A reciclagem do fracasso: CEO dobra a aposta nos leais para salvar a Meta
No teatro corporativo do Vale do Silício, poucas peças são tão previsíveis quanto a “grande reestruturação” que se segue a um fracasso embaraçoso. Na Meta, o império de Mark Zuckerberg, a cortina mal se fechou sobre o fiasco do metaverso e já se levanta para um novo ato: a corrida desesperada pela inteligência artificial. E quem estrela essa nova produção? Os mesmos rostos de sempre, em uma dança de cadeiras que sinaliza menos inovação e mais a consolidação do poder de um bilionário acuado.
A nomeação de Vishal Shah, um dos executivos mais antigos e próximos de Zuckerberg, para um cargo estratégico na divisão de IA é o sintoma mais claro dessa dinâmica. Shah não é um novo talento disruptivo; ele é o homem que, desde 2021, liderou o ambicioso e multibilionário projeto do metaverso – um projeto que, até agora, entregou muito pouco além de avatares sem pernas e prejuízos colossais.
Agora, o “leal” Shah é reposicionado para acelerar a IA. A urgência tem nome: Sora. A Meta, em uma tentativa apressada de mostrar serviço, lançou seu serviço de vídeos por IA, o Vibes. O lançamento foi um tropeço. Dias depois, a OpenAI apresentou o Sora, com vídeos de realismo e fluidez assombrosos, e o Vibes foi instantaneamente relegado ao esquecimento tecnológico. A Meta foi ofuscada, parecendo uma empresa que joga para não perder, em vez de uma que lidera.
É neste cenário de reação, e não de ação, que a reestruturação acontece. O memorando interno de Nat Friedman, chefe da divisão de produtos de IA, é revelador: “Não podemos ser apenas uma equipe de IA, precisamos ser uma empresa de IA”. A frase, que tenta soar como um grito de guerra, soa mais como pânico. A Meta, uma gigante de US$ 1,9 trilhão, está correndo atrás.
E quem é Nat Friedman, o novo chefe sob o qual Shah servirá? Um ex-CEO do GitHub, investidor e conselheiro de Zuckerberg desde 2024, contratado em junho. Sua chegada foi selada com um acordo singularmente lucrativo: como parte de sua contratação, a Meta adquiriu 49% do fundo de investimentos pessoal de Friedman. Um arranjo confortável para o novo executivo.
A história do Vibes, aliás, revela a complexa teia de interesses que agora dita os rumos da IA na Meta. Friedman, em sua ânsia de lançar o produto antes do Sora, pressionou por um acordo bilionário e de longo prazo com a startup Midjourney. Essa startup forneceu a tecnologia base do aplicativo, suplantando os modelos que deveriam ser desenvolvidos internamente pela Meta. O detalhe crucial: Friedman era um antigo conselheiro da Midjourney. O resultado foi um impulso inicial nos downloads, seguido de uma irrelevância imediata pós-Sora.
Enquanto insiders fecham negócios bilionários e lucrativos, a conta da instabilidade chega para o chão de fábrica. Na semana passada, ironicamente após meses de “contratações agressivas” para reforçar a IA, a Meta demitiu cerca de 600 funcionários do setor. A justificativa oficial? Tornar os processos decisórios “mais ágeis”. Na prática, trabalhadores são usados como massa de manobra para os pivôs estratégicos de Zuckerberg. Contrata-se agressivamente, demite-se “agilmente”.
A promoção de Shah, portanto, não é sobre trazer o melhor da IA; é sobre Zuckerberg restaurar a ordem. Após o desempenho abaixo do esperado do modelo Llama 4 e a estreia desastrosa do Vibes, o CEO volta-se para quem ele confia: os aliados de longa data. Shah, elogiado por Friedman por suas “profundas relações dentro da Meta”, é o homem certo para garantir que a visão de Zuckerberg seja implementada sem questionamentos.
E qual é essa visão? A integração. Shah não cuidará apenas da IA no Instagram e WhatsApp; ele será a ponte entre o laboratório de “Superinteligência” e o “Reality Labs” – o que sobrou do metaverso. A Meta não está abandonando seu investimento fracassado; está tentando reanimá-lo com o desfibrilador da IA. Shah fala em “moldar como entregamos superinteligência pessoal a bilhões de pessoas em todos os dispositivos”.
A verdade é menos grandiosa. Zuckerberg está fundindo suas duas grandes apostas, não porque elas sejam sinérgicas, mas porque ele não pode permitir que nenhuma delas fracasse completamente. A nomeação de Shah, o homem do metaverso, para liderar a integração da IA, não é uma revolução. É a reciclagem de executivos, a reafirmação da lealdade como critério principal e a prova de que, na Meta, a prioridade não é a inovação genuína, mas a consolidação do controle do CEO, custe o que custar – seja em bilhões de dólares para amigos ou em centenas de empregos para os funcionários.