Isenção a ferro, ouro e lítio mostra que, mesmo sob pressão, os EUA precisam das riquezas do subsolo brasileiro para sustentar sua indústria e sua disputa global
Enquanto aplica uma tarifa de 50% sobre centenas de produtos brasileiros, o presidente norte-americano Donald Trump decidiu isentar cerca de 75% dos minerais exportados pelo Brasil ao mercado dos EUA. A informação foi confirmada por meio de um levantamento preliminar do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), obtido exclusivamente pela CNN.
A ordem executiva assinada nesta quarta-feira (30) inclui importantes matérias-primas como ferro, estanho, ouro, prata e carvão na lista de isenções. Por outro lado, alguns minerais — entre eles caulim, cobre, manganês, vanádio, bauxita e pedras ornamentais — permaneceram sob a nova carga tributária, que eleva a tarifa para 10%, mantendo a alíquota anunciada no início de abril deste ano.
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Além disso, tecnologias derivadas de minerais críticos, como baterias de níquel-cádmio e baterias de íons de lítio (lithium-ion), também estão fora da incidência da tarifa adicional. Isso indica que Washington reconhece a importância estratégica desses recursos para a indústria de alta tecnologia e para a transição energética global.
Negociações anteriores já sinalizavam exceções
Segundo informações reveladas pela CNN, nas semanas que antecederam a publicação do decreto, representantes do Ibram se reuniram com o encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos no Brasil, Gabriel Escobar. Nessas conversas, os norte-americanos já haviam dado sinais de que pretendiam tratar certos minerais de forma diferenciada dentro do quadro das novas taxas.
Para autoridades brasileiras, a decisão de isentar a maior parte dos minérios parece estar ligada a uma estratégia mais ampla de diversificação de fontes de suprimento. Com a China dominando grande parte do mercado global, os EUA têm interesse em manter abertos canais alternativos, especialmente para minerais estratégicos cujo processamento está concentrado no gigante asiático.
“Sobretaxar esses minerais poderia, de fato, afastar as exportações brasileiras dos EUA e direcioná-las para Pequim, algo que Washington não quer”, explicou uma fonte ligada ao setor. Atualmente, a China é o principal comprador dos minerais extraídos no Brasil, controlando a maior parte da cadeia produtiva desses materiais.
O monopólio chinês e a busca por alternativas
A Agência Internacional de Energia (IEA) já alertou sobre os riscos geopolíticos associados à dependência do mercado mundial em relação à China na produção de baterias e componentes críticos para a economia verde. Pequim detém mais de 80% da capacidade de fabricação de células de bateria e também domina a metade do processamento global de lítio e cobalto — metais-chave para a revolução energética e tecnológica.
Diante disso, os EUA têm intensificado esforços para buscar parcerias com outros países, incluindo o Brasil, para reduzir sua vulnerabilidade. A isenção dos principais minerais brasileiros pode ser interpretada como um passo nessa direção, mesmo que a política geral do governo Trump continue sendo marcada por protecionismo e unilateralidade.
Setor aguarda maiores detalhes
Apesar do alívio proporcionado pelas isenções, o setor mineral brasileiro ainda aguarda informações mais concretas sobre como a medida será aplicada na prática. Autoridades e empresários querem entender melhor os critérios utilizados para incluir ou excluir determinados produtos da lista de isentos, além de analisar o impacto real da tarifa nos volumes de exportação.
A expectativa é de que o governo federal movimente canais diplomáticos nos próximos dias para obter mais explicações junto às autoridades norte-americanas. Além disso, setores interessados devem acompanhar atentamente eventuais ajustes na pauta alfandegária, que podem alterar a dinâmica do comércio bilateral.
Tensões comerciais crescem, mas interdependência persiste
A isenção dos minérios acontece em um contexto de forte tensão comercial entre os dois países. Na mesma data, o governo Trump impôs sanções individuais contra o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, utilizando a Lei Magnitsky, e oficializou a tarifa de 50% sobre diversos produtos agrícolas, industriais e têxteis brasileiros.
