As tarifas de Trump transformaram o cobre em arma financeira — e o “Dr. Cobre” agora mede a temperatura da especulação.
Em um deslumbrante salão de baile no West End de Londres, o clima é de euforia. Lustres imponentes iluminam 1.500 convidados de smoking. Este é o jantar anual da London Metals Exchange (LME), o ponto de encontro onde os metais “básicos” encontram o glamour do mundo financeiro. Na mesa VIP, ministros de estado e CEOs de mineradoras globais conversam e negociam o futuro da indústria enquanto degustam Chardonnay. A atmosfera é tão descontraída que apostas são feitas sobre a duração do espetáculo pós-jantar – este ano, uma apresentação de 20 minutos de “Mamma Mia!” estrelando os próprios chefões da LME. Os vencedores das apostas levam para casa uma garrafa de espumante.
Os operadores de metais têm, de fato, muitos motivos para estarem otimistas. O cobre, em particular, vive uma valorização expressiva, com seu preço ultrapassando os US$ 10.600 por tonelada em Londres, a maior cotação dos últimos 18 meses.
Esse otimismo tem um motor claro: a política econômica de Donald Trump. As tarifas impostas pelo presidente americano às importações de alumínio, cobre e aço criaram vastas e lucrativas oportunidades de arbitragem (a prática de comprar barato em um mercado e vender caro em outro), que estão sendo ativamente exploradas.
A bonança já gera frutos bilionários. Os preços elevados impulsionaram uma fusão de US$ 50 bilhões entre a Anglo American e a Teck Resources, duas gigantes da mineração. A BHP, maior mineradora do mundo, já considera reabrir minas desativadas. Em um movimento que mostra a dimensão da febre, até a Saudi Aramco, uma empresa focada no setor petrolífero, está contratando operadores de cobre.
No entanto, essa febre do cobre surge em um momento estranhamente oportuno. O metal é conhecido há muito tempo no mercado como “Dr. Cobre” por sua notável capacidade de diagnosticar as condições da economia real. Quando a demanda por cobre é alta, a indústria global (construção, manufatura, energia) está aquecida.
O problema é que, neste momento, o “doutor” não deveria estar tão febril. A economia mundial, embora resiliente, está longe de viver uma expansão vigorosa. O que, então, está acontecendo?
Três explicações possíveis se destacam: uma demanda explosiva, uma escassez de oferta ou políticas que distorcem os fundamentos do mercado.
A tese da demanda verde e da IA
Vamos começar pela demanda. Os investidores otimistas apontam para dois pilares: a transição energética e o boom da inteligência artificial.
Um carro elétrico, por exemplo, precisa de duas a quatro vezes mais cobre do que um carro a gasolina. O metal também é vital para redes elétricas e turbinas eólicas. Este ano, espera-se que a construção de novos data centers para IA consuma cerca de 300.000 toneladas de cobre refinado, o equivalente a 1% da produção global.
Contudo, essa tese já vem sendo defendida há algum tempo. Na festa da LME, analistas brincavam que a “grande crise do cobre” (a falta dele) parece estar sempre “daqui a quatro ou cinco anos”. Além disso, à medida que novas tecnologias amadurecem, elas se tornam mais eficientes: um carro elétrico fabricado em 2025 precisa de cerca de 10% menos cobre do que um fabricado em 2020.
Enquanto isso, os motores tradicionais da demanda estão engasgando. A economia chinesa, em dificuldades, está se tornando menos dependente da construção civil, um setor que historicamente consumia quantidades massivas do metal. Segundo Tom Price, do banco Panmure Liberum, essa mudança na China poderia, sozinha, liberar 2 milhões de toneladas de cobre por ano. A previsão de Price é sombria para os otimistas: ele estima que a demanda mundial por cobre diminuirá, e não aumentará, no restante deste ano.
A tese da escassez de oferta
Se a demanda não explica, talvez a oferta o faça. Em 8 de setembro, um deslizamento de lama atingiu a mina de Grasberg, na Indonésia, a segunda maior do mundo. A instalação permanece fechada. A Freeport, sua operadora, não espera que a produção total seja retomada antes de 2027.
Essa paralisação, somada a interrupções no Chile e na República Democrática do Congo, pode retirar 400 mil toneladas de cobre refinado do mercado em 2025. De fato, o preço do cobre subiu 4% quando a Freeport declarou força maior (uma cláusula de emergência) em Grasberg, em 24 de setembro.
Mesmo assim, os acidentes deste ano não são suficientes para levar o mundo a um déficit. Os efeitos combinados são facilmente absorvidos pelo que a indústria chama de “provisão para interrupções” – uma margem de segurança já esperada. Para complicar ainda mais a tese da escassez, a mina Escondida, no Chile, a maior do mundo, está produzindo quantidades inesperadamente grandes de cobre.
O verdadeiro culpado
Isso deixa a política econômica como a única explicação plausível para a alta dos preços. As decisões comerciais de Trump distorceram profundamente os mercados de cobre.
Em julho, depois de flertar com a ideia por meses, os Estados Unidos impuseram uma tarifa de 50% sobre as importações do metal. Os preços do cobre, que desde janeiro já vinham subindo muito mais rapidamente em Nova York do que em Londres, dispararam ainda mais com a notícia, atingindo recordes na bolsa americana. Os preços caíram em agosto, quando o Sr. Trump isentou o cobre refinado das tarifas, mas já estão subindo novamente, em meio a especulações sobre novas barreiras.
A oportunidade de arbitragem causou um verdadeiro êxodo de estoques para Nova York. Cerca de 340.000 toneladas de cobre estão agora retidas na cidade, em comparação com apenas 80.000 em janeiro.
Essas distorções são, em sua maioria, neutras para os preços em Londres, que são a referência global. No entanto, outra política entrou em cena. Uma moderação na economia americana levou o Federal Reserve a reduzir as taxas de juros, o que desvalorizou o dólar este ano.
Isso torna as commodities – cotadas em dólares e que não pagam juros – mais atraentes para grandes fundos de investimento generalistas. Esses fundos, que vêm investindo pesado no mercado de cobre desde 2020, são os “turistas” da festa.
A entrada desses compradores “turistas”, para quem o cobre representa apenas uma pequena parcela de portfólios diversificados, parece dar pouca atenção aos detalhes da oferta e da demanda. Sua obsessão é com as taxas de juros, e isso torna os preços do metal muito mais instáveis.
Em algum momento, porém, a gravidade pode se impor. Os fundos macro podem perder o equilíbrio e fugir em pânico se, por exemplo, a recessão econômica da China piorar ou se tarifas de três dígitos impostas por Trump causarem uma queda brusca na demanda real por cobre.
A grande festa do metal, com seus smokings e “Mamma Mia!”, pode terminar com uma ressaca terrível.