Campos dos Goytacazes vira peça-chave e pode redefinir alianças para a disputa do governo do Rio
As articulações eleitorais para 2026 no Rio de Janeiro destacam o interior fluminense como novo polo de poder. No centro desse movimento está Campos dos Goytacazes, tradicional reduto eleitoral e berço de dinastias políticas como a de Wladimir Garotinho (PP), atual prefeito, e de Rodrigo Bacellar (União Brasil), presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). A exoneração de Washington Reis (MDB) da Secretaria Estadual de Transportes e Mobilidade Urbana, assinada por Rodrigo Bacellar durante a ausência do governador Cláudio Castro (PL), evidenciou uma tentativa de reconfiguração na correlação de forças regionais dentro da máquina do governo. Mais do que uma ruptura com um representante da Baixada Fluminense, a movimentação expõe o avanço do interior na disputa por protagonismo. Nesse contexto, a possível composição de chapa entre Eduardo Paes (PSD) e Wladimir Garotinho ganha novo peso, refletindo não só alianças individuais, mas a reconfiguração do equilíbrio territorial na política fluminense.
A possível indicação de Wladimir Garotinho como vice de Eduardo Paes nas eleições estaduais ganha força diante do cenário de disputa interna na base governista, especialmente em Campos. Wladimir, que é filho dos ex-governadores Anthony Garotinho (1999-2002) e Rosinha Garotinho (2003-2006), herda um capital político consolidado na região. Do outro lado, Rodrigo Bacellar, cotado como o nome apoiado por Cláudio Castro, disputa o mesmo eleitorado local. O município se torna, assim, palco de uma disputa direta por influência. A situação se intensificou após Bacellar desagradar setores bolsonaristas, o que levou Castro a recuar em seu apoio declarado. Esse enfraquecimento abre espaço para que Wladimir se projete como alternativa viável na chapa oposicionista, agregando capilaridade no interior e funcionando como contraponto à instabilidade da base aliada do governo. Em um município majoritariamente conservador, a dificuldade de Bacellar em consolidar apoio após desentendimentos com a direita — como a crítica direta do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ao seu nome, o recuo de Cláudio Castro em declará-lo candidato do governo e a instabilidade gerada pela demissão de Washington Reis — pode fortalecer a imagem de Campos como território decisivo e posicionar Wladimir como peça estratégica no jogo estadual.
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A tensão entre Wladimir Garotinho e Rodrigo Bacellar também ficou evidente em maio, quando o prefeito afirmou publicamente que não apoiaria a candidatura do deputado estadual ao governo, mesmo com pressão política. Segundo Wladimir, Bacellar estaria dificultando o andamento de algumas obras em Campos justamente para pressioná-lo a declarar apoio. A declaração, feita logo após o anúncio da pré-candidatura de Bacellar, expôs a divisão entre os dois grupos no município e reforçou que, mais do que uma divergência pontual, há uma disputa em curso pelo controle político local e pela projeção estadual a partir desse reduto.
O estado do Rio de Janeiro é o terceiro maior colégio eleitoral do Brasil, atrás de São Paulo, com mais de 34 milhões de eleitores, e Minas Gerais, com cerca de 16 milhões. O Rio tem aproximadamente 13 milhões de votos, o que equivale a 8,4% do eleitorado nacional. O Norte Fluminense reúne perto de 1 milhão de eleitores, cerca de 7% a 8% do total fluminense. Campos dos Goytacazes responde sozinho por 373 mil votos, consolidando-se como o maior colégio eleitoral do interior. A Baixada Fluminense concentra em torno de 3 milhões de eleitores e a capital ultrapassa 5 milhões. Enquanto a Baixada ainda mantém a primazia demográfica, o Norte Fluminense, impulsionado por Campos, vem ganhando protagonismo econômico em função da receita de royalties e participações especiais do pré-sal.
Além da visibilidade crescente de Campos dos Goytacazes e de Wladimir Garotinho para as eleições governamentais, sua influência se estende à formação de uma base política regional com capacidade de mobilização na Alerj. Entre os nomes mais próximos, destaca-se Bruno Dauaire (União Brasil), deputado estadual em seu terceiro mandato e atual secretário estadual de Habitação de Interesse Social, que contou com o apoio direto de Wladimir nas últimas eleições e liderou a votação no município. Dauaire é um dos nomes cotados para disputar uma vaga na Câmara Federal em 2026.
Na disputa por cadeiras na Alerj, outros nomes de Campos também se movimentam. O ex-presidente da Câmara Municipal de Campos dos Goytacazes, Marquinho Bacellar (União Brasil) — irmão de Rodrigo Bacellar — surge como um dos mais articulados, impulsionado pelo destaque político local e pela relação direta com figuras influentes no cenário estadual. Sua possível candidatura é vista como uma tentativa de consolidar ainda mais a presença da família Bacellar na política fluminense. Outro nome que circula nos bastidores é o de Abdu Neme (PSB), vereador de Campos atualmente em seu segundo mandato e ex-secretário municipal de Saúde. Embora afastado do grupo de Wladimir, mantém capital político próprio e já se movimenta com vistas a uma candidatura. Essas articulações indicam que o pleito de 2026 pode ampliar a presença de representantes campistas na Alerj, refletindo a tentativa de Campos de consolidar uma bancada forte e influente na política estadual.
As movimentações políticas em Campos revelam não apenas disputas municipais, mas uma tentativa mais ampla de projetar o município no tabuleiro estadual. A crescente projeção de lideranças campistas, como Wladimir Garotinho, e a fragmentação da base governista abrem espaço para que Campos se afirme como polo estratégico de influência, contrastando com a força de Duque de Caxias, maior município da Baixada Fluminense, tradicional reduto de Washington Reis. Atual prefeito de Caxias, desde janeiro de 2025, é Netinho Reis (MDB), sobrinho de Washington, eleito no primeiro turno em 2024. Essa base local, marcada por alianças fluidas e rivalidades intensas, vem sendo cada vez mais utilizada como plataforma de ascensão, com vistas às eleições de 2026.
Por Milena Dias, Graduanda em Ciências Sociais na UFRJ e integrante dos GTs de Política Local e Mulheres Eleitas, do Lappcom*