Brasil e Malásia negociam ‘joint venture’ para produção de semicondutores e avançam em acordos de tecnologia

A ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, confirmou que está em fase de construção uma joint venture entre a empresa brasileira Tellescom e uma parceira malasiana para a produção de semicondutores. A informação foi divulgada em entrevista ao Brasil de Fato, durante a visita da comitiva do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Kuala Lumpur, na Malásia.

Segundo a ministra, a iniciativa tem como meta retomar a capacidade produtiva nacional de chips e inserir o Brasil de forma mais ativa em uma cadeia global estratégica, essencial para a indústria de tecnologia e energia.

“A parceria com a Malásia deve fortalecer a retomada da indústria nacional de semicondutores e abrir caminho para que o Brasil participe de forma mais ativa dessa cadeia global”, afirmou Luciana Santos.


Parceria tecnológica e foco na transição energética

A joint venture, modelo de cooperação que envolve compartilhamento de investimentos, tecnologias e resultados, deve concentrar-se na fabricação de chips destinados a veículos elétricos, híbridos e equipamentos de transição energética.

A nova rota tecnológica faz parte da estratégia do governo brasileiro de reindustrialização e soberania digital, tendo como eixo a reativação do Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec) — estatal que havia sido desestatizada durante a gestão anterior e retomou operações com foco em inovação e semicondutores.

De acordo com fontes do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a parceria com empresas da Malásia foi escolhida por causa da experiência do país asiático no setor de microeletrônica, consolidada ao longo de quatro décadas como polo global de montagem e encapsulamento de chips.

Acordos bilaterais e cooperação científica

Durante a visita oficial à Malásia, Brasil e Malásia assinaram cinco acordos de cooperação nas áreas de ciência, tecnologia e inovação, abrangendo temas como semicondutores, transformação digital, bioeconomia e cooperação espacial.

Os acordos preveem transferência de conhecimento, intercâmbio técnico e projetos conjuntos de pesquisa em universidades e centros de desenvolvimento tecnológico. O governo brasileiro avalia que a aproximação com o país asiático pode abrir novas oportunidades de investimento no setor de tecnologias verdes e indústria de alta complexidade.

Em nota, o MCTI informou que o plano de cooperação será articulado com o Programa Nova Indústria Brasil, lançado em janeiro, que prevê R$ 300 bilhões em crédito e financiamento até 2028 para fortalecer a produção nacional de bens tecnológicos e avançar na descarbonização da economia.

Ceitec e soberania tecnológica

A ministra Luciana Santos destacou que a retomada do Ceitec, sediado em Porto Alegre (RS), é um dos pilares da política de inovação do governo. O centro será o responsável por desenvolver e testar novos circuitos integrados com foco em mobilidade elétrica, rastreamento logístico e segurança digital.

“Estamos reconstruindo uma base tecnológica que foi desestruturada e que é essencial para a soberania do país. Sem semicondutores, não há indústria moderna, nem autonomia energética”, afirmou Luciana.


O Ceitec deverá funcionar em sinergia com a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que financiará parte dos investimentos no setor.

Terras raras e política mineral

Além dos semicondutores, a ministra destacou o potencial brasileiro na produção de terras raras, grupo de 17 elementos químicos indispensáveis à fabricação de motores elétricos, baterias e equipamentos de alta tecnologia.

O Brasil possui a segunda maior reserva mundial dessas substâncias, atrás apenas da China, e planeja explorar o recurso com base em critérios científicos e ambientais.

Para coordenar a política de aproveitamento desses minerais, o governo criou o Conselho Nacional de Política Mineral (CNPM), órgão vinculado diretamente à Presidência da República. O colegiado será responsável por definir regras de exploração, autorizações de pesquisa e políticas de agregação de valor, evitando a exportação bruta dos recursos.

“O CNPM foi criado para garantir que esse patrimônio natural seja explorado com foco no desenvolvimento científico e sustentável, sem repetir modelos de dependência e privatização das reservas”, explicou Luciana Santos.


Estratégia global e integração industrial

A parceria com a Malásia também se insere em uma agenda mais ampla de reintegração produtiva do Brasil às cadeias globais de tecnologia, em especial no contexto do BRICS ampliado, que inclui economias emergentes da Ásia, África e Oriente Médio.

A Malásia é hoje um dos principais produtores de componentes eletrônicos do Sudeste Asiático e possui empresas especializadas em design e encapsulamento de chips, segmentos considerados essenciais para a expansão da indústria 4.0.

Fontes diplomáticas indicam que o projeto de joint venture poderá contar com financiamento conjunto de bancos de desenvolvimento e fundos soberanos asiáticos, além de apoio do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), instituição do BRICS sediada em Xangai.

Cadeia de valor e competitividade

Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), o Brasil importa 98% dos semicondutores que consome, o que torna o setor altamente dependente de fornecedores estrangeiros. A produção local permitiria reduzir custos e ampliar a competitividade da indústria nacional em segmentos estratégicos, como automotivo, telecomunicações, energia e defesa.

A joint venture Brasil–Malásia, portanto, é vista como um passo inicial para a reconstrução da cadeia produtiva nacional de microeletrônica, setor considerado central para o desenvolvimento econômico e tecnológico das próximas décadas.

“A retomada do Ceitec e a cooperação com a Malásia fazem parte de uma visão de longo prazo para consolidar o Brasil como produtor de tecnologia, não apenas consumidor”, concluiu Luciana Santos.

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