Acordo bilionário com os EUA leva F-16 poloneses a um novo patamar de poder e interoperabilidade na OTAN
A Polônia deu mais um passo decisivo na ampliação de suas capacidades militares. O governo polonês assinou, nesta quarta-feira (13), um contrato de US$ 3,8 bilhões com os Estados Unidos para modernizar toda a frota nacional de caças F-16, numa iniciativa voltada a aumentar a capacidade de resposta e dissuasão diante de possíveis ameaças da Rússia.
O anúncio foi feito pelo ministro da Defesa, Wladyslaw Kosiniak-Kamysz, durante uma cerimônia na cidade de Bydgoszcz, no noroeste do país. Ele destacou que o investimento representa um avanço estratégico significativo para as Forças Armadas polonesas. “Estamos dando um salto à frente. Gastaremos cada vez mais nas próximas décadas”, afirmou o ministro, sinalizando que o programa de reequipamento militar é de longo prazo.
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O acordo prevê a atualização dos 48 F-16 atualmente em operação, todos fabricados nos EUA, para padrões mais avançados de interoperabilidade com as forças da OTAN. Essa melhoria permitirá que os caças trabalhem de forma mais integrada com os aliados, especialmente em cenários de defesa coletiva.
A Polônia ocupa uma posição sensível no mapa geopolítico da Europa. Membro ativo do flanco leste da OTAN, o país faz fronteira direta com a Rússia e com a Bielorrússia, esta última aliada estratégica de Moscou. Desde a invasão em larga escala da Ucrânia por ordem de Vladimir Putin, em 2022, Varsóvia intensificou substancialmente seu programa de rearmamento.
Hoje, o país figura entre os maiores investidores em defesa dentro da aliança militar ocidental, destinando quase 5% de sua produção econômica ao setor – percentual que supera, por larga margem, a meta mínima de 2% definida pela OTAN.
Nos últimos anos, a Polônia tem realizado aquisições expressivas de armamentos e tecnologia bélica. Em 2020, firmou um contrato de US$ 4,6 bilhões com a fabricante americana Lockheed Martin para a compra de 32 caças F-35, aeronaves de última geração conhecidas por sua capacidade furtiva. As entregas estão programadas para começar em 2026 e devem ser concluídas até 2030, substituindo aeronaves remanescentes da era soviética.
Além da renovação de sua frota aérea, o governo polonês também planeja reforçar a defesa naval. Entre as iniciativas, está a aquisição de submarinos e a construção de três fragatas para ampliar a proteção de seus interesses marítimos.
Com essa nova rodada de investimentos, a Polônia reafirma seu papel como um dos principais pilares militares da OTAN na Europa Oriental, enviando um recado claro de prontidão e dissuasão diante de um cenário internacional cada vez mais instável.
Investimento recorde em defesa expõe fragilidades da indústria militar polonesa
Apesar do anúncio de modernização de sua frota de F-16 e de uma escalada sem precedentes nos gastos militares, a Polônia enfrenta um dilema: grande parte do dinheiro investido na defesa nacional está fluindo para fornecedores estrangeiros, e não para sua própria indústria bélica.
Desde 2022, após a invasão russa à Ucrânia, Varsóvia mais que dobrou o orçamento de defesa — saltando de 2,4% do PIB para 4,7% em 2025 — o que, em termos reais, representa bilhões de dólares adicionais. A expectativa era que esse volume de recursos impulsionasse o conglomerado estatal Polska Grupa Zbrojeniowa (PGZ), que reúne cerca de 50 empresas e é responsável por produzir uma ampla gama de armamentos. No entanto, o planejamento irregular e a baixa capacidade de produção têm impedido que esse fortalecimento ocorra.
O ministro da Defesa, Władysław Kosiniak-Kamysz, contou que, em uma conversa recente com seu colega sueco Pal Jonson, foi questionado sobre o que a Polônia poderia oferecer em troca das compras que faz da Suécia — que incluem desde navios a mísseis antitanque. Ele citou o Piorun, um lançador portátil de mísseis antiaéreos produzido pela Mesko, subsidiária da PGZ. Mas há um entrave: a única linha de montagem está no limite e não consegue atender nem à demanda interna, nem aos pedidos de outros países europeus.
Esse gargalo reflete um problema mais amplo. Um dos principais desafios é a produção de projéteis de 155 mm, padrão da OTAN e vitais para a guerra na Ucrânia. A Polônia havia estipulado, em 2023, a meta de fabricar 150 mil unidades por ano até 2025, mas essa previsão foi empurrada para 2028. O motivo? Falta de pólvora e sucessivos atrasos em projetos que deveriam expandir a capacidade de produção — o Projeto 44.7 e o Projeto 400.
Ambos deveriam estar em operação há anos, mas esbarraram em prazos irrealistas, mudanças de planejamento, dificuldades técnicas e até na ausência de instalações para abrigar máquinas que já haviam sido compradas. Entre 2017 e 2021, a Mesko passou por cinco diretores diferentes, o que também afetou a continuidade das iniciativas.
Enquanto a Polônia luta para avançar, países vizinhos, como a Alemanha, multiplicaram a produção. A Rheinmetall, por exemplo, ampliou em dez vezes a fabricação de projéteis desde 2022, chegando a 750 mil unidades anuais. “Três anos se passaram e pouco foi feito na Polônia”, resume Tomasz Smura, especialista da Fundação Casimir Pulaski.
O governo de Donald Tusk, no poder desde 2023, responsabiliza a gestão anterior, do partido Lei e Justiça, pelo atraso. Já os opositores culpam administrações anteriores lideradas por Tusk e apontam para a escassez global de componentes.
Apesar dos problemas, alguns avanços pontuais surgem. A PGZ fechou contrato para fornecer 96 obuses Krab ao Exército e tem montado lançadores de mísseis Chunmoo em veículos produzidos no país. A WB Electronics, maior fabricante polonesa de drones militares, negocia com a sul-coreana Hanwha Aerospace para fabricar foguetes para esses lançadores localmente, o que abriria espaço para exportações.
Ainda assim, o peso das importações permanece desproporcional. Em 2023, a Polônia gastou mais de 150 bilhões de zlotys (cerca de US$ 38 bilhões) em defesa, mas exportou apenas € 1,74 bilhão em armamentos. “Essa é uma parcela muito pequena e cria pressão para mudar essa proporção”, avalia Robert Pszczel, ex-diretor do escritório da OTAN em Moscou.
Para reverter o cenário, o governo apresentou um projeto de lei que visa simplificar a obtenção de licenças para obras de infraestrutura militar e permitir o uso de fundos da União Europeia no setor. Também anunciou a construção de uma nova fábrica de munições, com investimento de 3 bilhões de zlotys e conclusão prevista para 2028, além da instalação de uma segunda linha de produção do Piorun.
O desafio, porém, é urgente. Situada na linha de frente da OTAN e fazendo fronteira com a Rússia e a Bielorrússia, a Polônia não descarta a possibilidade de um conflito de grande escala. Para Pszczel, a lição é clara: não basta ter soldados e equipamentos modernos, é preciso garantir capacidade de produção rápida e em larga escala. “Por muitos anos, vivemos uma época de certa felicidade. Agora, a realidade é outra”, adverte.