Em seu clássico “Anti-Dühring”, de 1878, Friedrich Engels observou: “Poderíamos afirmar, portanto, para usar uma expressão que tanta indignação provoca no Sr. Dühring, que a quantidade se converte em qualidade e vice-versa.” (Parte III — Dialética, Capítulo 12). A máxima talvez pudesse ser aplicada também ao comércio exterior brasileiro dos últimos anos.
A magnitude dos números sugere uma profunda transformação qualitativa na economia do país e em seu papel estratégico na cadeia global de valores, na estabilidade financeira dos mercados internacionais e na segurança alimentar de importante parte da humanidade. As exportações de outubro, que atingiram US$ 32 bilhões, repetindo o recorde histórico de julho, confirmam essa mudança estrutural na geografia comercial brasileira.
Os dados são do ComexStat, a agência estatística do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
A participação dos Estados Unidos em nossas vendas externas de outubro caiu para 6,9%, muito distante dos cerca de 25% que representavam há vinte anos. A retração recente foi acentuada pelos efeitos das novas tarifas impostas por Washington, que se iniciaram em abril e foram aumentadas em agosto, quando a alíquota foi elevada para 50% para mais de um terço dos produtos brasileiros.
Mesmo com essa queda para os EUA, as exportações brasileiras cresceram 9,13% em relação ao mesmo mês do ano anterior, impulsionadas por outros mercados e pela diversificação da pauta.
Com trabalho, diplomacia e o famoso jeitinho nacional, o Brasil derrotou o tarifaço.
O saldo comercial de outubro foi de US$ 7,0 bilhões, o segundo maior da história para o mês, com um crescimento de 70,7% em relação a outubro de 2024.
No acumulado de 12 meses, a corrente de comércio atingiu o recorde histórico de US$ 645,3 bilhões, o equivalente a R$ 3,3 trilhões. Para ter noção da magnitude, isso corresponderia a toda a despesa da União em 12 meses mais os juros nominais.
A China permanece como principal parceiro, absorvendo cerca de um terço das exportações brasileiras, seguida pela União Europeia e, em terceiro lugar, pelos países da América do Sul. O comércio com os Estados Unidos, embora ainda relevante, vem perdendo espaço tanto em valor absoluto quanto em participação relativa.
O que antes era rotulado como ‘setor primário’ hoje representa um dos mais sofisticados complexos produtivos do mundo. Para que o Brasil consiga suprir grande parte da proteína vegetal e animal consumida no planeta, são necessários investimentos massivos em tecnologia, ciência e genética, além de uma estrutura logística, comercial, financeira e diplomática de alta complexidade. A cadeia da soja ou da carne, por exemplo, envolve desde satélites e drones no campo até algoritmos de otimização de rotas nos portos, consolidando o país como uma potência agro-tecnológica.
Entre os setores que impulsionaram as exportações brasileiras em 2025 estão o agronegócio, a mineração e a indústria de transformação. Petróleo e derivados lideram a pauta, com 16,16% do total, seguidos por soja (14,16%) e minério de ferro (10,97%). No setor industrial, destacam-se veículos, máquinas, geradores elétricos e produtos químicos, que vêm conquistando novos mercados fora do eixo tradicional. A pauta industrial representa hoje cerca de 28% das exportações, um avanço em relação aos anos anteriores. Entre os produtos com maior crescimento no ano estão o ouro (+67,46%), veículos (+35,91%), café (+32,75%) e carnes (+19,69%).
Os Estados Unidos, apesar da perda de participação, continuam sendo o principal destino de produtos industrializados brasileiros, especialmente automóveis, motores, aviões e máquinas. Já os países asiáticos, em particular a China, ampliam a demanda por bens primários e intermediários, o que tem estimulado investimentos logísticos e diplomáticos na integração com o continente asiático.
Em termos de dependência do comércio exterior, o Brasil apresenta um perfil moderado. As exportações de bens e serviços representam cerca de 17% do PIB, um patamar intermediário entre a China (20%) e os Estados Unidos (11%), mas muito distante de economias altamente abertas como a Alemanha (48%) e o Vietnã (85%).
Considerando toda a corrente de comércio (exportações + importações de bens e serviços), a participação no PIB brasileiro é de 34%, bem abaixo da média mundial de 58%. Novamente, o Brasil se posiciona entre a China (37%) e os Estados Unidos (40%), mas muito longe da Alemanha (90%) e do Vietnã (185%).
Os 25 gráficos a seguir detalham essa transformação, mostrando a evolução do comércio exterior brasileiro em diferentes setores, mercados e períodos.
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1. Corrente de Comércio do Brasil – Dados Mensais – Média Móvel 12 meses (Abr-Out/2025)
A média móvel de 12 meses da corrente de comércio do Brasil (exportação + importação) mostra uma tendência de alta consistente entre abril e outubro de 2025. O indicador subiu de US$ 50,6 bilhões para US$ 51,8 bilhões no período, um crescimento de 2,3% em seis meses. A evolução positiva reflete o aquecimento contínuo do comércio exterior brasileiro, com o valor de outubro sendo 0,8% superior a setembro de 2025.
