A alta no desemprego entre diplomados desmonta o discurso de força econômica dos EUA e evidencia um mercado que já não protege quem investiu em formação
Em meio ao discurso triunfalista que voltou a dominar Washington sob Donald Trump, a realidade econômica dos Estados Unidos revela algo bem diferente do que a retórica nacionalista promete. Pela primeira vez na história, um em cada quatro desempregados americanos tem diploma universitário, um marco que desmonta a narrativa de vigor econômico e expõe um país que, atrás da fachada de potência global, enfrenta uma corrosão estrutural profunda.
Os novos dados do Departamento de Estatísticas do Trabalho (BLS) deixam isso evidente: a taxa de desemprego entre pessoas com diploma de bacharelado chegou a 2,8%, o maior salto do gênero em décadas. Não se trata apenas de flutuação econômica — é o sinal de um mercado de trabalho que deixa de absorver justamente aqueles que, segundo o ideal americano, fizeram “tudo certo”. Numa economia que se pretende modelo para o mundo, o topo da pirâmide educacional deveria ser o último a cair. Mas está caindo primeiro.
Jovens: vítimas de um sistema que os empurra para a precariedade
O impacto entre os recém-formados é ainda mais cruel. O próprio presidente do Banco da Reserva Federal de Nova York, John Williams, fala em “tempestade perfeita”. E não é exagero: a taxa de desemprego entre pessoas de 20 a 24 anos disparou para 9,2%, algo que só se vê em períodos de recessão formal.
Há mais de 1,9 milhão de diplomados sem emprego — jovens que investiram tempo, dinheiro e dívida estudantil num projeto que agora desmorona. É difícil não enxergar nisso o resultado de um modelo que transforma educação em mercadoria, trabalho em privilégio e futuro em aposta especulativa.
A automação como pretexto e o lucro como bússola
Empresas gigantes como Amazon, Target, Starbucks e Verizon impulsionam recordes de demissões em nome da “eficiência” — quando na prática substituem pessoas por algoritmos. Em outubro, os cortes foram os maiores para o mês em mais de 20 anos, movidos por planos de trocar trabalhadores por inteligência artificial.
O economista Michael Feroli, do JPMorgan, reconhece: o desemprego crescente entre universitários deve alimentar temores de perda de empregos relacionados à IA. Mas não se trata apenas de tecnologia: trata-se de decisão política e corporativa. A automação vira discurso conveniente para justificar cortes que aumentam margens de lucro, enquanto a sociedade arca com o custo.
Não por acaso, setores estratégicos e qualificados como consultoria técnica, design de sistemas e pesquisa científica tiveram queda acentuada no número de funcionários durante o ano.
Crescimento frágil, sustentado por empregos de baixa remuneração
Se retirarmos saúde, assistência social, lazer e hotelaria — setores de baixo e médio salário —, o emprego nacional encolheu em 2025. Ou seja: o “crescimento” do emprego americano só existe onde os salários são menores e a exploração é maior.
É este o “milagre econômico” do trumpismo: criação de vagas precárias enquanto profissões altamente qualificadas desaparecem. A economia cresce, mas o futuro encolhe.
O retrato de um país que escolheu as prioridades erradas
A demissão de 13.000 funcionários pela Verizon é apenas mais um capítulo da mesma história: corporações reduzindo força de trabalho não sindicalizada enquanto o governo insiste num modelo que protege bilionários, não trabalhadores.
O desemprego recorde entre diplomados é mais que um dado estatístico — é um sintoma do esgotamento de uma lógica econômica sustentada por cortes, precarização e concentração de riqueza. E mostra o que acontece quando um país se recusa a investir em políticas públicas, proteção social e transição tecnológica justa.
Enquanto os EUA insistirem em aprofundar desigualdades e culpar trabalhadores — e não o próprio sistema — por crises produzidas pelo capital, a chamada “terra das oportunidades” continuará empurrando seus jovens para a frustração e para um futuro cada vez mais incerto.