O cenário global desafiador não impede o Brasil de consolidar-se como protagonista no mercado de títulos da América Latina
O Morgan Stanley projeta que emissores brasileiros deverão alcançar um recorde histórico de US$ 30 bilhões em vendas de títulos globais ao longo deste ano, sustentando-se em um mercado internacional de dívida que permanece aberto, mesmo diante do aumento das tarifas impostas pelos Estados Unidos.
“O mercado está realmente receptivo”, afirmou Gustavo Siqueira, codiretor de mercados de capitais de renda fixa para a América Latina do Morgan Stanley, em entrevista. “O que está acontecendo de uma perspectiva política e macrogeopolítica não mudou o apetite.”
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Segundo dados compilados pela Bloomberg, até agora, entidades governamentais, empresas e bancos brasileiros captaram US$ 22 bilhões nos mercados globais neste ano, representando um crescimento de 18% em relação ao mesmo período de 2024. Cerca de 70% desses recursos foram destinados à rolagem de dívidas ou à gestão de passivos, enquanto o restante envolveu captação de recursos novos, explicou Siqueira.
O executivo ressaltou que, atualmente, poucas empresas estão investindo em crescimento, com exceção de projetos de grande porte. “Não vejo empresas fazendo muitos investimentos em crescimento neste momento, exceto aquelas com grandes projetos”, disse.
Entre as operações de destaque deste ano, o Morgan Stanley atuou como um dos principais gestores na emissão de US$ 650 milhões em títulos globais da Embraer SA, realizada em fevereiro, com vencimento em 2035. Os recursos captados pela fabricante de aeronaves serão utilizados para recomprar dívidas com vencimento em 2027 e 2028, segundo a empresa.
Outro exemplo significativo veio do setor de saneamento. A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) retornou ao mercado internacional após 15 anos e captou US$ 500 milhões em julho. Os recursos visam expandir sistemas de água e esgoto, promover melhorias na conservação ambiental e financiar obras estruturais, incluindo a interligação de barragens e o reforço de redes para períodos de seca.
Com esses movimentos, o Brasil demonstra capacidade de acessar recursos no exterior mesmo em um cenário global desafiador, mantendo investidores internacionais atentos à sua dívida e à gestão estratégica de passivos. A expectativa é que o recorde projetado pelo Morgan Stanley seja atingido ainda em 2025, consolidando o país como um dos protagonistas do mercado de títulos globais na América Latina.
Além disso, o banco espera um aumento significativo na atividade de fusões e aquisições, à medida que investidores de Estados Unidos, Europa e China buscam “ativos troféu” no Brasil — oportunidades que só surgem em um ambiente de mercado volátil, segundo Fabio Medeiros, chefe de banco de investimento para o Brasil no Morgan Stanley.
“Há muitas atividades onde o Brasil tem vantagens naturais, como agronegócio e recursos naturais, e também onde são necessários investimentos significativos, como saneamento”, afirmou Medeiros, destacando setores estratégicos que continuam atraindo atenção internacional.
Entre os negócios recentes, o Morgan Stanley assessorou a fintech StoneCo Ltd. na venda da empresa de software Linx SA para a Totvs SA, uma operação de 3 bilhões de reais (US$ 560 milhões) anunciada no mês passado. Operações desse tipo reforçam o papel do banco como facilitador de transações complexas no Brasil, conectando capital estrangeiro a setores de destaque da economia nacional.
Apesar do bom desempenho no mercado internacional e das fusões e aquisições, os mercados domésticos de capitais de ações e dívida têm apresentado sinais de desaceleração em 2025. A emissão total de ações no Brasil atingiu R$ 18,4 bilhões, uma queda de 28% em relação ao mesmo período de 2024. Já as vendas de títulos locais caíram quase 18%, somando R$ 233,7 bilhões.
Mesmo com esse cenário, o interesse de investidores estrangeiros permanece elevado. Alessandro Zema, chefe do Brasil e codiretor de banco de investimentos para a América Latina no Morgan Stanley, destacou que houve um forte influxo de fundos estrangeiros em ações brasileiras durante maio e junho, com mais empresas procurando o banco para discutir a possibilidade de realizar ofertas públicas iniciais de ações (IPOs).
Os fundos negociados em bolsa (ETFs) brasileiros registraram entradas líquidas de US$ 506 milhões em maio e US$ 570 milhões em junho, o maior volume desde 2019, segundo dados compilados pela Bloomberg. Esse movimento indica que, apesar das recentes altas tarifárias nos Estados Unidos, investidores continuam confiantes no potencial de crescimento do Brasil.
Marcello Lo Re, chefe de mercados de capitais de ações para a América Latina no Morgan Stanley, ressaltou que ainda será necessário acompanhar o desempenho do mercado americano até setembro, mas se mostrou otimista. “Estou muito construtivo quanto às perspectivas até o final de 2025 e o início do próximo ano”, afirmou, reforçando a expectativa de continuidade de um fluxo robusto de investimentos no país.
Com a combinação de emissões de títulos globais recordes, fusões e aquisições estratégicas e forte interesse estrangeiro em ações brasileiras, o Morgan Stanley projeta que o Brasil continuará atraindo capital internacional mesmo diante de desafios macroeconômicos, consolidando sua posição como um destino importante para investidores globais.
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