2. Exportações do Brasil – Dados Mensais – Média Móvel 12 meses (Abr-Out/2025)
A média móvel de 12 meses das exportações brasileiras também apresentou crescimento entre abril e outubro de 2025, passando de US$ 28,0 bilhões para US$ 28,5 bilhões. A alta de 2,0% no período indica uma performance robusta das vendas externas, com o valor de outubro sendo 0,7% superior ao de setembro de 2025.
3. Corrente de Comércio do Brasil (Acumulado 12 meses)
A corrente de comércio do Brasil atingiu US$ 621,2 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025, um aumento de 2,5% em relação aos 12 meses anteriores (US$ 606,1 bilhões). O gráfico mostra uma trajetória de crescimento consistente, com o valor atual sendo o maior da série histórica.
4. Exportações do Brasil (Acumulado 12 meses)
As exportações brasileiras registraram recorde no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025, atingindo US$ 342,5 bilhões. O valor representa um crescimento de 3,1% em comparação com o mesmo período do ano anterior (US$ 332,1 bilhões), impulsionando o superávit da balança comercial.
5. Exportações Totais do Brasil (Dados Mensais)
As exportações totais do Brasil em outubro de 2025 somaram US$ 32,1 bilhões, uma alta de 5,2% em relação a setembro de 2025 (US$ 30,5 bilhões) e um crescimento de 1,6% sobre outubro de 2024 (US$ 31,6 bilhões). O gráfico mostra a volatilidade mensal, com outubro sendo um dos meses mais fortes do ano.
6. Saldo Comercial em Outubro (2005-2025)
O saldo comercial do Brasil em outubro de 2025 foi de US$ 7,0 bilhões, o segundo maior da série histórica para o mês. O valor representa uma forte recuperação de 70,7% em relação a outubro de 2024 (US$ 4,1 bilhões), embora ainda esteja abaixo do recorde de US$ 9,2 bilhões registrado em outubro de 2023.
7. Corrente de Comércio Brasil-Estados Unidos (Acumulado 12 meses)
A corrente de comércio entre Brasil e Estados Unidos atingiu US$ 83,5 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025. O valor representa um crescimento de 3,9% em relação ao mesmo período do ano anterior (US$ 80,4 bilhões), mostrando uma recuperação após a queda observada entre 2022 e 2023.
8. Exportações do Brasil para os Estados Unidos (Acumulado 12 meses)
As exportações brasileiras para os Estados Unidos totalizaram US$ 38,9 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025. O valor é 2,3% inferior ao registrado no mesmo período do ano anterior (US$ 39,8 bilhões), indicando uma leve retração nas vendas para o mercado americano.
9. Participação dos EUA nas Exportações Totais do Brasil (Dados Mensais)
O gráfico mostra a participação mensal dos Estados Unidos nas exportações totais do Brasil de abril a outubro de 2025. Houve uma queda acentuada de 11,8% em abril para 6,9% em outubro, uma redução de 42% na participação no período, indicando uma diversificação no destino das exportações brasileiras.
10. Corrente de Comércio Brasil-BRICS+ (Acumulado 12 meses)
A corrente de comércio do Brasil com os países do BRICS+ atingiu o recorde de US$ 206,2 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025. O valor representa um crescimento de 5,4% em relação ao mesmo período do ano anterior (US$ 195,6 bilhões), evidenciando a crescente importância do bloco.
11. Corrente de Comércio Brasil-África (Acumulado 12 meses)
A corrente de comércio entre Brasil e África atingiu o recorde de US$ 23,5 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025. O valor é 14,6% superior ao registrado no mesmo período do ano anterior (US$ 20,5 bilhões), consolidando a forte recuperação do comércio com o continente africano desde 2021.
12. Corrente de Comércio Brasil-ASEAN (Média Móvel 12 meses)
A corrente de comércio do Brasil com a ASEAN atingiu o recorde de US$ 3,18 bilhões na média móvel de 12 meses em outubro de 2025. O valor representa um crescimento de 11,5% em relação a outubro de 2024 (US$ 2,85 bilhões), mostrando forte aceleração do comércio com o bloco asiático.
13. Exportações de Café do Brasil (Acumulado 12 meses)
As exportações brasileiras de café atingiram o recorde de US$ 14,3 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025. O valor é 34,9% superior ao registrado no mesmo período do ano anterior (US$ 10,6 bilhões), refletindo a forte valorização do produto no mercado internacional.
14. Exportações de Café do Brasil (Média Móvel 12 meses)
A média móvel de 12 meses das exportações de café do Brasil atingiu o recorde de US$ 1,2 bilhões em outubro de 2025. O valor representa um crescimento de 33,3% em relação a outubro de 2024 (US$ 900 milhões), evidenciando a forte aceleração das vendas nos últimos 12 meses.
15. Exportações de Café do Brasil para a China (Média Móvel 12 meses)
As exportações de café para a China mostram um crescimento exponencial. A média móvel de 12 meses, que era de US$ 10,9 milhões em outubro de 2024, saltou para US$ 32,0 milhões em outubro de 2025, um aumento de 193%. O resultado consolida a China como um dos principais e mais dinâmicos mercados para o café brasileiro.
