A China atingiu um marco histórico em seu programa espacial na noite desta quarta-feira (15) ao realizar o 600º lançamento da série de foguetes Long March, consolidando-se como uma das potências mais ativas no espaço. A missão, conduzida pela Corporação de Ciência e Tecnologia Aeroespacial da China (CASC), teve como objetivo expandir a megaconstelação de satélites de internet banda larga Guowang, projeto estatal que concorre diretamente com a Starlink, da SpaceX.
O foguete Long March 8A decolou às 22h33 (horário de Brasília) da plataforma 1 do Centro de Lançamento Espacial Comercial de Hainan, no sul do país. Em comunicado, a CASC confirmou o sucesso da missão e informou que a carga útil era o 12º grupo de satélites da constelação Guowang, embora não tenha revelado o número exato de unidades enviadas.
Com base em lançamentos anteriores, que transportaram nove satélites por voo, estima-se que 95 satélites Guowang estejam agora em operação, além de equipamentos de teste. A meta final é ambiciosa: lançar quase 13 mil satélites, criando uma rede global de internet em órbita baixa.
A constelação Guowang: o projeto chinês para rivalizar a Starlink
Liderada pela China SatNet, a constelação Guowang (que significa “Rede Nacional”) é o principal esforço da China para criar sua própria infraestrutura global de internet via satélite, reduzindo a dependência de sistemas estrangeiros e aumentando sua autonomia tecnológica e militar no espaço.
O plano prevê 400 satélites ativos até 2027, número suficiente para começar a oferecer serviços de conectividade de alta velocidade em território chinês e em países parceiros da Iniciativa Cinturão e Rota (Nova Rota da Seda).
A corrida é diretamente com a Starlink, de Elon Musk, que já possui mais de 6 mil satélites em órbita e fornece internet a dezenas de países. A China vê o domínio das constelações em órbita baixa (LEO) como estratégico para segurança nacional e competitividade global, uma vez que essas redes também podem ter usos militares e de comunicação segura.
O foguete Long March 8A e a nova geração da indústria espacial chinesa
O Long March 8A é uma versão modernizada do Long March 8 tradicional. O modelo mantém propulsores laterais e motores de hidrogênio e oxigênio líquido em seu segundo estágio, mas foi redesenhado com uma carenagem de 5,2 metros de diâmetro, permitindo o transporte de múltiplos satélites por lançamento.
Todos os quatro voos realizados até agora com o Long March 8A foram dedicados à constelação Guowang — uma evidência de que a China está priorizando o projeto como um dos pilares de sua política espacial comercial e de defesa.
Segundo o portal SpaceNews, a versão 8A oferece maior capacidade de carga e eficiência em comparação com os foguetes hipergólicos mais antigos da família Long March, que utilizavam combustíveis tóxicos e menos eficientes.
A impressionante escalada dos lançamentos chineses
O primeiro voo da série Long March aconteceu em 24 de abril de 1970, com o lançamento do satélite Dongfanghong-1. Desde então, o programa passou por uma expansão sem precedentes.
Os marcos históricos mostram o ritmo crescente:
100º lançamento: 2007
200º: 2014
300º: 2019
400º: 2021
500º: 2023
600º: 2025
Esse salto revela a rápida industrialização do setor espacial chinês. Apenas nos últimos dois anos, o país realizou mais de 120 lançamentos orbitais, um volume comparável ao da SpaceX e superior ao de todas as demais nações somadas.
Até o momento, 2025 já soma 62 lançamentos orbitais pela China, aproximando-se do recorde anual de 68 alcançado em 2024.
Foguetes do futuro: Long March 10, 12A e 9
A CASC e suas subsidiárias trabalham em uma nova geração de foguetes de médio e superpesado porte, com foco em missões tripuladas à Lua e Marte.
Long March 10: será o principal veículo para transportar astronautas chineses à Lua, dentro do programa de exploração lunar tripulada previsto para 2030.
Long March 9: o superfoguete pesado projetado para colocar até 150 toneladas em órbita baixa, rivalizando com o Starship da SpaceX e o SLS da NASA.
Long March 12A: em desenvolvimento, poderá se tornar o primeiro modelo reutilizável da série, um passo decisivo rumo à redução de custos e sustentabilidade operacional.
Essa nova geração é parte do esforço chinês para transformar o país em líder global na economia espacial até 2040, integrando comunicações, energia e defesa em um mesmo ecossistema orbital.
Próximos lançamentos e a agenda espacial de outubro
A agenda de lançamentos chineses segue intensa. Após o sucesso da missão de quarta-feira, estão previstos:
Long March 6A – sexta-feira (17), a partir de Taiyuan;
Lijian-1 (foguete sólido) – sábado (18), a partir de Jiuquan;
Long March 5 – quarta-feira (22), de Wenchang;
Long March 3B – domingo (26), de Xichang.
Embora as datas e locais sejam anunciados previamente, as cargas úteis permanecem em sigilo até a decolagem, uma prática comum do programa espacial chinês para proteger projetos de natureza militar ou estratégica.
Corrida espacial em nova fase: China x EUA
O fortalecimento do programa espacial chinês ocorre em um momento de acirramento da competição orbital com os Estados Unidos. Enquanto a SpaceX continua expandindo a Starlink, empresas e agências norte-americanas enfrentam a ascensão da China SatNet e o avanço tecnológico do país asiático.
Curiosamente, a rivalidade entre potências espaciais também cria parcerias inesperadas. A própria SpaceX tem lançado satélites da Amazon, concorrente direta da Starlink, como parte de um acordo comercial de transporte orbital.
Em 13 de outubro, a SpaceX realizou o terceiro lançamento contratado pela Amazon para construir a constelação Project Kuiper, sua futura rede global de internet. A colaboração, embora pragmática, ilustra o quanto a corrida espacial moderna é guiada tanto por estratégia quanto por mercado.
Um novo capítulo na disputa pelo domínio orbital
Com o 600º lançamento da série Long March, a China consolida sua capacidade autônoma de explorar o espaço em larga escala e entra de vez na corrida por redes orbitais de comunicação.
Cada novo lote da constelação Guowang não apenas amplia a infraestrutura de internet via satélite do país, mas também fortalece sua presença geopolítica e tecnológica no espaço, um domínio que se torna cada vez mais estratégico e competitivo.
“A China alcançou um ponto de maturidade espacial que a coloca lado a lado com os Estados Unidos na corrida pela conectividade global e pelo controle das órbitas terrestres”, avaliou o portal SpaceNews em editorial recente.
📊 Resumo do marco espacial chinês:
Missão: 600º lançamento da série Long March
Foguete: Long March 8A
Data: 15 de outubro de 2025
Local: Centro de Lançamento de Hainan (China)
Objetivo: Lançar o 12º grupo de satélites da constelação Guowang
Satélites estimados: 9 (total de 95 em operação)
Meta da constelação: 13 mil satélites até o fim da década
Lançamentos chineses em 2025: 62 (recorde anterior: 68 em 2024)
Próximos foguetes: Long March 6A, Lijian-1, Long March 5 e 3B