O embate político em torno da indicação de Jorge Messias ao Supremo Tribunal Federal (STF) ganhou novos elementos após o Estado de S. Paulo publicar um editorial no qual acusa o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), de agir como “chantagista” ao tentar influenciar a escolha presidencial. Segundo o jornal, Alcolumbre tentou impor sua preferência ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, diante da resistência do Planalto, passou a articular retaliações que alcançaram projetos de forte impacto fiscal.
O editorial, divulgado nesta semana, recorda que a Constituição estabelece de forma explícita que a indicação de ministros do STF é prerrogativa exclusiva do presidente da República. Ao Senado cabe a função de sabatinar e aprovar ou rejeitar o indicado, mantendo assim o equilíbrio entre Poderes. Para o Estadão, a atuação de Alcolumbre, que preside a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), extrapolou esse limite e buscou interferir diretamente em uma atribuição que não lhe cabe.
Pressão pela indicação de Rodrigo Pacheco
Segundo o editorial, Alcolumbre teria se comportado como “coproprietário” da prerrogativa presidencial ao pressionar Lula para que escolhesse o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para a vaga aberta com a aposentadoria de Luís Roberto Barroso. De acordo com o texto, o presidente do Senado teria atuado como se possuísse o poder de nomear ministros da Suprema Corte, “mesmo sem respaldo legal, moral ou republicano”.
Lula, porém, manteve a decisão de indicar Jorge Messias, advogado-geral da União e nome já esperado nos bastidores. Diante disso, Alcolumbre teria, segundo o jornal, adotado uma postura de retaliação. O editorial afirma que ele comentou a aliados que se tornaria “um novo Davi” para mostrar ao Palácio do Planalto o custo de não contar com seu apoio. A interpretação do Estadão é que o episódio inaugurou uma nova rodada de tensão entre os Poderes.
Retaliação legislativa e impacto fiscal
O primeiro movimento concreto apontado pelo jornal foi a decisão de Alcolumbre, como presidente do Senado, de pautar e aprovar um projeto que concede aposentadoria especial a agentes comunitários. A medida, classificada pelo editorial como um “despautério político e fiscal”, deve gerar custos bilionários ao governo federal. O texto sustenta que a aprovação do projeto, sem amplo debate e com impactos fiscais significativos, seria uma forma de pressionar o Executivo após a nomeação de Messias.
Para o Estadão, esse episódio ilustra um processo mais amplo em que o Congresso tem ampliado sua influência sobre decisões tradicionalmente reservadas ao Executivo. A análise destaca que, ao controlar grande parte das verbas discricionárias do orçamento por meio das emendas parlamentares, deputados e senadores vêm exercendo um peso crescente sobre a agenda governamental.
Disputa por influência sobre o Judiciário
O editorial também aponta que o avanço sobre a prerrogativa de indicação ao STF representa uma tentativa de o Senado assumir papel protagonista na definição da composição do Judiciário. Segundo o texto, a centralidade adquirida pelo Supremo no cenário político brasileiro intensificou a disputa por influência sobre seus quadros, e pressões por indicações supostamente associadas à lealdade se tornaram mais frequentes, tanto no governo anterior quanto no atual.
O jornal afirma que, no ambiente atual, a disputa pelo controle de vagas no STF ganhou contornos políticos mais explícitos. Para o Estadão, Alcolumbre busca transformar o Senado de órgão revisor em protagonista desse processo, algo considerado perigoso para o equilíbrio institucional.
Defesa das prerrogativas presidenciais
Apesar das críticas ao perfil jurídico de Jorge Messias, o editorial sustenta que Lula tomou a decisão correta ao manter a indicação mesmo sob ameaça de retaliações. O jornal argumenta que recuar diante da pressão significaria enfraquecer as prerrogativas constitucionais do chefe do Executivo — e, consequentemente, abrir precedente para que futuros presidentes enfrentem investidas semelhantes.
Segundo o editorial, se o Senado considerasse Messias inadequado para o cargo, o caminho institucional seria a sabatina e eventual rejeição do nome, e não a imposição de constrangimentos ao governo. O texto enfatiza que o debate sobre a capacidade técnica do indicado é legítimo, mas não pode ser misturado com estratégias de força política destinadas a moldar a escolha presidencial.
Expansão do poder parlamentar e desafios institucionais
O episódio, afirma o Estadão, evidencia um movimento contínuo de expansão da influência do Legislativo sobre a formulação de políticas públicas e sobre o próprio funcionamento da máquina estatal. O argumento central é que o Congresso passou a exercer o “bônus” da alocação de recursos públicos, mas sem arcar com o “ônus” da responsabilidade fiscal, que continua recaindo sobre o Executivo.
Para o jornal, a tentativa de interferir na indicação ao STF representa a etapa mais arriscada dessa expansão, pois afeta diretamente a separação de Poderes e a integridade institucional. O editorial conclui defendendo que as prerrogativas do Executivo sejam respeitadas e que o Senado cumpra seu papel constitucional de avaliação técnica do indicado, sem transformá-lo em instrumento de barganha política.