A escolha de Jorge Messias consolida a estratégia de Lula de moldar a nova feição do STF, reforçando a presença de aliados de confiança em um tribunal central para o país
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva oficializou a indicação de Jorge Messias, atual advogado-geral da União, para ocupar a cadeira deixada pelo ministro Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal. O anúncio, feito nesta quinta-feira (20), coloca no centro do Judiciário um dos nomes mais próximos do presidente e figura já bem estabelecida tanto no governo quanto entre ministros da Corte e parlamentares.
A indicação representa a 11ª feita por Lula ao STF ao longo de seus três mandatos — um marco que reforça o peso político do atual presidente na conformação da Suprema Corte brasileira.
Leia também: Lula confirma Messias e reforça sua marca no Supremo
Da AGU ao topo do Judiciário: a ascensão de um jurista de confiança
Jorge Messias é procurador da Fazenda Nacional desde 2007, integrante de carreira da AGU e pernambucano de 44 anos. Ganhou destaque no terceiro mandato de Lula, quando assumiu o comando da Advocacia-Geral da União e passou a atuar como principal conselheiro jurídico do presidente. Foi dele a responsabilidade de representar Lula em ações importantes no STF, estreitando ainda mais a relação entre ambos.
Além de sua atuação técnica, Messias construiu conexões com segmentos estratégicos da sociedade. Membro da Igreja Batista, tornou-se um interlocutor do governo com o público evangélico — grupo que, em geral, mantém grande resistência ao PT. Sua religiosidade foi considerada um trunfo quando Lula o escolheu para chefiar a AGU. A aproximação com esse eleitorado ficou clara quando se tornou o único representante do governo federal presente na Marcha para Jesus, evento que reúne milhões de fiéis e diversas lideranças conservadoras, como o governador paulista Tarcísio de Freitas.
Durante sua gestão, Messias também esteve no centro de debates internos da própria AGU. Foi ele quem validou pareceres sigilosos que permitiram a criação de verbas indenizatórias a partir dos honorários de sucumbência — recursos que, na prática, possibilitaram que advogados públicos recebessem valores acima do teto constitucional, como revelou o UOL. O episódio gerou críticas e chamou atenção para seu papel nas decisões internas do órgão.
Carreira marcada por postos estratégicos nos governos petistas
Muito antes de chegar ao comando da AGU, Messias já transitava pelos espaços mais sensíveis do governo federal. Entre 2012 e 2014, atuou como secretário de Regulação da Educação Superior no MEC. Em seguida, assumiu a subchefia para assuntos jurídicos da Casa Civil, entre 2015 e 2016, durante o governo Dilma Rousseff. Também foi consultor jurídico nos ministérios da Educação e de Ciência e Tecnologia, consolidando uma carreira profundamente conectada ao núcleo político do PT.
Sua formação acadêmica reforça essa trajetória. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco em 2003, Messias concluiu o mestrado em Administração Pública na Universidade de Brasília em 2018, com uma dissertação voltada para compras governamentais e inovação. Em 2024, completou o doutorado na mesma instituição com a tese intitulada Centro de Governo e a AGU: Estratégias de Desenvolvimento do Brasil na Sociedade de Risco Global.
O episódio que o tornou conhecido nacionalmente: o “caso Bessias”
Para além de sua carreira técnica e política, Messias ficou conhecido nacionalmente por um episódio emblemático da crise que antecedeu o impeachment de Dilma Rousseff. Em 2016, seu nome apareceu em um grampo telefônico autorizado pelo então juiz Sergio Moro, no âmbito da Lava Jato. No áudio divulgado, devido à baixa qualidade da gravação, Dilma se referia a ele como “Bessias” — apelido que se espalhou rapidamente pelo país.
À época, Messias era subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil e foi incumbido de entregar a Lula o termo de posse como ministro, em meio à tentativa do governo de nomear o petista para a chefia da Casa Civil.
O diálogo, amplamente repercutido, foi este:
Dilma: “Alô.”
Lula: “Alô.”
Dilma: “Lula, deixa eu te falar uma coisa.”
Lula: “Fala, querida. Ahn?”
Dilma: “Seguinte, eu tô mandando o ‘Bessias’ junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!”
Lula: “Uhum. Tá bom, tá bom.”
Dilma: “Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.”
Lula: “Tá bom, eu tô aqui, fico aguardando.”
Dilma: “Tá?!”
Lula: “Tá bom.”
Dilma: “Tchau.”
Lula: “Tchau, querida.”
O áudio gerou intensa disputa política e levou o ministro do STF Gilmar Mendes a suspender a posse de Lula na Casa Civil. Anos depois, Sergio Moro seria considerado parcial, resultando na anulação dos processos contra o atual presidente.
O que esperar do futuro ministro
A indicação de Messias ao STF não surpreende quem acompanha o cotidiano político de Brasília. Trata-se de um nome com trânsito entre diferentes setores, sólida formação e ligação direta com o presidente da República. Sua chegada à Corte deve reforçar a influência de Lula no tribunal e marca mais um capítulo da lenta renovação do Judiciário brasileiro.
Agora, Messias inicia um novo percurso — o da sabatina no Senado e da articulação política que envolve qualquer nome indicado ao Supremo. Tudo indica que ele terá apoio suficiente para avançar, mas seu passado, suas conexões e seus posicionamentos devem ser novamente examinados sob a lupa do Congresso.
Se aprovado, ocupará um dos postos mais poderosos da República em um momento decisivo para o país — e carregará consigo tanto os méritos de sua carreira quanto o peso dos episódios que o tornaram, para muitos brasileiros, o famoso “Bessias”.