Essa combinação de medidas — jurídicas e comerciais — mostra uma escalada nas relações entre os dois países, mas também reforça a ideia de que Washington entende a importância econômica do Brasil, especialmente quando se trata de commodities estratégicas. A escolha de isentar a maior parte dos minérios sugere uma tentativa de equilibrar pressões políticas com interesses econômicos.
Riscos e oportunidades
Embora a isenção seja vista como positiva, ela também gera dúvidas: por que alguns minerais foram excluídos? Será que essa diferença tem base técnica ou está relacionada a pressões políticas internas nos EUA? Essas perguntas começam a ecoar dentro do setor e entre especialistas.
Enquanto isso, empresas mineradoras brasileiras seguem observando com cautela a evolução da situação. Para elas, a continuidade do acesso ao mercado norte-americano é crucial, especialmente em um cenário em que Pequim continua dominando as cadeias globais de fornecimento. A isenção representa uma janela de oportunidade, mas também um sinal frágil de que os EUA buscam preservar alguma cooperação com o Brasil, mesmo diante da postura mais dura assumida recentemente.
Com as exportações mineiras representando bilhões de dólares anualmente para o país, qualquer mudança na relação comercial com os EUA tem potencial para afetar diretamente a economia brasileira. E, no momento, a incerteza ainda prevalece.
Enquanto o setor aguarda mais detalhes, o Brasil precisa decidir como responder a essa nova fase da crise: continuar buscando diálogo, adotar contramedidas simétricas ou apostar em outras parcerias comerciais. Uma coisa, porém, fica clara: o papel do Brasil como fornecedor de matérias-primas estratégicas está longe de ser ignorado por Washington — mesmo com toda a retórica de confronto.
Trump isenta produtos estratégicos do tarifaço de 50%, como petróleo, suco de laranja e aviões comerciais
Apesar da escalada comercial anunciada pelo presidente norte-americano Donald Trump, que elevou a tarifa sobre uma série de produtos brasileiros para 50%, uma lista ampla de exceções foi incluída na ordem executiva assinada nesta quarta-feira (30). Entre os setores beneficiados estão o agronegócio, a indústria aeroespacial e a produção de matérias-primas industriais — áreas consideradas fundamentais para a economia brasileira.
A nova política protege itens cruciais como petróleo, suco de laranja e aviões civis. Esses bens são exportações tradicionais do Brasil e representam um papel central no comércio bilateral entre os dois países. A decisão de isentá-los parece visar não só proteger interesses econômicos dos EUA, mas também manter canais abertos para negociações futuras, mesmo diante do clima de tensão atual.
O aumento tarifário, que entra em vigor em 6 de agosto, é adicional à taxa de 10% já aplicada desde abril. No entanto, os produtos listados como isentos permanecem sob as alíquotas anteriores, mantendo sua competitividade no mercado norte-americano.
Itens estratégicos salvos da sobretaxa
O suco de laranja, uma das maiores exportações do agronegócio brasileiro para os Estados Unidos, continua fora da nova cobrança. A indústria espera que essa isenção ajude a conter danos ao setor, que vinha enfrentando pressões por conta da dependência do mercado americano.
Já no segmento industrial, a Embraer — maior produtora de aviões civis da América Latina — respira mais aliviada. Aviões comerciais, seus motores, peças e componentes, além de simuladores de voo terrestre fabricados no Brasil, foram incluídos na lista de isenções. Isso significa que a indústria aeronáutica nacional continuará a operar normalmente no mercado norte-americano, evitando impactos diretos no faturamento e nas cadeias de suprimentos globais.
Outros produtos essenciais, como celulose, carvão e aço — este último fundamental para exportações voltadas à construção civil e automotiva nos EUA — também escaparam da nova carga tributária. Castanhas e algumas categorias específicas de minerais e insumos industriais também foram poupadas.
No total, cerca de 700 categorias de mercadorias foram excluídas da tarifa de 50%. Apesar disso, há nuances: no caso dos aviões, apenas os modelos civis e suas partes relacionadas tiveram isenção garantida, enquanto equipamentos militares permaneceram sob a nova alíquota.
Um sinal de pragmatismo ou estratégia?
