Governo Lula prepara retaliação seletiva para evitar impacto nos combustíveis e manter estabilidade interna
Após a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de aplicar tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva analisa possíveis medidas de retaliação, com foco em preservar o equilíbrio da economia nacional.
De acordo com informações da Folha de S.Paulo, uma das alternativas em estudo é a imposição de tarifas sobre o etanol importado dos EUA, produto considerado de baixa relevância para o abastecimento interno.
A proposta em análise pelas áreas econômica e diplomática é construir uma resposta direcionada, evitando uma retaliação ampla que possa comprometer o abastecimento de itens essenciais. A ideia é atingir setores dos Estados Unidos que dependem do mercado brasileiro, mas cuja interrupção não represente riscos para a estabilidade de preços ou inflação interna.
O etanol norte-americano surge como principal alvo dessa estratégia. A avaliação técnica é de que a aplicação de tarifas sobre o biocombustível teria efeitos limitados no consumo interno, sem prejuízos ao mercado de combustíveis no Brasil. Essa abordagem permitiria uma resposta formal à ação de Trump sem comprometer a cadeia logística nacional.
O pacote de tarifas anunciado por Trump afeta uma variedade de produtos brasileiros, mas autoridades brasileiras avaliam que a exportação nacional de petróleo bruto não será diretamente atingida. A justificativa é a alta liquidez desse mercado e a possibilidade de a Petrobras redirecionar seus contratos para outros países importadores sem prejuízo relevante à balança comercial.
Por outro lado, combustíveis derivados como gasolina, diesel, gás de cozinha (GLP), querosene de aviação (QAV) e gás natural liquefeito (GNL) são considerados mais sensíveis. A equipe econômica avalia que retaliar diretamente esses produtos poderia provocar aumento nos preços ao consumidor, dificultando a política de controle inflacionário.
O GNL, por exemplo, é apontado como item de atenção. O Brasil depende fortemente de sua importação, sendo os Estados Unidos o principal fornecedor. Por esse motivo, esse item está fora da lista de retaliação em construção. Em contrapartida, o etanol, por ter peso menor na matriz energética brasileira, aparece como opção viável para aplicação de tarifas.
Outro ponto em avaliação é a possibilidade de taxar o petróleo bruto importado dos EUA. Técnicos indicam que o Brasil pode recorrer ao petróleo africano como alternativa, dada a semelhança em características de qualidade e refino. A eventual substituição dessa origem permitiria ao país manter o fornecimento sem prejuízos logísticos significativos.
Apesar das discussões técnicas sobre combustíveis e petróleo, o governo ainda aguarda maior clareza sobre o escopo da tarifa americana. Até o momento, não há confirmação se o pacote anunciado por Trump inclui produtos energéticos. Em rodadas anteriores de medidas protecionistas, o setor foi excluído, e a expectativa é que o mesmo possa ocorrer neste caso.
As possíveis implicações das novas tarifas também envolvem o setor aéreo. Autoridades avaliam que, caso o querosene de aviação esteja incluído nas novas tarifas, empresas como United Airlines e American Airlines podem enfrentar aumento nos custos operacionais. Isso porque o abastecimento de aeronaves estrangeiras em solo brasileiro é considerado operação internacional, sujeita à política tributária bilateral. A elevação nos custos de combustível pode afetar a competitividade dessas companhias frente a concorrentes que operam no país.
Além da pauta energética, o governo Lula estuda medidas em áreas como serviços e propriedade intelectual. Entre as alternativas estão ações sobre licenças farmacêuticas e produtos do setor audiovisual, como filmes, séries e conteúdos licenciados por empresas norte-americanas. A proposta seria buscar instrumentos legais que possam reequilibrar a balança comercial e fortalecer a posição brasileira nas negociações com Washington.
Apesar das alternativas de retaliação em estudo, o governo brasileiro afirma que sua prioridade atual é o caminho diplomático. As conversas estão sendo conduzidas por meio do Itamaraty, que pretende buscar diálogo direto com autoridades americanas e também junto à Organização Mundial do Comércio (OMC).
A estratégia do governo Lula é manter o posicionamento de defesa do comércio internacional baseado em regras multilaterais e previsíveis, sem adotar medidas precipitadas que possam comprometer a economia doméstica. A avaliação interna é de que uma retaliação bem calibrada pode demonstrar firmeza diante da medida de Trump, sem gerar efeitos colaterais sobre o consumo e a inflação.
As próximas semanas serão decisivas para a definição do formato da resposta brasileira. A equipe econômica e diplomática segue monitorando os desdobramentos da política tarifária dos EUA, buscando identificar setores mais vulneráveis e alternativas viáveis de ação. A meta é proteger os interesses nacionais, garantir estabilidade interna e preservar o ambiente de previsibilidade nas relações comerciais internacionais.