Banqueiros veem omissão severa de Campos Neto na crise do Banco Master e cobram endurecimento da supervisão do BC

Os principais banqueiros do País avaliaram, em conversas reservadas, que o ex-presidente do Banco Central (BC) Roberto Campos Neto pode ter se omitido diante do agravamento da crise que levou à liquidação do Banco Master.

A percepção foi relatada durante o tradicional almoço de fim de ano da Febraban e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, em reportagem de Raquel Landim que ouviu executivos do alto escalão do setor financeiro.

Segundo o jornal, representantes de grandes bancos afirmaram que tanto o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) quanto a própria Febraban enviaram alertas formais ao Banco Central advertindo sobre o aumento acelerado das vendas de CDBs de risco elevado feitos pelo Master.

Apesar disso, relataram que Campos Neto “viu o problema surgir, crescer e nada fez”. Alguns interlocutores mencionaram, inclusive, a possibilidade de prevaricação, embora nenhum procedimento tenha sido instaurado até o momento.

Críticas e suspeitas sobre influência política

De acordo com a reportagem, a percepção dominante entre os executivos é a de que Campos Neto teria se eximido da responsabilidade devido a vínculos com um grupo político. O ex-presidente do BC é próximo do senador Ciro Nogueira (PP-PI), apontado como articulador de interesses associados ao banco em diferentes episódios políticos. A Polícia Federal, porém, não identificou até agora qualquer envolvimento formal de políticos no caso.

A avaliação de banqueiros é de que a ausência de ação tempestiva contribuiu para que a crise atingisse dimensões inéditas. O FGC calcula que terá de desembolsar R$ 41 bilhões para ressarcir cerca de 1,6 milhão de investidores, o maior valor da história do fundo. O rombo total pode chegar a R$ 55 bilhões se outras instituições menores associadas ao Master também forem liquidadas.

Campos Neto, atual vice-chairman do Nubank, foi procurado pelo jornal O Estado de S. Paulo, mas não concedeu entrevista.

Galípolo recebe elogios por conduzir liquidação

Enquanto Campos Neto era alvo de críticas, o atual presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, recebeu elogios de banqueiros presentes ao evento. Embora tenha integrado a diretoria do BC durante a gestão anterior, Galípolo não era responsável pela área de fiscalização, setor que acompanhou o crescimento acelerado do Master e a deterioração dos seus ativos.

O presidente da Febraban, Isaac Sidney, afirmou em discurso que Galípolo “elevou a régua da dignidade institucional” do Banco Central, declaração que repercutiu de forma positiva entre os representantes das instituições financeiras. A fala foi interpretada como um apoio explícito ao atual comando da autarquia em meio às críticas direcionadas ao antecessor.

Para dirigentes do setor, a decisão de liquidar o Master no mesmo dia em que a Polícia Federal prendeu executivos da instituição demonstrou alinhamento entre autoridades monetárias e órgãos de investigação.

Setor financeiro defende normas mais rígidas

Questionados pelo jornal sobre a possibilidade de Galípolo impor algum tipo de sanção interna ou procedimento contra Campos Neto, banqueiros preferiram não comentar. A justificativa foi o forte corporativismo existente entre servidores do Banco Central, além do fato de a nova gestão trabalhar com as mesmas equipes técnicas que atuaram no período anterior.

Apesar disso, há consenso entre executivos de grandes bancos sobre a necessidade de fortalecimento das regras de supervisão e monitoramento de instituições financeiras de porte médio. A crise reacendeu o debate sobre o risco sistêmico associado à venda massiva de CDBs garantidos pelo FGC, prática que impulsionou o crescimento do Master.

O episódio também reabriu discussões sobre a capacidade do Banco Central de reagir rapidamente a sinais de deterioração na saúde financeira de bancos que crescem de maneira incomum, especialmente quando utilizam ativos pouco líquidos e operações complexas para captação.

Reações e próximos passos da supervisão bancária

A expectativa no setor é de que o Banco Central revise parâmetros de fiscalização e crie barreiras adicionais para impedir a expansão acelerada de instituições com modelos de negócios considerados opacos. Entre as propostas mencionadas estão:

exigências mais rígidas de capital e liquidez para bancos que dependem fortemente de CDBs cobertos pelo FGC;

monitoramento contínuo de operações estruturadas de crédito;

revisão de regras para exposição de bancos públicos e fundos de previdência a papéis de instituições com rating baixo;

ampliação da transparência nos demonstrativos de risco e nas carteiras de crédito.

A crise do Master também colocou em evidência a relação entre regulação prudencial, governança interna e pressões políticas. Relatórios produzidos por órgãos de controle e pela Polícia Federal apontam que o banco apresentava ativos de difícil precificação e práticas questionadas pela área técnica do BC desde 2023.

Com a liquidação extrajudicial decretada e as investigações em curso, o caso deverá permanecer no centro das discussões sobre a supervisão do sistema financeiro nos próximos meses. Executivos consultados afirmam que a prioridade agora é evitar que episódios semelhantes voltem a ocorrer e que o impacto sobre o FGC seja tratado como sinal de alerta para a formulação de novas regras.

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