Sobre as estratégias da oposição para derrotar o genocida

Batemos mais um recorde hoje no número de mortes por conta da Covid-19 em um único dia: 1.726. Com os sistemas de saúde dos estados colapsando ou já colapsados e o número de novas infecções altíssimo, a tendência é que o quadro se agrave nas próximas semanas. O cientista Miguel Nicolelis publicou em seu Twitter que “ou o Brasil se tranca por pelo menos três semanas e amplia o número de vacinados de forma radical, ou nos transformaremos na maior catástrofe sanitária mundial do século XXI em poucos meses”.

Como o presidente do país continua sendo Jair Bolsonaro, o cidadão que passa seu tempo sabotando as únicas medidas eficientes contra a pandemia – máscara, lockdown, vacina –, o inferno que estamos vivendo neste momento pode mesmo ser apenas a antessala.

O impeachment precisa voltar à pauta do dia, de todos os dias, até que o genocida seja derrubado do poder.

Mas Brasília tem seus meandros, e a queda de Bolsonaro antes do fim do seu mandato é duvidosa. Esses meandros são evidentemente inaceitáveis diante da hecatombe que está aí, o que aponta para a necessidade de que um próximo governo digno deste nome amplie os mecanismos de participação popular, para que na eventualidade de termos novamente um presidente psicopata ou algo do tipo possamos ter meios para impedi-lo de continuar matando a população.

Por enquanto não temos esses mecanismos e nos é impossível sair às ruas para pressionar pela queda do Hitler Tropical. Há, portanto, boas chances de que Bolsonaro tenha de ser derrotado nas urnas em 2022. E, por mais chocante e ridículo e absurdo que pareça, ele aparece nas pesquisas de intenção de voto como favorito para as próximas eleições.

É um cenário que coloca ainda mais peso nas estratégias da oposição para 2022. Essas estratégias não poderiam estar mais bem delineadas, como se pôde perceber nos últimos dias, com mais um round do embate entre os campos petista e trabalhista. Vejamos qual estratégia parece mais acertada.

Ciro Gomes disse que “quem for contra o Bolsonaro no segundo turno tem tendência de ganhar a eleição”. Me parece uma análise acertada: Bolsonaro está matando brasileiros todos os dias com sua psicopatia, e matar milhares de pessoas não é exatamente um ativo eleitoral.

O pedetista disse a seguir que “o menos capaz disso é o PT”. Difícil discordar dessa frase. Bolsonaro, um político com limitações de toda ordem, foi o improvável vencedor da última eleição presidencial muito por conta do voto antipetista – impressão generalaziada em 2018 e corroborada por estudos como o que o autor Jairo Nicolau publicou em seu livro “O Brasil Dobrou à Direita”. Nas eleições municipais de 2020 o PT tampouco foi bem, especialmente nas grandes cidades. O partido sofreu um massacre midiático e judicial nos últimos anos, e Bolsonaro é seu grande antagonista. O resultado de um segundo turno entre essas duas forças é, na verdade, uma incógnita. É inegável, porém, que Bolsonaro tem boas chances de levar a eleição com esse cenário.

Ciro Gomes então conclui: “por isso, a minha tarefa é necessariamente derrotar o PT no primeiro turno”. É uma conclusão inescapável. Se não há hipótese de uma aliança entre PT e PDT no primeiro turno, é natural que a disputa entre os dois pela vaga no segundo seja nevrálgica.

Fernando Haddad, o candidato do PT, respondeu. Ele repetiu em uma entrevista um movimento já feito em outras ocasiões: jogar Ciro para a direita. Haddad colocou o trabalhista ao lado de nomes como Huck, Moro e Doria, apesar da diferença brutal de projetos. (A mistura de liberalismo econômico com assistência social implementada pelo PT no poder, aliás, não está distante do que Luciano Huck deixa antever em suas falas insossas.)

A estratégia da candidatura de Haddad é evidente: atrair o voto e a militância orgânica da parcela da população que se identifica com a esquerda para, assim, passar ao segundo turno. É uma tática um pouco desesperada e bastante tacanha: não se discute projeto ou estratégias para governar o país, mas sim a famigerada carteirinha de esquerdista. Como o PT lidaria com um Congresso, uma mídia e boa parte da população hostis ao partido, por exemplo? Porque não se trata apenas de ganhar a eleição, mas de ter capacidade de governar o Brasil e tirá-lo do buraco em que se meteu (e no qual segue despencando, em queda livre).

Uma saída (muito) mais honrosa para o Partido dos Trabalhadores (e muito mais consequente com o país) seria abrir mão de sua candidatura, para que o campo progressista garanta uma vaga no segundo turno com mais chances de ganhar a eleição e depois governar. O PT é grande, o PT governou esse país por 16 anos, o PT tem direito de lançar candidato, dizem alguns. Tudo isso é verdade, mas também é verdade, e uma verdade mais cortante, diga-se de passagem, que se o PT for para o segundo turno o risco de vitória do genocida é muito maior. Porque é este o tamanho do nosso problema: o genocida psicopata pode se reeleger.

Mas estou gastando meus dedos à toa. Ninguém mais espera um gesto desses do PT, e o fato é que talvez o apoio do partido a um candidato como Ciro seja mais prejudicial do que benéfico. O que apenas corrobora a conclusão do candidato trabalhista: sua tarefa é derrotar o PT no primeiro turno.

Assim como a tarefa do PT é derrotar Ciro para ir ao segundo turno – ou estou falando alguma mentira? O plano do partido não é jogar o país em mais uma disputa sangrenta entre o antibolsonarismo e o antipetismo, uma espécie de remake do filme de terror de 2018? Para que isso aconteça, é preciso vencer o candidato do PDT no primeiro turno, e é nesse objetivo que os estrategistas do partido estão, com certeza, trabalhando.

Talvez muita gente realmente acredite que o PT está apenas pensando em derrotar Bolsonaro e o Ciro, esse malvadão de direita, é que insiste em bater no PT. (“Ele foi pra Paris em 2018, afinal” – até Dilma Rousseff aderiu a esse mantra idiota.) Bem, para quem acredita que Fernando Haddad está à esquerda de Ciro, não deve ser difícil acreditar também nesse tipo de coisa.




Pedro Breier: Pedro Breier nasceu no Rio Grande do Sul e hoje vive em São Paulo. É formado em direito e escreve sobre política n'O Cafezinho desde 2016.
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