A China está dando um xeque-mate na corrida dos semicondutores. O governo chinês anunciou que já testa máquinas próprias de litografia ultravioleta profunda (DUV), tecnologia que pode reduzir a dependência das máquinas da holandesa ASML, hoje líder do setor. Além disso, empresas chinesas começam a produzir chips avançados capazes de competir com os da Nvidia ou, ao menos, diminuir a dependência das tecnologias norte-americanas.
Segundo o Financial Times, reguladores chineses proibiram empresas como ByteDance e Alibaba de comprar ou testar chips da Nvidia, como o RTX Pro 6000D. A justificativa é clara: chips domésticos já igualam ou até superam o desempenho dos modelos que os Estados Unidos permitem vender à China. Em outra reportagem, o jornal afirma que a SMIC, maior fabricante de chips do país, está testando uma máquina DUV criada pela startup Yuliangsheng, em Xangai. O equipamento já produz chips de 7nm e até 5nm, embora ainda com rendimento baixo e dependência de alguns componentes importados.
Litografia DUV vs EUV: a disputa central
A litografia é o processo de desenhar circuitos em wafers de silício. A DUV permite fabricar chips de 7nm a 28nm usando técnicas como multi-patterning, que sobrepõem camadas para compensar limitações. A EUV, usada pela ASML, vai além: permite produzir chips de 2nm ou menores, com maior precisão e densidade. Essa é a tecnologia preferida para chips de ponta usados em inteligência artificial e 5G, mas ela custa caro e exige enorme complexidade.
Por pressão dos Estados Unidos e aliados, a ASML não pode vender máquinas EUV à China desde 2020. O país, então, apostou em desenvolver sua própria DUV, enquanto tenta avançar também na EUV, projeto conhecido internamente como “Monte Everest”.
O governo chinês aposta na autossuficiência. Além do veto aos chips da Nvidia, autoridades obrigam empresas locais a priorizar semicondutores nacionais. Pesquisas em universidades, como a de Pequim, exploram novos materiais, enquanto o governo injeta bilhões em subsídios para empresas como SMIC e Yuliangsheng. A meta é clara: a China quer conquistar independência tecnológica a qualquer custo.
Impactos geopolíticos
A mudança desafia Estados Unidos, Europa, Coreia do Sul, Taiwan e Japão. Antes dependente de TSMC e ASML, a China agora se coloca como concorrente. O efeito colateral das sanções norte-americanas pode ter sido acelerar a inovação chinesa. Se a China dominar a DUV e avançar na EUV, a hegemonia mundial dos semicondutores pode mudar de mãos.
Apesar dos avanços, as máquinas chinesas ainda enfrentam problemas técnicos. O rendimento baixo compromete a produção em massa. Chips de 7nm ou 5nm são competitivos, mas ficam atrás dos 2nm produzidos em Taiwan. Analistas projetam que a maturidade comercial das máquinas chinesas só deve chegar por volta de 2027.
Se consolidar suas tecnologias, a China pode remodelar cadeias globais de semicondutores. Esse avanço reduziria a dependência de fornecedores ocidentais e obrigaria Estados Unidos e Europa a repensar suas estratégias. Taiwan e Japão, importantes na produção e no fornecimento de materiais, também sentiriam o impacto. O futuro aponta para uma guerra tecnológica ainda mais acirrada, em que inovação e autossuficiência definirão quem lidera e quem depende.
Vitória para os BRICS e o Sul Global
Essa conquista não é apenas da China, mas de todos os BRICS — Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Irã, Egito, Etiópia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. Trata-se de uma vitória do Sul Global e, em última instância, de toda a humanidade. O mundo fica menos dependente de fabricantes que seguem ordens políticas de Washington. Sobretudo, evita-se a insegurança de depender do “humor do imperador Trump”, que pode ordenar a suspensão de exportações a países ou governos que não lhe agradam.
A China, ao contrário, não tem histórico de restringir a venda de chips para outros países. Com os semicondutores avançados produzidos em território chinês, o mercado global ganha em estabilidade. A tecnologia passa a ser mais democrática e a inteligência artificial deixa de estar concentrada em poucos polos de poder. Esse movimento representa uma conquista histórica para todos. O surgimento do DeepSeek confirma essa tendência: trata-se de uma ferramenta de inteligência artificial tão poderosa quanto o ChatGPT, mas com uma diferença fundamental. O DeepSeek é de código aberto e, por isso, qualquer pessoa pode entender como ele funciona.