A “The Economist” joga uma bomba no debate: por que a revista agora defende a legalização da cocaína
A publicação, conhecida por sua sobriedade, choca ao propor a legalização e regulamentação da droga como a única saída eficaz contra o poder dos traficantes e as mortes por overdose. Num cenário político já aquecido, onde a simples menção à descriminalização de drogas causa calafrios em governantes, uma das vozes mais influentes do liberalismo econômico mundial decidiu dobrar a aposta. A revista The Economist, em um editorial surpreendente, não pediu o fim da guerra às drogas. Pediu a rendição controlada: é hora de legalizar e regulamentar a cocaína.
A proposta, que para muitos soa radical, foi publicada na semana passada sob o título “A força bruta não é páreo para os traficantes de drogas de alta tecnologia de hoje”. O texto é uma análise crua do fracasso das políticas atuais, mirando especificamente na abordagem de Donald Trump nos Estados Unidos.
A revista descreve como Trump tem usado “força militar e violência sem precedentes” em sua cruzada, mas argumenta que o presidente americano está fadado ao fracasso. O motivo? A indústria dos narcóticos se tornou “mais inovadora e nebulosa do que nunca”.
Os números pintam um quadro sombrio que parece sustentar a tese da revista. As drogas ilegais matam cerca de 600 mil pessoas por ano em todo o mundo. Grande parte dessas mortes vem de overdoses de opioides. Enquanto isso, os EUA veem o tráfico de cocaína e substâncias sintéticas explodir, apesar da repressão militarizada.
Diante desse cenário, a Economist apresenta sua solução disruptiva: “A maneira mais eficaz de reduzir as mortes, a violência e a corrupção seria legalizar e regulamentar a produção e o consumo de cocaína.”
A revista detalha como isso funcionaria na prática, em uma passagem que define o cerne de sua argumentação:
“Isso eliminaria o preço premium que motiva os criminosos mais violentos do mundo. Os consumidores teriam certeza da dosagem e da qualidade – um incentivo para evitar misturas ilegais perigosas. As prisões ficariam mais vazias e o sistema de justiça criminal poderia se concentrar em sintéticos mais letais. Infelizmente, na maioria dos países consumidores, nem os eleitores nem os políticos estão interessados.”
A publicação ainda critica diretamente as táticas de força, como “bombardear barcos no Caribe”. Embora possam ser bem recebidas pelos apoiadores de Trump, a revista as classifica como “quase certamente ilegal e improvável que faça muita diferença”.
Para a Economist, a solução de curto prazo seria focar na coleta de informações e na punição dos “mais poderosos” das redes de tráfico. Mas, no fim das contas, a revista insiste que só a legalização da droga (classificada como Classe A no Reino Unido) seria capaz de reduzir drasticamente o preço, desafogar o sistema de justiça e, o mais importante, tornar o consumo mais seguro.
Como a própria publicação conclui, de forma lapidar: “Sem a legalização, a luta contra as drogas ilícitas é árdua”.
O debate já ferve no Reino Unido
A ousadia da The Economist não surge no vácuo. No Reino Unido, a questão ganhou destaque nos últimos meses, impulsionada pela intervenção do prefeito de Londres, Sadiq Khan, que sugeriu a descriminalização de pequenas quantidades da droga.
A cocaína está longe de ser um problema marginal no país. Dados do Ministério do Interior mostram que ela foi a segunda droga mais popular depois da cannabis em 2024, com 2,1% dos indivíduos entre 16 e 64 anos admitindo o consumo.
A sugestão de Khan foi o suficiente para que o jornal Spectator promovesse um debate acalorado sobre o assunto entre Lord Falconer e o Dr. Neil Shastri-Hurst. No entanto, a ideia foi prontamente rejeitada por Sir Mark Rowley, o chefe da Polícia Metropolitana de Londres, mostrando a distância entre a política e a prática policial.
Mas Khan não é o único a considerar “maneiras inovadoras” de lidar com o problema. Zack Polanski, o novo líder do Partido Verde, foi ainda mais longe. Em declarações à BBC no início deste mês, Polanski declarou abertamente que deseja legalizar todas as drogas, incluindo substâncias da Classe A, como heroína e crack.
A barreira da opinião pública
Embora a The Economist e o Partido Verde possam estar abrindo uma nova frente no debate, a realidade é que a maioria dos eleitores e políticos ainda não está pronta para essa conversa.
Pesquisas da YouGov mostram que a maioria dos britânicos acredita que a descriminalização de drogas pesadas traria um cenário de pesadelo: um provável aumento no consumo de drogas, mais crimes e mais efeitos negativos para a saúde pública.
No momento, por mais lógica que a Economist tente parecer, a proposta de legalizar a cocaína continua sendo tudo, menos uma pauta que gere votos.