BC amplia investigações sobre o Banco Master e mira possíveis fraudes estruturais após liquidação

O Banco Central (BC) intensificou as investigações internas sobre o Banco Master e prepara uma nova rodada de procedimentos administrativos para aprofundar suspeitas de irregularidades envolvendo a instituição, liquidada extrajudicialmente na semana passada. As informações foram publicadas pelo jornal O Globo, que ouviu técnicos e integrantes da autoridade monetária envolvidos no caso. As apurações vão além dos elementos já identificados pela Polícia Federal (PF) e pelo Ministério Público Federal (MPF) durante a Operação Compliance Zero, que resultou na prisão do CEO Daniel Vorcaro e de outros seis executivos do conglomerado.

As novas frentes de investigação do BC incluem a análise de operações consideradas atípicas, omissões regulatórias e eventuais fraudes contábeis que possam ter sido praticadas antes da liquidação. Fontes internas afirmam que parte das operações suspeitas só pôde ser examinada em detalhes após o afastamento dos dirigentes e a tomada de controle da instituição pelo liquidante nomeado pela autarquia. O objetivo é determinar a extensão do prejuízo, a cadeia de responsabilidade e possíveis violações às normas prudenciais.

Fundo Bravo entra na mira da autarquia

Além das inconsistências identificadas nas carteiras do Master, o Banco Central ampliará o escrutínio sobre o fundo Bravo, estruturado como um FDIC e administrado pela gestora Reag. O fundo afirmava deter patrimônio de R$ 8 bilhões, mas encerrou suas atividades em novembro de 2024 sem publicar documentos completos sobre sua composição, fluxo de investimentos ou desempenho. A ausência de informações detalhadas chamou a atenção de técnicos do BC e agora será alvo de apurações específicas.

A Reag também é investigada pela Polícia Federal na Operação Carbono Oculto, que apura suspeitas de lavagem de dinheiro envolvendo fintechs, fundos de investimento e organizações criminosas, incluindo possíveis vínculos com o Primeiro Comando da Capital (PCC). O cruzamento das duas operações pode revelar conexões entre os ativos do Master, fundos sob gestão da Reag e operações de crédito classificadas como irregulares.

Pressão política e falhas de supervisão

O caso ganhou ainda mais dimensão após relatos de que técnicos do Banco Central enfrentaram forte pressão política enquanto investigavam o banco. Durante depoimentos prestados à Polícia Federal no âmbito da Operação Compliance Zero, servidores afirmaram nunca ter vivenciado pressão tão intensa para evitar uma intervenção na instituição. Segundo os relatos, houve tentativas diretas de influenciar decisões técnicas, inclusive no episódio que envolveu a tentativa de compra do Master pelo Banco de Brasília (BRB), posteriormente vetada pela autarquia.

A PF identificou ainda que o banco deixou de recolher depósitos compulsórios desde julho, descumprindo uma das obrigações mais básicas do sistema financeiro — exigência considerada essencial para garantir liquidez e preservar o equilíbrio do setor. A omissão é classificada como grave e reforça as suspeitas de deterioração contábil e irregularidades estruturais no banco.

Reações no Congresso e possível CPI

A repercussão política cresceu após o senador Eduardo Girão anunciar que apresentará pedido de investigação legislativa sobre o caso. Segundo o parlamentar, os indícios apurados pela PF, pelo Banco Central e pela imprensa podem configurar “uma das maiores pirâmides financeiras já identificadas no País”. Em sua proposta, Girão afirma que as operações do Master teriam potencial para gerar “dano sistêmico” ao mercado e prejuízos diretos ao patrimônio público, especialmente devido aos investimentos feitos por fundos estaduais e municipais de previdência em papéis da instituição.

O anúncio reacende o debate sobre o modelo de supervisão financeira e sobre a necessidade de revisão dos mecanismos de fiscalização de instituições de médio porte com grande dependência de captação via CDBs garantidos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC).

Possíveis punições e defesa de Vorcaro

As novas investigações administrativas que serão abertas pelo BC podem resultar na inabilitação de Daniel Vorcaro e de outros dirigentes ligados ao Master, impedindo-os de atuar em qualquer instituição financeira sob supervisão do sistema bancário nacional. A medida é prevista na legislação para casos em que há comprovação de gestão temerária, irregularidades contábeis, fraudes ou descumprimento de obrigações regulatórias básicas.

A defesa de Vorcaro, no entanto, argumentou em pedido de habeas corpus apresentado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que a prisão seria “desproporcional”, alegando que não existiria investigação administrativa interna no BC que justificasse a urgência da medida. Integrantes da autarquia afirmaram ao O Globo que a ausência de procedimentos naquela fase inicial ocorreu porque o foco foi comunicar imediatamente indícios de fraude às autoridades policiais e preparar a liquidação extrajudicial do banco — operação concluída na semana passada.

Próximos passos

Com a liquidação já decretada, o Banco Central passa a ter acesso integral às informações internas do Master, o que permitirá cruzamento de dados, análise documental e investigação aprofundada dos fluxos financeiros do conglomerado e dos fundos associados. As conclusões desses procedimentos devem orientar tanto eventuais punições administrativas quanto a colaboração formal com a PF e o MPF nas ações penais já instauradas.

As autoridades consideram que o caso pode se tornar um dos mais volumosos da história recente do sistema financeiro brasileiro, tanto pelo tamanho do rombo identificado quanto pelo envolvimento de diversas camadas do mercado — fundos de previdência, instituições financeiras, gestoras de recursos e agentes políticos. O BC reforçou que continuará atuando para preservar a estabilidade do setor e garantir proteção aos credores cobertos pelo FGC.

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