Haddad critica elite econômica e questiona: “Nós contra eles ou eles contra nós?”

AGêNCIA BRASIL

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fez críticas diretas ao comportamento de parte da elite econômica brasileira em relação às políticas de redistribuição de renda adotadas pelo governo federal. Em entrevista concedida ao portal Metrópoles, o ministro reagiu a manifestações nas redes sociais que, segundo ele, são promovidas por setores do 1% mais rico da população contrários às medidas de justiça social.

“Como é razoável que 1% da população faça esse inferno na internet dizendo que nós estamos colocando ‘nós contra eles’? Nós quem? 99% contra 1%? Como assim?”, questionou o ministro, referindo-se ao que considera uma reação desproporcional de grupos privilegiados diante de propostas que buscam maior equilíbrio na tributação.

Durante a entrevista, Haddad apontou que o sistema fiscal brasileiro tem favorecido os mais ricos, ao mesmo tempo em que impõe cargas maiores à maioria da população. “Se eles não pagam nem o que nós pagamos… esse 1% não quer pagar nem o que os 99% pagam. Então, a pergunta é: nós contra eles ou eles contra nós?”, afirmou.

O titular da Fazenda utilizou o espaço para retomar um diagnóstico recorrente na política econômica do governo federal: o chamado “voo de galinha” — expressão usada para descrever ciclos breves de crescimento econômico sem sustentação no longo prazo. Para ele, esse padrão se repete porque grande parte da população não tem renda suficiente para sustentar um modelo de desenvolvimento contínuo.

“O voo de galinha acontece porque as pessoas não têm renda. Não têm renda”, reforçou o ministro, relacionando a desigualdade de renda à instabilidade da economia brasileira nas últimas décadas.

Haddad também citou um estudo encomendado por sua equipe para evidenciar a posição do Brasil no cenário global de desigualdade. Segundo ele, o país apresenta índices de concentração de renda superiores aos de 47 nações africanas. “O Brasil é mais desigual do que 47 países africanos, que a América Latina é o continente mais desigual do mundo. Nós queremos concordar”, afirmou, sugerindo que o país permanece distante de um modelo de justiça distributiva.

De acordo com os dados mencionados pelo ministro, apenas sete dos 54 países africanos analisados apresentaram índices de desigualdade superiores aos do Brasil. O estudo reforça a ideia de que, apesar do tamanho da economia brasileira, os ganhos de crescimento não têm sido distribuídos de forma proporcional entre a população.

Nesse sentido, Haddad destacou a contradição entre o desempenho econômico do país e a realidade social enfrentada pela maioria dos brasileiros. “Nós devemos comemorar o fato de que, de novo, estamos entre as dez maiores economias do mundo, de novo com o governo Lula, mas continuamos entre as dez piores economias do mundo do ponto de vista da igualdade social, da distribuição de renda”, declarou.

O ministro também abordou o papel da elite econômica na manutenção desse cenário. Segundo ele, há uma resistência organizada por parte de grupos que usufruem de benefícios fiscais e que utilizam seu alcance digital e institucional para criticar propostas de mudança. A crítica é dirigida especialmente aos que se posicionam contra reformas tributárias voltadas à ampliação da base de arrecadação e ao combate à desigualdade fiscal.

“Olha, ou a gente começa a colocar o dedo nas feridas históricas do Brasil, eu estou falando de feridas de 500 anos”, disse Haddad ao final da entrevista. Para ele, enfrentar as disparidades estruturais do país exige que o debate sobre justiça fiscal vá além do discurso político e seja acompanhado de medidas concretas de inclusão e redistribuição.

A entrevista também evidencia a disposição do governo em manter uma linha de enfrentamento às estruturas que concentram riqueza. Sem mencionar nomes, o ministro associou a resistência à reforma tributária a setores influentes da sociedade que, segundo ele, mantêm privilégios mesmo contribuindo proporcionalmente menos com a arrecadação nacional.

“A crescente popularização das apostas impacta justamente o público-alvo da educação superior: brasileiros de 18 a 35 anos”, disse, em outro momento, ao abordar a interferência de gastos supérfluos no orçamento das famílias — argumento que o governo tem usado para justificar políticas fiscais mais agressivas.

A fala de Haddad ocorre em meio à tramitação de propostas no Congresso Nacional que tratam da taxação de grandes fortunas, revisão de isenções fiscais e simplificação do sistema tributário. O governo busca apoio para aprovar mudanças que incluem a criação de um imposto sobre dividendos e a reestruturação do Imposto de Renda.

O tema divide a base aliada e encontra resistência em parte do setor produtivo, que vê nas reformas uma ameaça ao investimento. Para Haddad, no entanto, o objetivo é corrigir distorções históricas e garantir que o crescimento econômico venha acompanhado de maior inclusão social.

A entrevista ao portal Metrópoles foi publicada em meio à ofensiva do governo para ampliar a arrecadação sem aumentar impostos para a maioria da população. O plano inclui a taxação de fundos exclusivos, revisão de benefícios fiscais e combate à sonegação — temas que devem ser centrais no segundo semestre da agenda econômica do Planalto.

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