16. Exportações de Café do Brasil para os EUA (Acumulado 12 meses, Nov-Out)
As exportações de café para os EUA, no acumulado de 12 meses de novembro a outubro, atingiram o recorde de US$ 2.165 milhões em 2025. O valor representa um crescimento de 36,5% em relação ao mesmo período anterior (Nov/23-Out/24), que foi de US$ 1.587 milhões, mostrando forte recuperação e expansão das vendas para o mercado americano.
17. Exportações de Café do Brasil para os EUA – Dados Mensais – Média Móvel 12 meses (Abr-Out/2025)
A média móvel de 12 meses das exportações de café para os EUA apresentou tendência de queda entre abril e outubro de 2025, passando de US$ 180,9 milhões para US$ 180,4 milhões. Apesar de um pico em agosto (US$ 187,7 milhões), o indicador mostra uma leve retração de 0,3% no período de seis meses.
18. Índice de Exportações de Café (Base 100 = Abril/2025)
O gráfico mostra trajetórias divergentes para as exportações de café do Brasil de abril a outubro de 2025. Enquanto as exportações totais de café cresceram 21,3% (índice de 121,3), as exportações para os Estados Unidos caíram 44,9% (índice de 55,1) no mesmo período, evidenciando uma forte mudança no destino do produto.
19. Exportações de Carne Bovina Congelada do Brasil (Acumulado 12 meses)
As exportações brasileiras de carne bovina congelada atingiram o recorde de US$ 13,3 bilhões no acumulado de 12 meses encerrado em outubro de 2025. O valor é 19,8% superior ao registrado no mesmo período do ano anterior (US$ 11,1 bilhões), consolidando a forte expansão do setor.
20. Exportações de Carne Bovina Congelada do Brasil (Média Móvel 12 meses)
A média móvel de 12 meses das exportações de carne bovina congelada do Brasil atingiu o recorde de US$ 1,11 bilhões em outubro de 2025. O valor representa um crescimento de 18,1% em relação a outubro de 2024 (US$ 940 milhões), consolidando o Brasil como líder mundial no setor.
21. Índice de Exportações de Carne Bovina Congelada (Base 100 = Abril/2025)
O gráfico mostra um forte crescimento de 49,2% nas exportações totais de carne bovina congelada do Brasil de abril a outubro de 2025 (índice de 149,2). Em contraste, as exportações para os Estados Unidos sofreram uma queda de 80% no mesmo período (índice de 20,0), indicando uma forte mudança no destino do produto.
22. Participação da Corrente de Comércio no PIB do Brasil – Média Móvel 12 meses (Jan/2016 – Out/2025)
O gráfico mostra uma forte tendência de crescimento da participação do comércio exterior na economia brasileira. Em janeiro de 2016, a corrente de comércio representava 3,72% do PIB. Em outubro de 2025, essa participação mais que dobrou, atingindo 7,56%. O pico da série foi em fevereiro de 2022, com 8,28%, indicando que o Brasil está cada vez mais integrado ao comércio global.
23. Participação das Exportações no PIB do Brasil – Média Móvel 12 meses (Jan/2016 – Out/2025)
Assim como a corrente de comércio, a participação das exportações no PIB também mais que dobrou no período. Em janeiro de 2016, as exportações representavam 2,03% do PIB. Em outubro de 2025, a participação atingiu 4,35%. O crescimento de 2,33 pontos percentuais mostra a crescente importância das exportações para a economia brasileira.
24. Top 10 Produtos Exportados pelo Brasil – Participação % (Média Mensal Jan-Out/2025)
As exportações brasileiras estão relativamente diversificadas, sem a dependência extrema de um único produto que caracteriza países como Venezuela, Arábia Saudita ou Rússia. Nos 12 meses encerrados em outubro de 2025, o petróleo liderou a pauta com US$ 55,2 bilhões, seguido de soja (US$ 43,2 bilhões), minério de ferro (US$ 38,4 bilhões) e carne (US$ 30 bilhões). Outros produtos também tiveram destaque, como café (US$ 17 bilhões), açúcar (US$ 15 bilhões), veículos (US$ 15 bilhões) e celulose (US$ 10 bilhões). Essa distribuição mostra uma economia exportadora baseada em commodities, mas com uma base produtiva diversificada e múltiplas fontes de receita externa.
25. Top 10 Produtos Importados pelo Brasil – Participação % (Média Mensal Jan-Out/2025)
As importações são mais diversificadas que as exportações. Os 10 principais produtos representam 59,71% do total, com uma média mensal de US$ 14,17 bilhões. Petróleo e derivados (8,07%) e veículos (8,05%) lideram. A queda de 11,56% na importação de petróleo e derivados sugere que a Petrobras está conseguindo refinar mais internamente. Por outro lado, a importação de máquinas e equipamentos cresceu 10,52%, e a de material de transporte explodiu 134,4% em um ano, indicando forte investimento na indústria e infraestrutura.
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