Trump entre o constrangimento e o cálculo político

Trump disse estar “muito mal” com o ocorrido e garantiu ao emir do Catar que ações como essa “não se repetirão” — sinalizando fissuras na aliança com Israel / Reprodução

O bombardeio, considerado unilateral pela Casa Branca, expõe as fragilidades diplomáticas dos Estados Unidos em equilibrar aliados e interesses no Golfo


Em um ato de guerra que estilhaçou os delicados esforços de paz e violou a soberania de uma nação aliada, Israel conduziu um ataque aéreo na capital do Catar, Doha, na última terça-feira, visando uma delegação do Hamas. A reação da Casa Branca, principal fiadora de Israel no cenário mundial, foi uma mistura pálida de consternação e retórica vazia, expondo a impotência ou a cumplicidade de Washington diante da agressividade de seu parceiro.

O bombardeio, que segundo o Hamas ceifou a vida de seis pessoas, incluindo membros de sua escolta e um oficial de segurança do Catar, ocorreu no coração de um país que, ironicamente, vinha “trabalhando arduamente para assumir corajosamente riscos conosco para negociar a paz”, nas palavras da própria Casa Branca. A delegação de negociação do grupo sobreviveu, mas a mensagem foi clara: para o governo israelense, a via da violência se sobrepõe a qualquer mesa de diálogo.

Em uma declaração conjunta, o exército israelense e a agência de segurança Shin Bet confirmaram friamente ter realizado “um ataque focado na alta liderança do Hamas no Catar”, uma admissão aberta de uma operação de assassinato seletivo em território estrangeiro, desafiando todas as normas do direito internacional.

A resposta do governo Trump foi um retrato da esquizofrenia da política externa americana. A secretária de imprensa, Karoline Leavitt, classificou o ataque como “infeliz” e afirmou que o presidente Donald Trump se sente “muito mal” com o ocorrido. “O presidente vê o Catar como um forte aliado e amigo dos Estados Unidos e se sente muito mal com o local deste ataque”, disse Leavitt, como se a localização, e não o ato de guerra em si, fosse o principal problema.

A declaração da Casa Branca reconheceu a gravidade do ato, afirmando que “bombardear unilateralmente o Catar, uma nação soberana e aliada próxima dos Estados Unidos… não promove os objetivos de Israel ou dos Estados Unidos”. Contudo, a crítica parou por aí, sem anunciar qualquer consequência real para a ação israelense.

Em uma tentativa de apagar o incêndio diplomático, Trump conversou com o emir e o primeiro-ministro do Catar, oferecendo uma garantia que soa oca diante da realidade: “Ele garantiu que tal coisa não acontecerá novamente em seu território”. A questão que paira no ar é como o presidente americano pode oferecer tal garantia, quando Israel demonstra repetidamente que opera segundo suas próprias regras, com uma aparente carta branca de Washington.

O ataque em Doha não foi apenas um ataque ao Hamas. Foi um ataque direto ao processo de paz, um desprezo flagrante pela soberania do Catar e uma humilhação para os Estados Unidos, que se veem incapazes de controlar as ações de seu aliado mais próximo. Enquanto seis corpos são velados em Doha, a diplomacia agoniza, e a sensação que fica é a de que as palavras de “tristeza” da Casa Branca servem apenas como um fraco epitáfio para mais uma chance perdida de paz, sabotada por aqueles que parecem lucrar com a guerra perpétua.

Com informações de Xinhua*

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