O jornal estatal chinês Global Times publicou nesta terça-feira, 5, uma reportagem ressaltando a resposta do Brasil e da Índia às recentes tarifas comerciais anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A publicação caracteriza as medidas adotadas pelos dois países como uma reação direta à escalada tarifária imposta por Washington, que inclui produtos brasileiros e indianos.
Segundo o veículo chinês, Brasil e Índia — integrantes do BRICS e do chamado Sul Global — “atiraram de volta” ao posicionar-se contra o aumento das tarifas, cada qual com sua estratégia política e econômica. A matéria enfatiza que as ações de Trump foram justificadas por seu governo com base em questões geopolíticas: no caso da Índia, pela revenda de petróleo russo; no caso do Brasil, pela suposta “perseguição política” ao ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente em prisão domiciliar.
O jornal lembra que, além de serem duas das maiores economias emergentes do mundo, Brasil e Índia possuem laços comerciais relevantes com os Estados Unidos, mas têm buscado diversificar suas relações internacionais, especialmente com países da Ásia e da África. “Ambos têm cartas estratégicas importantes para jogar”, afirma o Global Times.
Índia nega acusações e reforça autonomia energética
A reportagem cita nota oficial divulgada pelo Ministério das Relações Exteriores da Índia, que considerou “injustificadas e irrazoáveis” as acusações do governo norte-americano. Nova Délhi afirmou que as compras de petróleo russo são parte de sua estratégia de segurança energética e ressaltou que os próprios Estados Unidos continuam importando diversos produtos estratégicos da Rússia, como fertilizantes, paládio e insumos para a indústria nuclear.
Fontes diplomáticas indianas ouvidas pelo jornal chinês afirmam que os ataques de Washington ignoram as necessidades energéticas de um país com mais de 1,4 bilhão de habitantes e que as decisões comerciais da Índia seguem critérios técnicos, não políticos.
Brasil sinaliza ação na OMC e medidas internas
Na avaliação do Global Times, a resposta do Brasil tende a ocorrer em três frentes: uma ofensiva jurídica na Organização Mundial do Comércio (OMC), medidas emergenciais de proteção ao setor exportador e manutenção de diálogo diplomático com os Estados Unidos. Segundo a publicação, o governo brasileiro trabalha em uma queixa formal que deve ser apresentada em breve, questionando a legalidade das tarifas de 50% sobre produtos como café, carne e petroquímicos.
A reportagem informa que a taxação atinge 35% das exportações brasileiras para o mercado norte-americano, gerando preocupação no setor produtivo nacional. Entre as medidas internas estudadas pelo governo Lula estão a ampliação de linhas de crédito para produtores e exportadores afetados, além de incentivos ao redirecionamento de produtos para outros mercados, especialmente asiáticos e latino-americanos.
Fontes da diplomacia brasileira, segundo o jornal, consideram que há motivações políticas na decisão do governo norte-americano. A publicação cita veículos internacionais como a Reuters, que relacionam a imposição das tarifas ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal (STF), interpretado por aliados de Trump como um movimento de “perseguição judicial”.
Articulação global e cenário geopolítico
A matéria do Global Times contextualiza a reação de Brasil e Índia como parte de uma tendência mais ampla de contestação às práticas unilaterais dos Estados Unidos no comércio internacional. O jornal chinês lembra que ambos os países são membros ativos do BRICS — bloco formado também por China, Rússia e África do Sul — e que vêm defendendo maior equilíbrio e multilateralismo nas relações econômicas globais.
Ainda segundo a publicação, a atitude de Trump deve ser lida como uma tentativa de reforçar sua base política interna em meio ao ciclo eleitoral americano, mobilizando pautas que envolvem política externa, segurança e retórica anti-China. No entanto, o Global Times afirma que as reações de Brasil e Índia indicam que o Sul Global não aceitará passivamente ser instrumento de conflitos geopolíticos entre potências ocidentais.
Caminhos abertos para novas alianças
A reportagem conclui destacando que tanto Brasil quanto Índia têm buscado ampliar acordos bilaterais e regionais fora do eixo tradicional dominado pelos Estados Unidos e Europa. O Brasil, por exemplo, assinou recentemente um acordo de exportação de café com a China, que aprovou 183 novas empresas brasileiras para atuar naquele mercado. A medida foi interpretada como uma sinalização de Pequim em apoio ao governo Lula, em meio ao agravamento da tensão com os EUA.
Na avaliação de analistas consultados pelo jornal, a ofensiva tarifária liderada por Trump pode acelerar o redesenho das cadeias comerciais internacionais e fortalecer blocos como BRICS e G77, que vêm defendendo a criação de mecanismos financeiros e de comércio alternativos ao dólar e ao sistema dominado por Washington.
O Global Times observa que, embora a resposta dos dois países ainda esteja em curso, tanto Brasil quanto Índia demonstram que não aceitarão medidas unilaterais sem contestação, e que estão dispostos a usar instrumentos legais, diplomáticos e comerciais para proteger seus interesses estratégicos.