A recente imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não alterará os planos do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Segundo reportagem do Estado de S. Paulo publicada nesta quinta-feira (10), ministros da Corte ouvidos sob reserva afirmaram que o julgamento seguirá normalmente, com previsão para ocorrer entre o fim de agosto e o início de setembro.
A medida tarifária foi anunciada por Trump sob alegação de que o Judiciário brasileiro interfere em plataformas digitais e conduz processos contra Jair Bolsonaro. A iniciativa provocou tensões diplomáticas e movimentações internas no governo e no Judiciário brasileiro.
O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, telefonou para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quarta-feira (9) para tratar da repercussão diplomática da medida norte-americana. Conforme apuração do jornal, ficou definido que os ministros do Supremo não dariam declarações públicas sobre o tema. A resposta institucional ao governo dos Estados Unidos será conduzida exclusivamente pelo Ministério das Relações Exteriores.
Apesar da decisão coletiva de não se manifestar oficialmente, o ministro Flávio Dino fez uma publicação indireta em suas redes sociais. Em sua conta no Instagram, escreveu: “Uma honra integrar o Supremo Tribunal Federal, que exerce com seriedade a função de proteção à soberania nacional, à democracia, aos direitos e às liberdades, tudo nos termos da Constituição do Brasil e das nossas leis”. A declaração não mencionou Trump ou o episódio internacional, mas foi interpretada como recado institucional sobre o papel do STF.
O julgamento de Jair Bolsonaro é considerado central nos desdobramentos jurídicos dos atos de 8 de janeiro de 2023, apontados como tentativa de golpe contra o resultado eleitoral. Apesar de já ter sido declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ex-presidente ainda pode enfrentar ações penais no Supremo Tribunal Federal. De acordo com fontes ouvidas pelo jornal, a expectativa é de que o julgamento resulte em condenação.
A decisão de Trump foi interpretada por ministros do Supremo como um gesto político com alinhamento ao bolsonarismo. O argumento usado pelo presidente norte-americano de que o STF estaria “ultrapassando seus limites” é visto como tentativa de interferência em decisões internas do Judiciário brasileiro. Em maio, o secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, já havia indicado essa linha de ação ao anunciar restrições de entrada nos Estados Unidos a “funcionários estrangeiros e pessoas cúmplices na censura de americanos”, o que foi interpretado como referência ao ministro Alexandre de Moraes.
A ofensiva norte-americana também gerou impactos no setor produtivo. A tarifa afeta diretamente exportações brasileiras nos setores de carnes, frutas, aviação e siderurgia. Ainda assim, analistas citados pela reportagem apontam que os danos econômicos imediatos podem ser minimizados com o redirecionamento de exportações para mercados como a China. Segundo especialistas, a diversificação de destinos comerciais deve limitar os efeitos da medida no curto prazo, embora haja preocupação com o impacto político no ambiente internacional.
O governo brasileiro adotou postura de contenção, sem escalar a crise. A diplomacia foi acionada para evitar agravamento das relações bilaterais. A devolução da carta enviada por Trump, classificada como ofensiva e repleta de erros factuais, já havia sido feita pelo Itamaraty anteriormente.
Enquanto isso, dentro do STF, a posição é de manter o cronograma já estabelecido para o julgamento de Bolsonaro. Ministros ouvidos pela reportagem do Estadão reafirmaram que o calendário não sofrerá interferência externa e que o Judiciário seguirá seu curso institucional com base nos procedimentos legais.
O episódio envolvendo Trump e o STF expôs divergências sobre soberania, independência dos Poderes e ingerência internacional. A retaliação econômica com motivação política repercute tanto na esfera diplomática quanto nos debates internos do Brasil, especialmente às vésperas de julgamentos relevantes para o cenário político-eleitoral.
A postura do Supremo Tribunal Federal de seguir com o julgamento mesmo diante da escalada de tensão é tratada por integrantes da Corte como um sinal de resistência institucional. As decisões sobre o processo eleitoral e sobre os atos de 8 de janeiro continuarão sendo tomadas exclusivamente por autoridades brasileiras, independentemente de pressões de governos estrangeiros.
A crise também evidencia os efeitos da polarização política internacional sobre a condução de políticas públicas e relações exteriores. O impacto da aliança entre lideranças políticas brasileiras e estrangeiras, como Bolsonaro e Trump, passa a ser observado com mais atenção por autoridades diplomáticas, parlamentares e analistas.
Com a data do julgamento prevista para as próximas semanas, o processo contra Bolsonaro deverá se tornar um dos pontos centrais no cenário político do segundo semestre. O desfecho poderá influenciar diretamente o ambiente pré-eleitoral de 2026, no qual a direita busca alternativas após a inelegibilidade do ex-presidente.
O posicionamento do STF e a resposta do governo federal indicam que o Brasil pretende manter sua autonomia institucional diante de pressões externas. Segundo fontes ouvidas pelo jornal, a prioridade segue sendo a preservação das instituições democráticas brasileiras e a condução independente dos processos legais.
A mensagem transmitida pela Corte é de que o andamento do julgamento de Bolsonaro não será condicionado por interesses estrangeiros, independentemente das consequências comerciais ou políticas decorrentes da decisão anunciada por Trump.