos foi aplaudido “de pé”. Ou pelo menos não vi ou ouvi isso no vídeo disponibilizado pela CNI. Se alguém que participou do evento viu palmas mais efusivas, relate por aqui.

E nem sempre foi aplaudido por suas opiniões “fascistas”. É importante frisar essas informações porque corremos o risco de vulgarizar nossas denúncias contra o fascismo, e acusar os representantes dos industriais de opiniões que eles não tem.

A sociedade brasileira já está bastante polarizada. Não sei a quem interessa ampliar essa polarização, e pintar os adeptos do Bolsonaro, os adversários do campo popular e os fascistas, como mais numerosos do que realmente são.

A primeira palmas que ele recebe é quando, após dizes que irá botar “alguns generais nos ministérios, caso eu chegue lá”, afirma que presidentes anteriores “botaram terroristas e ninguém fala nada”.

Não foram palmas tão efusivas, nem homogêneas. Pareceu-me que o candidato tinha um grupo de eleitores na plateia.

A segunda salva de palmas, suaves e muito localizadas, vindas provavelmente do mesmo grupo, acontece quando Bolsonaro diz que “os trabalhadores terão que decidir: menos direitos e emprego, ou todos os direitos e desemprego”.

É música para os ouvidos de patrões. Mas acho que seja exagero chamá-los de fascistas. No mundo inteiro, a categoria dos patrões é antipática aos direitos trabalhistas. Bem, talvez os patrões suecos sejam mais esclarecidos, mas até lá deve ter um monte de patrão conservador.

A terceira salva de palmas, igualmente suavez e localizadas, veio quando Bolsonaro disse que “não queria ser patrão no Brasil com essa legislação”.

Frase bobinha, dita com intenção de bajular o público presente.

A quarta salva de palmas, dadas com a mesma intensidade das anteriores, vem quando Bolsonaro fala, numa de suas digressões confusas e incoerentes, tentando responder a uma pergunta sobre educação (e não respondeu), que era “contra as cotas”.

O motivo da quinta salva de palmas é engraçado. Bolsonaro não sabe nada de nada. Ele mesmo confessa sua ignorância. Ainda na resposta a pergunta sobre educação, o candidato disse que “a melhor resposta é dizer: não sei. Não faremos nada da nossa cabeça”. Pausa para rir. Por incrível que pareça, essa resposta idiota mereceu palmas, mas suaves e vindas do mesmo grupo localizado.

A sexta salva de palmas se deu quando Bolsonaro, respondendo pergunta sobre a construção de apoio parlamentar, disse que não iria “conversar com esses 3 ou 4 partidos”, referindo-se obviamente a legendas de esquerda.

“Não quero botar um busto do Che Guevara no palácio do Planalto”, diz o candidato, e aí vem as palmas, suaves.

A sétima salva de palmas, também suaves, se dá quando Bolsonaro diz a seguinte frase:

“Os senhores podem errar comigo. Com os outros, já erraram”.

Encerrada a etapa das perguntas, Bolsonaro agradece os ouvintes e recebe palmas suaves, educadas, desta vez não a alguma frase de efeito, mas palmas formais de despedida de um palestrante.

O apresentador, no entanto, diz que Bolsonaro ainda tinha 5 minutos para as considerações finais.

Bolsonaro diz que estava “indo embora”. Ele não tem mais o que falar. Então começa a enrolar. Diz que será eleito se esta “for a vontade de Deus”.

Aí fala, meio que do nada, em Reagan, Margareth Thatcher, dá uma pirueta e bajula novamente a plateia, dizendo que “os patrões são os senhores!”

Aplausos, muito fracos, quase constrangidos.

Suas considerações finais são um pequeno resumo de bizarrias de extrema-direita: os “direitos humanos”, o “meio ambiente” e as políticas indigenistas são seu alvo preferido.

Bolsonaro se lamenta pelo presidente Michel Temer não ter conseguido vender aos estrangeiros aquela grande área amazônica, conhecido como Enca. Deixou claro que ele vai conseguir.

Num dado momento, Bolsonaro pergunta ao público: “passar fome nesse Brasil, como?” E aí menciona a possibilidade de se criar peixes em barragens.

Ainda teremos, nos minutos seguintes, três salvas de palmas, todas suaves e localizadas.

Bolsonaro ataca a demora do Ibama em liberar licenças ambientais para obras. Palmas.

Bolsonaro critica a mídia por olhar os empresários como “bandidos”. Palmas.

Despede-se definitivamente do público, que bate palmas educadamente, em agradecimento, e se levanta para a hora do almoço.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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