Durante visita oficial a Moçambique nesta segunda-feira (24), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou que o Brasil retomará o financiamento à exportação de serviços para países africanos por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A declaração ocorreu no segundo dia da missão presidencial no país, marcada pela assinatura de novos acordos bilaterais e pela ênfase em uma recomposição diplomática após anos de afastamento.
Em pronunciamento em Maputo, Lula afirmou que a relação entre os dois países “vive um momento de retomada” e que a aproximação precisa ocorrer de forma contínua e estruturada. Ele destacou o simbolismo da viagem em um ano que marca os 50 anos da independência moçambicana, lembrando que o Brasil foi um dos primeiros países a reconhecer a soberania do parceiro africano. O presidente afirmou que, apesar da cooperação histórica, os vínculos sofreram interrupções recentes: segundo ele, “o Brasil se perdeu por caminhos sombrios e se esqueceu dos laços com a África”, o que, em sua avaliação, comprometeu o avanço de projetos anteriormente estruturados.
Nove novos acordos e áreas estratégicas de cooperação
Durante o encontro, foram assinados nove acordos de cooperação voltados ao fortalecimento institucional moçambicano. As áreas contempladas incluem desenvolvimento, saúde, educação, serviços agroflorestais, promoção comercial, aviação civil, diplomacia, empreendedorismo e assistência jurídica. Lula afirmou que esse é o início de um ciclo de reconstrução do relacionamento bilateral, com foco em infraestrutura, produção, formação técnica e ampliação da capacidade estatal local.
O presidente ressaltou que Moçambique ainda enfrenta lacunas de infraestrutura essenciais para o desenvolvimento econômico. Ele apontou a necessidade de portos, estradas, usinas e linhas de transmissão, afirmando que empresas brasileiras podem competir em projetos estruturantes. Para que isso ocorra, disse, é necessário recuperar a capacidade do BNDES de oferecer crédito internacional. Segundo Lula, “nenhum grande país consegue exportar serviços sem oferecer opções de crédito”, e o Brasil precisa retomar instrumentos que permitam às empresas disputarem obras no exterior.
O presidente observou ainda que o comércio bilateral permanece abaixo das possibilidades. Para ele, essa situação é “injustificável entre dois mercados tão familiares”, e requer medidas que ampliem o fluxo comercial entre as nações.
Cooperação em saúde, segurança alimentar e ensino técnico
Na área da saúde, Lula afirmou que o fortalecimento do complexo industrial brasileiro permitirá retomar projetos conjuntos de produção de fármacos e medicamentos com Moçambique. Ele destacou que o Brasil pode ter papel relevante no avanço da segurança alimentar africana, mencionando o potencial produtivo da savana e defendendo práticas agrícolas sustentáveis.
O governo brasileiro anunciou também a oferta, a partir de 2026, de até 80 vagas para cursos de formação de formadores em ciências agrárias e até 400 vagas para capacitação técnica em agropecuária destinadas a profissionais moçambicanos. A Embrapa participará com treinamentos presenciais e remotos. Lula afirmou que a ampliação da formação técnica é fundamental para o desenvolvimento rural e para o fortalecimento do setor agrícola local.
Mudanças climáticas e cooperação ambiental
Lula destacou o encontro recente com o presidente moçambicano, Daniel Chapo, ocorrido em Belém durante os preparativos para a COP30. Ele observou que Moçambique está entre os países mais vulneráveis às mudanças climáticas e que Brasil e Moçambique poderão atuar de maneira conjunta na proteção de biomas florestais e em iniciativas de transição energética.
Segundo o presidente, as duas nações podem “trocar experiências de manejo do fogo e uso sustentável de recursos naturais para preservar ecossistemas”. Lula afirmou também que o Brasil está pronto para cooperar na produção de biocombustíveis, área considerada estratégica para diversificar a matriz energética africana.
Combate ao crime organizado e cooperação policial
Outro tema abordado foi o enfrentamento ao crime organizado. Lula afirmou que o Brasil tem avançado no uso de tecnologia e inteligência policial para desarticular redes criminosas e que a Polícia Federal está preparada para intensificar a cooperação com Moçambique. O presidente destacou que o rastreamento de ativos ilícitos e o combate à lavagem de dinheiro podem ser aprofundados por meio de acordos de colaboração direta entre instituições dos dois países.
Educação, cultura e expansão do intercâmbio
Lula defendeu também a ampliação do intercâmbio cultural e educacional entre Brasil e Moçambique. Ele afirmou que é necessário intensificar a mobilidade estudantil e a criação de parcerias acadêmicas, além de incentivar cooperação em produção audiovisual e literária. Segundo o presidente, iniciativas desse tipo fortalecem a promoção conjunta da língua portuguesa e ampliam a circulação de conteúdos produzidos nos dois países.
Relação bilateral e perspectiva de continuidade
Ao concluir sua declaração, Lula afirmou que o futuro da relação entre Brasil e Moçambique deve ser construído com estabilidade e continuidade. Ele disse que “a cooperação entre Brasil e Moçambique não pode mais oscilar entre momentos de aproximação e distanciamento”, e reforçou que a política externa brasileira deve restabelecer laços históricos com países africanos. Em suas palavras, “enquanto sonharmos juntos, nossa estrada comum permanecerá viva”.
A visita a Moçambique integra uma agenda mais ampla de viagens à África, na qual o governo brasileiro busca recolocar o continente como prioridade estratégica da política externa, especialmente na área de cooperação econômica, desenvolvimento social e transição energética.