Especialistas observam que a decisão de isentar certos setores pode indicar um certo pragmatismo por parte do governo Trump, que reconhece a importância desses produtos tanto para a economia brasileira quanto para o funcionamento de suas próprias indústrias. O suco de laranja, por exemplo, é um item de consumo massivo nos EUA, enquanto aviões e aço desempenham papéis estratégicos em setores críticos da economia norte-americana.
Além disso, a escolha de isentar petróleo e derivados pode ser interpretada como uma tentativa de evitar desabastecimento interno, especialmente num momento de instabilidade global no setor energético. Já a celulose, usada em papelaria e embalagens, tem grande relevância para a indústria gráfica e logística dos Estados Unidos.
Reação do setor privado e expectativas
Empresários brasileiros demonstraram alívio com a inclusão desses setores na lista de isenções. Para o agronegócio, a manutenção do acesso ao mercado norte-americano sem custos adicionais é vital, especialmente em um contexto de volatilidade cambial e inflacionária. “Isso é um respaldo importante para mantermos nossa presença no mercado”, afirmou um representante da Associação Brasileira da Indústria de Suco de Laranja (CitrusBR).
Na aviação, a Embraer destacou a isenção como um “sinal positivo” para o fortalecimento do comércio bilateral. “A preservação da isenção reforça a parceria histórica entre os dois países e mostra que Washington entende a importância da cooperação tecnológica”, disse uma fonte da empresa.
Mesmo assim, setores como o cafeeiro, que não foi contemplado na isenção, manifestaram frustração. “A ausência do café na lista de exceções é um golpe durável para uma cadeia produtiva que tem investido muito no mercado norte-americano”, destacou um produtor da região de Lavras (MG), principal polo produtivo do país.
Crise comercial se intensifica
A ordem executiva foi assinada no mesmo dia em que Trump anunciou sanções individuais contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sob a Lei Magnitsky. Essa combinação de medidas — jurídicas e comerciais — indica uma postura mais rígida do governo norte-americano frente ao Brasil, mas também sugere que Washington busca equilibrar pressões políticas com necessidades econômicas.
Segundo analistas, a isenção de produtos estratégicos pode servir como uma ponte para futuras negociações. “Trump está mostrando que, apesar da retórica dura, ele ainda valoriza certos setores brasileiros. É uma forma de manter a relação aberta, mesmo em meio à crise diplomática”, avalia um especialista em relações internacionais.
Governo brasileiro deve buscar esclarecimentos
Com a publicação do decreto, o governo federal brasileiro agora aguarda detalhes sobre a implementação prática da medida. Autoridades querem entender melhor os critérios utilizados para definir quais produtos foram isentos e quais sofrerão o aumento de 40 pontos percentuais.
Representantes do Ministério da Economia e da Apex Brasil já entraram em contato com agentes norte-americanos para solicitar informações adicionais. A expectativa é que, nos próximos dias, haja uma definição mais clara sobre a aplicação efetiva da tarifa e seu impacto real nas exportações brasileiras.
Enquanto isso, setores afetados pela nova carga tributária começam a mobilizar forças para defender seus interesses junto ao governo norte-americano. Empresários buscam influenciar importadores e parlamentares dos EUA, argumentando que a alta tarifa pode gerar contrapartidas negativas, como redução na oferta de matérias-primas e aumento de preços para consumidores norte-americanos.
Balanço inicial e perspectivas
A isenção de produtos estratégicos traz um alívio parcial ao setor exportador brasileiro. No entanto, a cobrança de 50% sobre outros setores — como o agrícola, têxtil e manufatureiro — pode levar a uma retração significativa no comércio bilateral. Além disso, a combinação de sanções judiciais e comerciais gera incertezas sobre o futuro imediato da relação entre os dois países.
Para muitos, a medida de Trump reflete uma dupla estratégia: punir políticas domésticas do Brasil, mas manter viáveis as trocas em áreas onde o Brasil detém vantagem competitiva. No entanto, a percepção geral no setor é de que o Brasil precisa se preparar para uma nova fase de confrontos, seja por meio de contramedidas simétricas, seja buscando novos mercados para substituir a demanda perdida.
Com as isenções confirmadas, o Brasil ganhou algum tempo para ajustar estratégias. Agora, o desafio será transformar esse espaço em uma oportunidade para mitigar os impactos e reforçar a independência econômica do país.