Indicado por Alcolumbre, presidente da Amprev ignorou alertas e aplicou R$ 400 milhões dos aposentados no Banco Master

O presidente da Amapá Previdência (Amprev), Jocildo Lemos, indicado politicamente pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, realizou aportes de R$ 400 milhões em títulos do Banco Master mesmo após diversos alertas técnicos sobre riscos envolvendo a instituição financeira. As informações foram reveladas pelo Estado de S. Paulo, que detalhou como decisões do comitê de investimentos ignoraram advertências internas e de órgãos de controle.

A liquidação extrajudicial do Banco Master, decretada na terça-feira (18), coloca o fundo de previdência em situação de vulnerabilidade, já que as letras financeiras adquiridas pela Amprev não possuem cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Com isso, servidores públicos e aposentados do Amapá podem enfrentar perdas milionárias caso o banco não honre integralmente os papéis emitidos.

Aportes foram aprovados apesar de protestos e advertências

Em julho de 2024, a Amprev efetuou quatro aportes consecutivos nas letras financeiras do Master. As decisões ocorreram sob forte contestação dos conselheiros Alexandre Flávio Monteiro e Gláucio Bezerra, que apresentaram preocupações sobre concentração excessiva de recursos, risco reputacional e investigações em curso contra o banco.

Naquele período, o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Ministério Público Federal (MPF) já investigavam aplicações da Caixa Econômica Federal em papéis do Master. Diante disso, os conselheiros pediram que o fundo consultasse oficialmente os órgãos de controle antes de aprovar novos aportes.

Jocildo Lemos, porém, rejeitou o pedido e minimizou os riscos. Em ata, declarou que “no mercado sempre há histórias” e classificou notícias negativas sobre o Master como “conversas, pois não há nada concreto com procedimento”. Ele também alegou que enviar ofícios ao TCU e à Caixa não seria “prudente”, citando a Lei Geral de Proteção de Dados e a presunção de inocência.

Indicação política e influência sobre decisões

A reportagem destaca que Jocildo Lemos foi indicado ao cargo por Davi Alcolumbre. Em discurso público, ao receber um prêmio, ele declarou: “Sobretudo ao senador Davi Alcolumbre, que me convidou para ser o presidente da Amapá Previdência.”

O irmão do senador, Alberto Alcolumbre, também integra a estrutura do fundo, ocupando o cargo de conselheiro fiscal — fator que ampliou a influência do grupo político sobre a gestão da Amprev.

Em nota enviada ao jornal, Davi Alcolumbre negou interferência e afirmou que “não possui qualquer participação, influência ou atribuição em nomeações, decisões administrativas ou escolhas de investimento da Amapá Previdência”.

Visita ao Master resultou em relatório divergente da realidade

Após os protestos internos, Lemos condicionou os aportes à realização de uma visita presencial à sede do Banco Master, na avenida Faria Lima, em São Paulo. A diligência ocorreu três dias depois e foi conduzida sem solicitação formal de documentos, com o objetivo de “conhecer fisicamente a instituição”.

O relatório final afirmou que notícias sobre problemas no Master seriam “falsas” e ressaltou suposta solidez financeira do banco, citando:

lucro superior a R$ 500 milhões no primeiro semestre;

patrimônio líquido de R$ 4,3 bilhões;

avaliações positivas de agências de rating.


O parecer contrastava completamente com o que seria revelado pela Polícia Federal meses depois. A Operação Contrato Zero — que integra a ofensiva Compliance Zero — levou à prisão do presidente do banco, Daniel Vorcaro, e de quatro diretores. Segundo a PF, o grupo operava um esquema de fraudes bilionárias, com simulação de operações de crédito e emissão irregular de títulos sem lastro. O volume de irregularidades pode superar R$ 12 bilhões.

Amprev se tornou um dos fundos mais expostos ao Master

Com as aplicações de 2024, a Amprev acumulou R$ 430 milhões em títulos do Banco Master, algo equivalente a 4,7% do seu patrimônio total — tornando-se o segundo maior fundo de previdência do país exposto aos papéis da instituição.

Apesar da liquidação do banco, a Amprev afirmou, em nota, que seus investimentos “seguiram normas e políticas definidas” e que o patrimônio dos segurados está protegido. A autarquia declarou ainda:

“O patrimônio evoluiu de R$ 6,4 bilhões em 2023 para aproximadamente R$ 9,1 bilhões em 2025, um aumento de 41%. Essa robustez garante, com segurança, o pagamento de aposentadorias e pensões até 2048.”

Contudo, a liquidação extrajudicial decretada pelo Banco Central inclui a identificação de grave crise de liquidez no Master. O FGC terá de desembolsar R$ 41 bilhões para cobrir outros produtos garantidos pelo fundo — valor que pressiona o sistema financeiro e não contempla as letras financeiras adquiridas por fundos públicos como a Amprev.

TCU já havia apontado falhas de governança em casos semelhantes

Em relatório divulgado em 12 de dezembro, o Tribunal de Contas da União apontou falhas graves na governança da Caixa Asset ao aprovar investimentos em títulos do Master. A auditoria indicou:

concentração excessiva de poder decisório;

ausência de barreiras adequadas de controle;

fragilidades na definição de limites de alocação.


A mesma dinâmica — conselheiros técnicos vencidos por indicados políticos — ocorreu na Amprev, segundo as atas analisadas pelo jornal.

Futuro incerto para os recursos e para os segurados

Com a liquidação do Master e a confirmação das suspeitas de fraude, o futuro dos R$ 430 milhões investidos pela Amprev permanece incerto. Os servidores e aposentados do Amapá dependem agora do processo conduzido pelo liquidante nomeado pelo Banco Central, que avaliará ativos, dívidas e possíveis recuperações judiciais.

Enquanto isso, órgãos de controle federais e estaduais avaliam a abertura de novas frentes de investigação sobre a condução dos investimentos, os critérios adotados e a possibilidade de responsabilização administrativa ou criminal.

Redação:
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