Enquanto os EUA punem com leis severas, o Brasil transforma ataques ao STF em palco político e curtidas parlamentares
Na história do Brasil, Joaquim Silvério dos Reis ficou eternizado como o sujeito que, em maio de 1789, trocou a luta por liberdade por um desconto na Receita e um pix simbólico da Coroa Portuguesa. Foi ele quem entregou Tiradentes no capricho — e garantiu seu lugar naquela lista de nomes que nem escola de bairro aceita batizar sem sentir o ranço histórico escorrendo da placa.
Mais de dois séculos depois, a lógica da traição continua firme — só trocou a farda pela camisa polo e o cavalo por Wi-Fi. Mudou o figurino, mas o enredo é o mesmo: vende-se a democracia em 280 caracteres, com frete grátis pra ditadura.
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Se fosse nos EUA, Eduardo Bolsonaro já teria virado verbete no Código Penal — ou figurante de tribunal militar com legenda em inglês. Se o Bananinha tivesse feito por lá o que faz aqui — pedir “medidas enérgicas” contra o STF, flertar com golpe militar, e ainda brincar de Itamaraty paralelo — não estaria tweetando tranquilo. Estaria assistindo o sol nascer quadrado, com a Constituição no colo e um inglês afiado: “Shitting in the bull’s mouth”, como diriam nos presídios premium de Washington.

Nos Estados Unidos, a justiça não dorme com farda alheia. Lá, duas leis já estariam afiando a guilhotina jurídica:
Logan Act (18 U.S.C. § 953) — proíbe cidadão de meter o bedelho na política externa sem autorização. Se o “03” resolvesse brincar de embaixador nos EUA, ganhava tornozeleira, não curtida.
Treason Law (18 U.S.C. § 2381) — define traição como “ajudar inimigos ou tentar derrubar o governo eleito”. Lá, dois testemunhos e um capuccino na Suprema Corte já bastam pro sujeito conhecer a anatomia de Alcatraz.
Mas aqui é Brasil, onde “liberdade de expressão” virou desculpa pra bravata fascista, e os golpistas ganham trend. O resultado? Um deputado que diz amar a Constituição americana… só pra usar como cinto. Porque cumprir a lei dá trabalho — e ele sempre preferiu obedecer quem pode garantir foro, farda ou filtro de Instagram.
A diferença é que os EUA aprenderam a tratar traidores como ameaça real. Aqui, a gente transforma em celebridade parlamentar quem ameaça a democracia entre uma série da Netflix e um crossfit com pastores extremistas. O mesmo país que homenageia torturador com nome de viaduto agora vê herdeiros do ódio flertando com o autoritarismo como quem tira selfie no espelho da academia — sem nunca pagar o preço da vergonha histórica.
Se no século XVIII o X-9 original entregou a República por uns trocados e um tapinha nas costas do Rei, os Silvérios digitais de hoje entregam o Estado de Direito por curtidas, trending topics e promessas de impunidade vitalícia. Mas a conta chega. E quando a História bater à porta — que ela traga CPI, denúncia formal e uma cela sem Wi-Fi, sem assessor, sem claque, e com tempo de sobra pra finalmente ler a Constituição que tanto citam… sem nunca ter entendido.
(*) Rollo (Instagram: @rollo_ator) é Ator profissional formado no Bacharelado de Artes Cênicas da Faculdade da CAL e ex-Conselheiro da cadeira do Audiovisual no Conselho Estadual de Política Cultural – RJ


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