A relação entre Brasil e Estados Unidos atravessa o momento mais crítico em dois séculos, combinando tensões políticas e econômicas ligadas ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo o Financial Times, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) resiste à pressão do presidente norte-americano, Donald Trump, que impôs tarifas de 50% sobre produtos brasileiros e condicionou a retirada da medida à interrupção do processo judicial contra Bolsonaro.
Lula rejeitou a exigência como “inaceitável” e passou a buscar apoio entre países aliados do BRICS, mantendo conversas com o primeiro-ministro indiano Narendra Modi, o presidente russo Vladimir Putin e o líder chinês Xi Jinping. Para analistas, a estratégia reforça a postura de enfrentamento e sinaliza alinhamento com blocos alternativos à influência norte-americana.
Origens da crise
O impasse teve origem nas acusações de que Bolsonaro tentou um golpe militar para permanecer no poder após a derrota eleitoral de 2022. As denúncias incluem um plano para assassinar Lula e a coordenação da invasão de Brasília em 8 de janeiro de 2023.
Em 7 de julho, Trump classificou o julgamento como “caça às bruxas” e pediu sua suspensão. Ignorado pelo STF, o governo norte-americano respondeu elevando tarifas e impondo sanções ao ministro Alexandre de Moraes, além de restrições de viagem a oito ministros da Corte.
Impactos econômicos e políticos
As tarifas incidem sobre produtos como café, carne bovina, frutas frescas e açaí — setores ligados à base de apoio de Bolsonaro. Entretanto, 43% das exportações brasileiras para os EUA foram poupadas, incluindo suco de laranja, minério de ferro e aeronaves. Como apenas 12% das exportações nacionais têm os EUA como destino, especialistas estimam que o impacto no PIB será limitado, podendo chegar a no máximo 0,6 ponto percentual.
Para Bruna Santos, do Inter-American Dialogue, Trump “ameaçou com tarifas, mas com uma exigência política impossível de atender”, deixando Lula “sem margem de manobra”. A avaliação é que, embora Trump tenha revertido impasses diplomáticos no passado, este caso apresenta entraves mais complexos.
STF mantém posição
No Brasil, ministros do STF tratam o julgamento de Bolsonaro como um marco para a democracia e rejeitam qualquer interferência externa. Segundo pessoas próximas à Corte, o processo reúne “declarações, confissões, gravações e mensagens” e não se baseia em motivação ideológica.
No início de agosto, manifestações de apoiadores de Bolsonaro pediram a saída de Alexandre de Moraes e anistia aos investigados. Em São Paulo, houve exibição de bandeiras dos EUA e declarações de confiança em Trump para “evitar que o Brasil se torne uma nova Venezuela”.
Perspectivas de negociação
Com a eleição presidencial de 2026 no horizonte, Lula tem registrado avanço nas pesquisas desde o início do conflito. Enquanto setores empresariais pedem moderação, a ala diplomática ligada a Celso Amorim defende aprofundar relações no BRICS e diversificar mercados.
Especialistas como Lucas de Aragão, da Arko Advice, acreditam que as agendas política e comercial podem ser tratadas separadamente, abrindo espaço para acordos futuros. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), chegou a propor negociações envolvendo minerais estratégicos e redução de barreiras para produtos americanos como o etanol. Contudo, um encontro virtual com o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, foi cancelado pouco antes de ocorrer.
A avaliação de diplomatas brasileiros é de que a tensão tende a se prolongar, mantendo incertezas para o comércio exterior e reforçando o cenário de disputa política interna.