A decisão do governo federal de contratar José Luiz Datena para comandar programas na Empresa Brasil de Comunicação (EBC) provocou forte reação de entidades representativas de jornalistas. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e os sindicatos do Distrito Federal, Rio de Janeiro e São Paulo divulgaram notas afirmando que o apresentador não atende aos critérios previstos na legislação que rege a comunicação pública. As informações foram publicadas pela coluna da jornalista Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo.
Datena foi convidado a assumir um talk show semanal na TV Brasil e um programa diário na Rádio Nacional. O projeto tem aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que recebeu o comunicador no Palácio do Planalto na segunda-feira (1º). A decisão desencadeou críticas imediatas de setores da imprensa que cobram do governo uma política consistente para o sistema público de comunicação.
Entidades afirmam que trajetória de Datena contraria diretrizes da comunicação pública
Em nota conjunta, Fenaj e sindicatos afirmam que Datena “consolidou um tipo de jornalismo marcado pelo desrespeito sistemático aos direitos humanos e pelo proselitismo político”, práticas que consideram incompatíveis com o modelo de comunicação pública estabelecido em lei.
As entidades mencionam que a legislação prevê independência editorial, diversidade de conteúdos, pluralidade e respeito às normas de defesa dos direitos humanos como pilares da EBC. Para os representantes, a contratação contraria esses princípios.
“O convite reforça a ausência de um projeto consistente para a comunicação pública federal”, afirmam. Segundo a Fenaj, a EBC deveria atuar com base em parâmetros de interesse público, e não segundo critérios de projeção individual ou preferência política. As organizações recordam que denunciam problemas estruturais na empresa desde 2016.
Críticas incluem falta de reestruturação após gestão Bolsonaro
As entidades afirmam ainda que a empresa não passou por reestruturação adequada após o período de Jair Bolsonaro, quando houve tentativas de privatização, episódios de censura e redução de autonomia editorial. Mesmo após três anos do atual governo, dizem que o cenário permanece crítico.
“Avaliações internas mostram que pouco avançou em valorização profissional, fortalecimento institucional e recomposição do quadro de servidores”, declara o texto das entidades. Para elas, a contratação de um apresentador associado à mídia comercial não resolve os desafios estruturais da empresa.
Datena rebate críticas e afirma ter independência editorial
Datena respondeu às críticas ao ser procurado pela coluna. O apresentador afirmou que manterá independência editorial e negou que sua futura atuação na EBC tenha qualquer tipo de direcionamento político.
“Eu sempre fui independente. E inclusive enfrentei problemas por causa disso. Não iriam agora me convidar para ser tendencioso. O meu papel será sempre o de jornalista, e todos sabem disso”, declarou.
Segundo a coluna, Datena disse compreender a resistência, mas afirmou que exercerá seu trabalho com autonomia e que não haverá interferência de governo ou partidos na condução do conteúdo.
Novo programa deve estrear em janeiro
De acordo com integrantes da EBC e fontes do governo citadas pela Folha, o plano é que Datena apresente um talk show semanal com entrevistas sobre temas variados, incluindo segurança pública, economia e assuntos sociais. O programa diário na Rádio Nacional terá formato de análise e interação com ouvintes.
A estreia está prevista para janeiro de 2026, conforme o calendário preliminar da emissora. Técnicos da EBC trabalham na formatação da atração, definição de equipe, cenografia e cronograma de produção.
Debate sobre comunicação pública ganha nova dimensão
A reação das entidades reacende um debate recorrente sobre identidade e finalidade da EBC. Organizações de jornalistas defendem que a comunicação pública deve priorizar produção educativa, cultural e informativa baseada em critérios de pluralidade e isenção. Para elas, a presença de apresentadores com forte marca editorial construída na mídia comercial pode distorcer o papel institucional da empresa.
Especialistas consultados por organizações do setor afirmam que a discussão sobre modelos de gestão da EBC envolve, além do conteúdo, questões como orçamento, autonomia, governança e formas de participação da sociedade. O caso Datena ampliou a pressão para que o governo apresente um plano estruturado para o sistema público de comunicação.
Governo evita confronto e reforça que decisão foi técnica
Integrantes do Executivo, segundo a coluna, avaliam que a contratação atende ao objetivo de ampliar audiência e diversificar formatos. A interlocutores, afirmam que a escolha ocorreu “por critérios de comunicação” e não de alinhamento político. Contudo, reconhecem que a reação de entidades deve prolongar o debate.
No Palácio do Planalto, assessores afirmam que a decisão não será revista e que a EBC tem autonomia para implementar novos produtos de mídia. A emissora não se manifestou oficialmente.