O senador Randolfe Rodrigues defende que a luta contra o crime deve ultrapassar fronteiras partidárias e critica o uso eleitoral da comissão
Em um dia de alta tensão política e urgência social, o Congresso Nacional instalou, nesta terça-feira (4), a aguardada CPI do Crime Organizado. Em meio aos debates sobre a composição da mesa diretora, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) fez um apelo contundente para que a gravidade da segurança pública no país se sobreponha às disputas partidárias, afirmando que a comissão não é “de governo nem de oposição”.
Para o senador, o Brasil enfrenta um inimigo que não veste farda partidária e exige uma resposta unificada do Estado. “Hoje o Brasil trava “uma guerra contra o crime organizado” e a guerra tem que ser acima de qualquer conotação política e partidária”, declarou Rodrigues.
A urgência, segundo ele, é absoluta. O senador pintou um retrato sombrio da capilaridade das facções, que hoje se infiltram em todas as 27 unidades da federação. “O que aconteceu no Rio de Janeiro”, disse, referindo-se a recentes episódios de violência, “é o caso mais clássico, mas nós temos um problema que é do meu Amapá, do Amazonas, do Pará, de todos os cantos”.
Rodrigues detalhou que, lamentavelmente, o Comando Vermelho (CV) já atua em 24 estados, enquanto o PCC marca presença em 25. Diante desse cenário, ele prestou homenagem “aos policiais que foram abatidos em combate, em defesa da sociedade”, mas insistiu que o problema deve ser tratado em sua raiz nacional.
Uma direção “plural” para uma guerra complexa
Apesar do clima político, Randolfe Rodrigues elogiou a composição da direção da CPI, que ele acredita ser o “melhor diagnóstico” para um trabalho colaborativo. A comissão será presidida e relatada por dois delegados de polícia, ambos com “currículo dedicado ao combate ao crime organizado”, enquanto a vice-presidência ficará com um representante da oposição.
O senador defendeu que a CPI deve funcionar como um braço de apoio às ações já em curso, citando operações recentes na Bahia e no Ceará que desmontaram “muitos braços do Comando Vermelho”.
A estratégia para a vitória, no entanto, não se resume a operações policiais. Rodrigues foi enfático: “O combate às facções criminosas […] se faz primeiro com inteligência. Segundo, junto com isso, com coordenação”. Ele cobrou a união de esforços entre a Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e as polícias estaduais (Militares e Civis).
“Não se combate o crime organizado com flores”, resumiu o senador. “Se combate o crime organizado com inteligência e com ações das polícias coordenadas.”
Legislação parada e o “desespero” da oposição
Randolfe Rodrigues aproveitou a instalação da CPI para cobrar celeridade do próprio Congresso na aprovação de medidas cruciais. Ele criticou duramente a demora na votação da PEC da Segurança Pública, enviada pelo governo Lula em abril. “É lamentável ela não ter sido votada ainda”, disse, explicando que a proposta estabelece a cooperação direta da União com os estados.
Além da PEC, o senador destacou um projeto de lei enviado pelo Executivo nesta semana, que visa aumentar a pena para membros de organizações criminosas. “Essa CPI pode muito contribuir no avanço dessas matérias”, projetou.
Questionado se teme que a oposição use a comissão como palanque eleitoral, Rodrigues foi direto: “Eu acho que eles estão desesperados para isso”.
O senador, contudo, buscou demonstrar tranquilidade, afirmando que o governo não está preocupado em “dividir” a CPI e está seguro de seu papel no combate ao crime. Ele citou a “Operação Carbono Oculto”, que “atacou o fluxo financeiro do PCC”, como exemplo da seriedade do trabalho federal.
“Se trabalharmos em conjunto […] nós podemos e devemos vencer essa guerra”, finalizou.
Tensão paralela: A CPI do INSS e a visita “inusitada”
A sombra de outra comissão parlamentar pairou sobre as declarações do dia. Randolfe Rodrigues foi questionado sobre a CPI do INSS, onde o governo enfrentou reveses anteriores, e sobre o depoimento do ministro Onyx Lorenzoni, esperado para quinta-feira.
O senador revelou um fato que classificou, no mínimo, como “inusitado”: Lorenzoni esteve no gabinete do senador Rogério Marinho (Oposição) nesta terça, véspera de seu depoimento.
“Inusitado o depoente visitar os senadores na véspera do depoimento”, ironizou Rodrigues. “Eu não conheço situação igual”.
Para o senador, Lorenzoni “tem muito o que explicar”, incluindo supostas doações recebidas de envolvidos em esquemas no INSS e o “envolvimento de parentes dele junto com as fraudes”, período que, segundo Rodrigues, coincide com sua gestão à frente da pasta.
A visita, na avaliação do parlamentar, lança dúvidas sobre a isenção dos questionamentos que virão da oposição. “Eu acho que está flagrante a suspensão dos colegas da oposição […] as inquirições dos colegas da oposição ficarão um tanto suspeitas”, alfinetou.
Conforme o calendário do Congresso, a CPI do INSS deve apresentar suas conclusões em dezembro, encerrando os trabalhos em fevereiro. A recém-instalada CPI do Crime Organizado tem um prazo de 180 dias, devendo durar até junho, com ambos os trabalhos sendo suspensos durante o recesso parlamentar.