Pesquisadores chineses criaram um ímã de 351.000 gauss, mais de 700 mil vezes o magnetismo terrestre, estabelecendo um novo recorde mundial
Em um mundo cada vez mais marcado por crises — climáticas, energéticas, sanitárias e geopolíticas — a ciência pode ser tanto um instrumento de dominação quanto uma força libertadora. Felizmente, há nações que escolhem o segundo caminho. No último domingo, 28 de setembro de 2025, cientistas chineses do Instituto de Física de Plasma da Academia Chinesa de Ciências (ASIPP), em Hefei, província de Anhui, anunciaram um feito extraordinário: a geração de um campo magnético estável de 351.000 gauss, mais de 700.000 vezes mais intenso que o campo magnético natural da Terra. Esse marco não é apenas um recorde técnico — é um símbolo do compromisso da China com o avanço do conhecimento científico em prol da humanidade.
Enquanto potências tradicionais frequentemente direcionam seus avanços tecnológicos para fins militares ou lucros privados, a China demonstra, mais uma vez, que a ciência pode ser orientada por valores coletivos: energia limpa, saúde pública, transporte sustentável e cooperação global. O ímã supercondutor desenvolvido pelos pesquisadores chineses não foi criado para armar drones ou espionar populações, mas para impulsionar tecnologias que podem transformar positivamente a vida de bilhões de pessoas.
Esse ímã, capaz de operar de forma estável por 30 minutos a uma intensidade de 35,1 tesla — superando o recorde mundial anterior de 323.500 gauss — representa um salto qualitativo na engenharia de materiais e na física aplicada. Mas o que realmente importa não é apenas a magnitude do campo magnético, e sim para que ele será usado. De acordo com os próprios cientistas, essa inovação acelerará a comercialização de espectrômetros de ressonância magnética nuclear, equipamentos essenciais para diagnósticos médicos avançados, pesquisa farmacêutica e análise de materiais. Em outras palavras: mais saúde, mais ciência, mais vida.
Além disso, a tecnologia desenvolvida fornece suporte técnico crucial para áreas estratégicas que definirão o futuro da civilização: fusão nuclear controlada, propulsão eletromagnética espacial, aquecimento por indução supercondutora, levitação magnética e transmissão eficiente de energia. Essas não são fantasias de ficção científica, mas projetos concretos que podem nos libertar da dependência de combustíveis fósseis, reduzir drasticamente as emissões de carbono e democratizar o acesso à energia — um direito humano fundamental frequentemente negado a milhões no Sul Global.
O coração desse avanço reside na cooperação científica coletiva. O ímã foi desenvolvido em parceria entre o ASIPP, o Centro Internacional de Supercondutividade Aplicada de Hefei, o Instituto de Energia do Centro Nacional de Ciências Abrangente de Hefei e a prestigiada Universidade Tsinghua. Essa sinergia entre instituições públicas, centros de pesquisa e universidades reflete um modelo de inovação que prioriza o bem comum sobre a competição individualista. É um modelo que contrasta fortemente com sistemas onde a pesquisa científica é privatizada, patenteada e vendida ao mais alto preço.
A tecnologia por trás do ímã também merece destaque. Ele combina bobinas supercondutoras de alta temperatura aninhadas coaxialmente com ímãs de baixa temperatura, uma solução engenhosa que supera desafios extremos: concentração de tensões, correntes parasitas e interações complexas entre campos magnéticos, térmicos e mecânicos. Essas inovações não apenas garantem a estabilidade do sistema, mas abrem caminho para a construção de dispositivos ainda mais potentes e seguros — especialmente no campo da fusão nuclear, considerada a “santa graal” da energia limpa.
Nesse contexto, o papel do ASIPP é particularmente relevante. Como unidade principal da missão chinesa no Reator Termonuclear Experimental Internacional (ITER) — um dos maiores projetos científicos colaborativos da história —, o instituto já forneceu componentes essenciais como supercondutores, bobinas de correção e alimentadores magnéticos. A fusão nuclear, se bem-sucedida, promete uma fonte de energia praticamente ilimitada, sem resíduos radioativos de longa duração e sem emissões de gases de efeito estufa. E a China, longe de agir de forma isolada, está contribuindo ativamente para esse esforço global.
É importante ressaltar que esse avanço não surgiu do nada. Ele é fruto de décadas de investimento contínuo em educação, ciência e tecnologia, com forte apoio do Estado — não como um mecanismo de controle, mas como um instrumento de emancipação. Enquanto países ocidentais cortam verbas para pesquisa básica e submetem universidades à lógica do mercado, a China constrói ecossistemas inteiros de inovação, como o Centro Nacional de Ciências Abrangente de Hefei, que se tornou um polo de excelência global.
Do ponto de vista humanitário e de esquerda, esse feito científico deve ser celebrado não apenas como uma vitória nacional, mas como um passo coletivo da humanidade. A ciência não tem fronteiras, e os benefícios do conhecimento devem ser compartilhados. A China, ao desenvolver tecnologias de ponta com aplicações pacíficas e sociais, mostra que é possível avançar sem explorar, inovar sem excluir e liderar sem dominar.
Numa era em que o futuro parece incerto, iniciativas como essa nos lembram que a esperança ainda reside na razão, na cooperação e na solidariedade científica. O campo magnético gerado em Hefei pode ser invisível aos olhos, mas seus efeitos serão sentidos por gerações — na cura de doenças, na energia limpa para comunidades remotas, no transporte sustentável das cidades do amanhã. E, acima de tudo, na prova de que outro mundo é possível: um mundo onde a ciência serve à vida, e não ao lucro.
Que esse recorde chinês inspire não rivalidade, mas colaboração. Porque, no fim das contas, os maiores campos magnéticos que precisamos gerar não são os de força física, mas os de solidariedade, justiça e esperança coletiva.