A acusação devastadora da PGR contra Bolsonaro

Paulo Gonet, PGR. 2 de setembro de 2025. Flickr STF

Brasília, 2 de setembro de 2025 – Se havia alguma esperança de que as ameaças de Trump ao sistema de justiça brasileiro fizessem o Procurador-Geral da República Paulo Gonet ou os ministros do STF recuarem algum milímetro ou moderarem o tom, a acusação apresentada nesta terça-feira deve fazer qualquer um mudar de ideia.

Gonet fez uma acusação devastadora, trazendo muitos dados e apresentando ao Supremo Tribunal Federal um panorama contundente das acusações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados.

No primeiro dia de um julgamento que pode redefinir os contornos da democracia brasileira, a manifestação da PGR delineou uma conspiração meticulosamente planejada para abolir o Estado Democrático de Direito e manter Bolsonaro no poder a qualquer custo.

Com um estilo sóbrio, mas de uma firmeza absoluta, o Procurador-Geral apresentou ao STF uma denúncia que não deixa margem para dúvidas: Bolsonaro e seus aliados orquestraram uma tentativa sistemática de golpe de Estado.

“O que está em julgamento são atos que hão de ser considerados graves enquanto quisermos manter a vivência de um Estado democrático de Direito”, declarou, deixando claro que a punição é um “imperativo de estabilização do próprio regime”.

A trama golpista revelada

A acusação se baseia nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal, que tipificam crimes contra as instituições democráticas. Para Gonet, os eventos não podem ser tratados como “devaneios utópicos anódinos”, mas como uma sequência coordenada de atos criminosos com um objetivo claro: manter Bolsonaro no poder independentemente dos resultados eleitorais.

O primeiro pilar da conspiração foi a guerra sistemática contra o sistema eleitoral. Bolsonaro liderou pessoalmente uma campanha de desinformação, atacando as urnas eletrônicas e ameaçando que as eleições não aconteceriam.

Paralelamente, uma ofensiva coordenada visava deslegitimar o Judiciário, especialmente o STF e o TSE, criando o ambiente necessário para justificar uma ruptura institucional.

Nos bastidores do poder, a trama ganhava contornos ainda mais graves. Gonet revelou que Bolsonaro e seu Ministro da Defesa convocaram a cúpula militar para apresentar minutas de decretos golpistas.

O objetivo não era consultar, mas cooptar os comandantes para a aventura autoritária. O comandante da Marinha chegou a assentir com a proposta, enquanto os comandantes do Exército e da Aeronáutica foram alvo de uma “campanha ignóbil” para quebrar sua lealdade constitucional.

A violência foi escalando gradualmente. Acampamentos financiados pelos réus em frente a quartéis pediam abertamente “intervenção militar”.

A situação explodiu com a invasão da sede da Polícia Federal, incêndios de veículos em Brasília e a tentativa de explodir um caminhão de combustível perto do aeroporto. O caos, segundo a PGR, era uma etapa calculada para forçar a adesão das Forças Armadas.

Operação “Punhal Verde Amarelo”: o plano mais sinistro

A revelação mais chocante foi o detalhamento da operação “Punhal Verde Amarelo”. A PGR apresentou evidências de um plano meticulosamente elaborado para prender e eliminar autoridades-chave: o ministro do STF que presidia o TSE, além do presidente e vice-presidente eleitos.

O projeto, reconhecido pelo General Mário Fernandes, incluía financiamento específico, monitoramento físico dos alvos e o deslocamento de pessoal e armas para Brasília.

O plano chegou às fases finais de execução, com aproximação física dos alvos. Apenas não se consumou porque o decreto formalizando o golpe não foi assinado pelo então presidente.

Para Gonet, isso demonstra que “quando o Presidente da República e o Ministro da Defesa se reúnem com os comandantes militares para concitá-los a executar fases finais do golpe, o golpe ele mesmo já está em processo de realização”.

A PGR também revelou operações paralelas de inteligência, incluindo o mapeamento de localidades no Nordeste onde o candidato da oposição teve mais votos, com o objetivo de criar barreiras artificiais ao exercício do direito de voto no segundo turno.

Uma organização criminosa sob comando único

Para o Procurador-Geral, todos esses elementos convergem para caracterizar uma organização criminosa sob a “coordenação, inspiração e determinação derradeira do ex-Presidente”.

A sustentação técnica e clara de Gonet, descrita pelo criminalista Kakay como “inequívoca”, desenha um cenário onde a condenação se mostra inexorável.

O julgamento prossegue com o Brasil aguardando uma decisão que pode redefinir os limites da democracia no país. Como observou Kakay, é preciso “acabar logo este julgamento para o Brasil virar esta página”.


📺 Clique aqui para assistir à acusação de Gonet (1:43:50)

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Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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