A possibilidade de o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinar o início do cumprimento da pena do ex-presidente Jair Bolsonaro ganhou força após a divulgação do acórdão que rejeitou os primeiros recursos apresentados pela defesa. O documento, publicado nesta terça-feira (11), reorganiza prazos, reabre etapas processuais e amplia o espaço para uma decisão monocrática ainda nesta semana.
As informações foram publicadas originalmente pela Folha de S.Paulo, que ouviu especialistas em direito processual penal para analisar os efeitos diretos da publicação do acórdão e a margem de manobra que Moraes passa a ter a partir deste ponto.
O acórdão trata dos primeiros embargos de declaração apresentados pela defesa contra a condenação de Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão pela tentativa de golpe de Estado. Com a conclusão dessa fase, a defesa pode recorrer novamente com embargos de declaração ou tentar apresentar embargos infringentes. No entanto, esse segundo instrumento só pode ser aceito quando há ao menos dois votos divergentes — e, no caso, quatro ministros votaram pela condenação, enquanto apenas Luiz Fux manifestou-se pela absolvição.
Juristas apontam que embargos infringentes não são viáveis
O professor Gustavo Badaró, especialista em direito processual penal da Universidade de São Paulo (USP), afirmou ao jornal que, embora considere “restritiva” a interpretação atual do STF sobre os embargos infringentes, trata-se de “uma jurisprudência consolidada”. Segundo ele, não há perspectiva de reversão do entendimento da Corte que inviabilize o recurso.
Esse cenário torna os novos embargos de declaração o único caminho possível para a defesa. No entanto, especialistas alertam que o precedente envolvendo o ex-presidente Fernando Collor reforça os riscos dessa estratégia: na ocasião, os embargos foram rejeitados pelo plenário e, em seguida, Moraes classificou os infringentes apresentados como “meramente protelatórios”, determinando o início imediato do cumprimento da pena.
Precedente de 2023 amplia probabilidade de ação imediata de Moraes
No caso de Collor, Moraes aplicou entendimento restritivo aos embargos infringentes, rejeitou-os monocraticamente e ordenou o início da execução penal, sem aguardar a conclusão formal do prazo recursal. A rapidez da decisão — e sua confirmação posterior pelo colegiado — é apontada por juristas como indicativo de como o ministro pode proceder agora.
A penalista Pamela Torres Villar, formada pela Universidade de Coimbra, avaliou que a “impossibilidade técnica” de apresentação dos embargos infringentes cria condições para que o ministro declare o trânsito em julgado antes mesmo do fim do prazo formal para esse recurso. Segundo ela, fatores internos também influenciam a probabilidade de celeridade: “O gabinete dele é muito célere. Não só nesses casos de grande repercussão. No geral, é um gabinete bem produtivo. Eles costumam soltar decisão bastante rápido.”
Defesa pode tentar novos embargos, mas risco de rejeição é alto
A defesa ainda tem a possibilidade de apresentar novos embargos de declaração caso alegue que persistem contradições, omissões ou pontos obscuros no acórdão anterior. Entretanto, especialistas observam que esse tipo de recurso corre o risco de ser classificado como protelatório, o que aceleraria ainda mais o processo de execução da pena.
Se Moraes determinar o início imediato do cumprimento da pena, a defesa poderá ingressar com agravo interno. Esse recurso levaria a discussão ao julgamento da Primeira Turma do STF, embora o próprio ministro possa, desde o início, submeter sua decisão diretamente ao colegiado, conforme previsão regimental.
Decisão pode ocorrer antes do recesso de fim de ano
A reorganização dos prazos é vista por juristas como um indicativo de que o processo entra na reta final. A publicação do acórdão restabelece a fluência dos prazos recursais e permite que Moraes, em decisão individual, declare o trânsito em julgado caso considere que as tentativas da defesa não atendem aos requisitos legais.
Com a proximidade do recesso do Judiciário, fontes consultadas avaliam que o ministro pode optar por uma decisão ainda em dezembro, seguindo o padrão de celeridade adotado tanto em casos de grande repercussão quanto em processos que envolvem tentativa de uso de recursos para atrasar a execução penal.
A eventual ordem para início da pena reacenderia debates políticos e jurídicos sobre o tratamento penal de ex-presidentes, mas, de acordo com especialistas, a condução técnica do processo e a jurisprudência recente tornam o cenário mais previsível.
Próximos passos serão decisivos
A defesa deve definir nas próximas horas se apresentará novos embargos ou se insistirá na via dos infringentes, mesmo com baixa probabilidade de êxito. Paralelamente, Moraes tem agora base documental para decidir sobre o trânsito em julgado e determinar o cumprimento imediato da pena.
A movimentação nos bastidores do STF indica que os próximos dias serão determinantes para o desfecho do processo. Caso se confirme o entendimento majoritário apontado pelos especialistas, a execução penal pode ser ordenada já no curto prazo, repetindo o padrão observado no caso Collor e consolidando a jurisprudência sobre embargos impróprios em ações penais originárias.