O governo de Donald Trump intensificou os ataques ao comércio com o Brasil numa escalada que revela motivações puramente políticas e ideológicas. A impressão que se tem é que o presidente americano está provocando deliberadamente uma guerra comercial com o maior país da América do Sul, baseando suas ações em acusações flagrantemente exageradas ou completamente falsas.
A mais recente investida da Casa Branca chegou ao ridículo ao atacar o uso brasileiro do Pix, uma das tecnologias de transferência de pagamentos mais bem-sucedidas do mundo e um verdadeiro orgulho nacional. Desenvolvido pelo talento e competência dos servidores do Banco Central do Brasil, o sistema de pagamentos instantâneos tornou-se referência global em inovação financeira.
Resumo dos novos ataques comerciais
A investigação comercial aberta pelo governo americano tem como alvo seis áreas principais: comércio digital e pagamentos eletrônicos (incluindo especificamente o Pix), tarifas preferenciais, medidas anticorrupção, propriedade intelectual, etanol e desmatamento. O relatório vai além e critica especificamente a Rua 25 de Março em São Paulo, alegando que o Brasil não combate adequadamente a pirataria.
Trump acusa o Brasil de promover “ataques às empresas de rede social americanas” – uma referência clara e distorcida às decisões do Supremo Tribunal Federal contra conteúdo golpista. O presidente americano alega ainda que o país concede tarifas preferenciais injustas a outros parceiros comerciais e não protege adequadamente a propriedade intelectual de empresas americanas.
A desonestidade intelectual é gritante. Agora resta saber como a classe política e empresarial brasileira reagirá a tamanha injustiça e descaramento vindos da Casa Branca. Tudo isso cheira à influência ideológica da extrema direita mais desonesta da história do nosso continente – extrema direita americana e extrema direita brasileira unidas e aliadas para subjugar a democracia brasileira e humilhar as nossas instituições nacionais.
Os números desmentem as alegações de Trump
Os dados econômicos desmentem categoricamente as alegações americanas. Em 2024, o comércio bilateral entre os dois países atingiu US$ 80,9 bilhões, representando um crescimento de 8,2% em relação ao ano anterior. Longe de prejudicar os Estados Unidos, o Brasil na verdade importa mais produtos americanos do que exporta para aquele país.
No primeiro semestre de 2025, o superávit comercial americano em relação ao Brasil saltou impressionantes 500%, alcançando US$ 1,7 bilhão. Ou seja, são os americanos que estão vendendo mais para o Brasil do que comprando – exatamente o contrário do que Trump alega em suas declarações inflamadas. A corrente de comércio bilateral somou US$ 41,7 bilhões no período, o segundo maior valor da série histórica.
As exportações brasileiras para os Estados Unidos (US$ 40,3 bilhões em 2024) incluem produtos de maior valor agregado em comparação com o comércio sino-brasileiro: aço semiacabado, suco de laranja, café moído e papel e celulose. Os Estados Unidos são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China, com uma corrente de comércio que representa 3,67% do Produto Interno Bruto brasileiro.
O ataque ao Pix expõe a verdadeira agenda ideológica
A inclusão do sistema de pagamentos Pix na investigação comercial americana expõe claramente a natureza ideológica e protecionista dos ataques de Trump. O Pix, criado pelo Banco Central do Brasil em 2020, revolucionou completamente o sistema de pagamentos no país ao oferecer transferências instantâneas, totalmente gratuitas e disponíveis 24 horas por dia, sete dias por semana.
O sistema brasileiro tornou-se uma referência mundial em inovação financeira, sendo estudado e copiado por diversos países ao redor do mundo. Sua eficiência tecnológica e a democratização do acesso aos serviços financeiros representam exatamente o tipo de avanço civilizatório que deveria ser celebrado internacionalmente, não atacado por motivações políticas.
Ao questionar o Pix, o governo americano alega que o Brasil “favorece serviços de pagamento desenvolvidos pelo governo de maneira desleal”. A acusação é completamente absurda: o Pix é uma infraestrutura pública que beneficia todos os participantes do sistema financeiro brasileiro, incluindo bancos privados nacionais e internacionais, além de fintechs. Sua gratuidade e eficiência representam um avanço civilizatório genuíno, não uma prática comercial desleal.
Motivações políticas evidentes por trás dos ataques
Os ataques comerciais de Trump ao Brasil coincidem perfeitamente com suas críticas públicas às decisões do Supremo Tribunal Federal brasileiro e sua defesa explícita do ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente investigado por tentativa de golpe de Estado. Essa convergência temporal e temática revela uma clara aliança entre as extremas direitas americana e brasileira para pressionar e desestabilizar as instituições democráticas brasileiras.
