Genial / Quaest confirma que o centro está fugindo de Bolsonaro

Votação da urgência do projeto de anistia aos golpistas, 17 de setembro de 2025. Crédito: Bruno Spada / Câmara dos Deputados

O que outras pesquisas já vinham apontando, a Genial / Quaest confirma: o centro político definitivamente não engoliu a traição ao país praticada pela família Bolsonaro.

Eduardo Bolsonaro se autoexilou nos Estados Unidos e iniciou uma série de articulações junto à Casa Branca que resultaram numa chantagem espúria. Para agradar ao novo calígula do norte, deveríamos sacrificar a independência do nosso judiciário e conceder anistia à bandidagem golpista.

O Brasil respondeu a essas ameaças da maneira mais elegante e mais firme possível: não, obrigado.

Além disso, os projetos do governo começam a se materializar: novos programas sociais, políticas públicas e entregas concretas. A inflação recua de forma consistente, com destaque para alimentos e energia, criando um cenário de estabilidade econômica e social. Esse ambiente ajuda a coesionar o campo da esquerda em torno de Lula, recupera o apoio das massas, e cria uma força gravitacional cada vez maior de atração sobre o centro.

O fenômeno contrário também se manifesta: a radicalização do bolsonarismo produz uma força de repulsão, afastando o centro político.

Esse processo de desgaste foi agravado pela movimentação do PL e de todo o campo bolsonarista em defesa de uma anistia aos golpistas de 8 de janeiro. A aprovação da urgência do projeto, votada na noite de 17 de setembro de 2025, reforça a percepção de que a direita radical segue priorizando a autopreservação da família Bolsonaro e de seus aliados. Trata-se de uma pauta impopular, sobretudo no centro, e que funciona como mais um fator de repulsão desse eleitorado em relação a candidatos ligados ao bolsonarismo. Do outro lado, o presidente Lula e seus aliados se colocam contra a anistia, assumindo uma posição de defesa da ordem democrática e atraindo esse segmento decisivo da opinião pública.

A força do centro

A pesquisa mostra uma sociedade dividida em três grandes blocos principais: cerca de 50 milhões de eleitores se identificam com a esquerda, outros 50 milhões com a direita e aproximadamente 50 milhões compõem o centro político sem posicionamento definido. Essa divisão evidencia a polarização entre campo da esquerda e campo da direita, mas sobretudo destaca a existência de um centro numeroso e decisivo.

A decisão do centro de se afastar de Bolsonaro está explícita na pesquisa quando os entrevistados desse grupo político são questionados sobre quem lhes causa mais medo: 50% dizem ter mais medo de Bolsonaro voltar, enquanto apenas 29% têm mais medo de Lula continuar.

No total da amostra, 49% dos brasileiros afirmam ter mais medo de Bolsonaro voltar, contra 41% que têm mais medo de Lula continuar.

Na parte em que se sonda o potencial de voto, mais uma vez se vê o movimento do centro se afastando do bolsonarismo: entre os eleitores de centro, 46% dizem que poderiam votar em Lula, contra apenas 15% que poderiam votar em Bolsonaro.

Considerando todos os grupos políticos, Lula alcança 55% de potencial de voto (cerca de 86 milhões de eleitores) e enfrenta 42% de rejeição; Bolsonaro, por sua vez, tem 34% de potencial de voto (aproximadamente 53 milhões) e é rejeitado por 64% do eleitorado.

Em números absolutos, isso representa cerca de 22 milhões de eleitores de centro que poderiam votar em Lula, contra apenas 7 milhões que poderiam votar em Bolsonaro. Já Eduardo Bolsonaro tem rejeição de 68% no total, cerca de 106 milhões de eleitores, e no centro sua situação é ainda mais grave: 84% afirmam que o conhecem e não votariam nele. Tarcísio de Freitas aparece com potencial de 20% no centro (cerca de 10 milhões de votos), enquanto Ciro Gomes alcança 18% (9 milhões), ambos longe do desempenho de Lula nesse segmento.

O caso Ciro merece análise à parte. Seu espaço político é muito limitado. A rejeição dele no campo conservador é imensa. Em 2024, Ciro apoiou o deputado bolsonarista André Fernandes para prefeitura de Fortaleza. Embora tenha tentado disfarçar, a imprensa descobriu que ele participava de reuniões de campanha, fazia ligações frequentes para André Fernandes, e seus aliados se engajaram ativamente na campanha do parlamentar. Esse “jogo duplo” prejudicou gravemente sua credibilidade junto ao eleitorado cearense.

Além disso, Ciro se envolveu num escândalo de violência política que obviamente será explorado por seus adversários assim que ele decidir se engajar em qualquer nova campanha eleitoral. Ele atacou com injúrias e termos misóginos a prefeita Janaína Diniz, de Crateús (Ceará). O processo já resultou em condenação e segue em andamento. Essa conduta contribui para intensificar sua rejeição não só no campo conservador, mas também entre eleitores de esquerda que esperam coerência e respeito institucional.

Essas ações tornam Ciro Gomes uma figura que se auto-neutraliza. Ele enfrenta rejeição imensa na direita e parece trabalhar para ampliar sua rejeição também na esquerda. É difícil enxergar futuro político nessa situação. A hipótese de uma candidatura ao governo do Ceará parece frágil, já que lhe faltam aliados sólidos e seu posicionamento político ambíguo mina ainda mais sua viabilidade.

Cenários eleitorais

Na pesquisa espontânea, Lula aparece com 18% — o que corresponde a cerca de 28 milhões de eleitores — contra 6% de Jair Bolsonaro (cerca de 9 milhões), 2% de Tarcísio (3 milhões) e 1% de Ciro (1,5 milhão). Isso significa que Lula tem três vezes mais eleitores espontâneos que Bolsonaro.

Nos cenários estimulados, Lula cresce tanto no primeiro quanto no segundo turno. No primeiro, aparece entre 32% e 43%, a depender do adversário. No segundo, Lula varia de 40% a 47%, sempre à frente. O adversário mais competitivo é Tarcísio, com 35%. Ele tem repetido nos últimos dias que não será candidato a presidente em 2026 e que sua prioridade é se firmar como governador de São Paulo. No entanto, isso pode ser apenas um recuo tático.

Ratinho aparece com 32% e Jair Bolsonaro com 34%, em cenários de segundo turno contra Lula. Eduardo Bolsonaro, em eventual disputa no segundo turno contra Lula, despencou para 29%, contra 47% do petista.

O dado mais importante, porém, é a tendência: enquanto Lula avança, todos os adversários recuam. O centro político, cada vez mais distante de Bolsonaro, aparentemente vê em Lula um polo de estabilidade econômica, respeito à independência das instituições e defesa da soberania nacional — motivo suficiente para votar nele.

Miguel do Rosário: Miguel do Rosário é jornalista e editor do blog O Cafezinho. Nasceu em 1975, no Rio de Janeiro, onde vive e trabalha até hoje.
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