Opinião: Lula leva o poder à Amazônia e o clima à política

A transferência temporária do poder para Belém marca um gesto político que une soberania nacional, diplomacia ambiental e justiça climática / Reprodução

Pela primeira vez desde a Rio-92, o Brasil muda simbolicamente sua capital para reforçar o protagonismo amazônico no debate global sobre o clima


Em um mundo onde a lógica capitalista frequentemente dita a exploração desenfreada dos recursos naturais, transformando florestas em commodities e comunidades em obstáculos ao progresso, gestos simbólicos carregados de intenção política são mais urgentes do que nunca. A decisão do presidente Lula de sancionar a lei que transfere temporariamente a capital federal para Belém, durante a COP30, é muito mais que um mero protocolo administrativo. É um ato estratégico de resistência e um recado claro ao mundo: o Brasil recoloca o bioma Amazônia no centro do debate sobre o futuro do planeta.

A medida, prevista na Constituição e com precedentes como a Rio-92, possui um profundo significado. Ao instalar simbolicamente o coração da nação no coração da sua maior floresta, o governo força o mundo a encarar a realidade.

Não se discute o clima global de um planalto central distante, de escritórios climatizados que, muitas vezes, emitem decretos sobre o que não conhecem. Discute-se o clima a partir do chão da floresta, sentindo o seu pulso, ouvindo (ainda que simbolicamente) as vozes de seus povos. Essa mudança de perspectiva é um antídoto necessário à abstração tecnocrática que domina as negociações internacionais.

Leia: Lula sanciona lei que transforma Belém na capital temporária do Brasil durante a COP30

A transferência da capital para Belém é um golpe de mestre na narrativa que separa economia de ecologia. Ela evidencia, de forma prática, que a agenda ambiental não é um apêndice, um “departamento” do governo, mas a base sobre a qual qualquer projeto de nação deve se erguer.

Ao ampliar a interlocução com as delegações internacionais a partir da Amazônia, o Brasil não apenas consolida seu protagonismo, mas apresenta a própria floresta como a principal autoridade nas discussões. É a materialização do lema: “nada sobre nós, sem nós”, onde o “nós” é a floresta e suas populações.

Este ato se contrapõe frontalmente à lógica capitalista de curto prazo, que enxerga a Amazônia como uma fronteira a ser conquistada e esgotada.

Ao impulsionar o desenvolvimento local de Belém em torno de um evento climático, demonstra-se que a nova economia – a economia verde, de baixo carbono, do conhecimento tradicional e da bioeconomia – é viável e desejável. É um contraponto ao modelo predatório que, historicamente, tem sido imposto à região, gerando lucros para poucos e prejuízos incalculáveis para a humanidade.

A simbologia de ter os três Poderes da República operando a partir da Amazônia, mesmo que por poucos dias, é um lembrete poderoso de que a soberania nacional não se exerce apenas com trator e motosserra, mas também com ciência, preservação e diplomacia climática.

É um compromisso com as gerações futuras, um reconhecimento de que a maior riqueza do Brasil não está no que pode ser extraído e vendido, mas no que pode ser preservado e celebrado como um bem comum global.

Portanto, longe de ser um mero gesto protocolar, a transferência da capital para Belém na COP30 é uma declaração política profunda. É a afirmação de que o Brasil opta por se reposicionar no mundo não como o celeiro do agronegócio exportador a qualquer custo, mas como o guardião da maior floresta tropical do planeta.

É um passo ousado e necessário em um planeta que clama por ações concretas, e não apenas por promessas vazias feitas à distância. O futuro, afinal, não será decidido nos centros financeiros do mundo, mas a partir da vitalidade de biomas como a Amazônia. E é de lá, mesmo que temporariamente, que o Brasil deve falar.

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