Trump não está defendendo interesses comerciais legítimos dos Estados Unidos, mas sim apoiando seus aliados ideológicos no Brasil, independentemente dos custos para a relação bilateral entre os dois países. A instrumentalização do comércio internacional para fins políticos representa uma degradação perigosa das relações diplomáticas e comerciais globais.
A extrema direita brasileira, por sua vez, encontra-se numa posição particularmente constrangedora. Seus líderes, que sempre defenderam um alinhamento automático e subordinado com os Estados Unidos, agora veem o próprio país sendo atacado pelo governo americano que tanto admiram e idolatram. Essa contradição flagrante expõe a natureza entreguista e subordinada de sua visão de política externa.
A estratégia trumpista de guerra comercial global
Os ataques ao Brasil inserem-se numa estratégia mais ampla de Trump de provocar conflitos comerciais sistemáticos ao redor do mundo. A China continua enfrentando tarifas punitivas que atingem US$ 370 bilhões em produtos chineses há sete anos consecutivos. A União Europeia é constantemente ameaçada com tarifas de 20%, o Japão com 24%, e o Vietnã com impressionantes 46%.
O uso sistemático da Seção 301 da legislação comercial americana – o mesmo instrumento agora aplicado contra o Brasil – transformou-se numa ferramenta de chantagem política internacional. Essa seção permite ao governo americano impor retaliações comerciais contra qualquer país que considere ter práticas “injustificadas”, funcionando na prática como um mecanismo de pressão geopolítica.
Análise das acusações específicas e suas falácias
Questão das redes sociais: Transformar medidas legítimas de proteção democrática em supostos “ataques comerciais” revela o verdadeiro caráter autoritário da administração Trump. As decisões do Supremo Tribunal Federal visam proteger a democracia brasileira contra ataques coordenados de grupos extremistas, muitos dos quais financiados e apoiados por redes internacionais de desinformação.
Crítica à Rua 25 de Março: A inclusão desta crítica específica demonstra o nível de detalhamento obsessivo e a natureza claramente persecutória da investigação americana. Países desenvolvidos enfrentam desafios similares com produtos falsificados, mas apenas o Brasil é alvo de investigação comercial formal por essa questão.
Tarifas preferenciais: Esta é uma prática absolutamente comum no comércio internacional, inclusive amplamente utilizada pelos próprios Estados Unidos, que mantêm acordos preferenciais com dezenas de países ao redor do mundo.
Questões de anticorrupção: A crítica é particularmente irônica, vinda de um governo cujo líder enfrenta múltiplos processos criminais. O Brasil tem feito avanços significativos no combate à corrupção nas últimas décadas.
Questão do etanol: Representa protecionismo comercial puro e simples. O Brasil desenvolveu uma indústria de biocombustíveis altamente eficiente e competitiva, e os Estados Unidos querem forçar acesso preferencial para seu produto menos eficiente.
A resposta necessária do Brasil
O Brasil inevitavelmente terá que retaliar de alguma forma contra essas agressões comerciais injustificadas. O país já aprovou a Lei de Reciprocidade, que permite adotar medidas proporcionais em resposta às sobretaxas americanas. Mais importante ainda é a necessidade de o Brasil articular-se com outros países e com a comunidade internacional para conter as violências comerciais que a Casa Branca, sob a ideologia trumpista, está tentando lançar sobre todo o sistema de comércio mundial.
A resposta brasileira deve ser firme mas responsável, defendendo claramente os interesses nacionais sem promover escaladas desnecessárias. O país possui instrumentos diplomáticos e comerciais adequados para responder, incluindo a possibilidade de questionar as medidas americanas na Organização Mundial do Comércio e articular-se estrategicamente com outros países que enfrentam pressões similares.
Brasil, China, União Europeia e outros parceiros comerciais têm interesse comum em preservar um sistema de comércio internacional baseado em regras multilaterais, não em caprichos políticos unilaterais. O Brasil, como defensor histórico do multilateralismo, tem responsabilidade especial em liderar a resistência internacional a essa deriva autoritária nas relações comerciais globais.
A resposta aos ataques trumpistas deve ser vista não apenas como defesa dos interesses nacionais brasileiros, mas como uma contribuição fundamental para preservar a ordem internacional baseada em cooperação e regras, não em força bruta e intimidação política.


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