A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de decretar a prisão preventiva do presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar (União), desencadeou uma nova etapa no enfrentamento à presença de organizações criminosas dentro das estruturas de poder. O movimento, revelado pelo O Globo, sinaliza que o ministro pretende aprofundar as apurações sobre redes criminosas que atuam no Estado do Rio e expandem sua influência para além do país.
No despacho que fundamentou a prisão, Moraes enfatiza repetidamente a necessidade de investigar “crimes com repercussão interestadual e internacional” e de reprimir de maneira uniforme a atuação de grupos violentos. A ordem integra o conjunto de ações relacionadas à ADPF das Favelas, que passou à relatoria do ministro em outubro, após o encerramento dos processos ligados à trama golpista.
A intensificação das investigações ocorre após uma megaoperação policial que deixou 121 mortos e prendeu 113 suspeitos associados ao Comando Vermelho. No início de novembro, Moraes esteve no Rio para reuniões com representantes do governo Cláudio Castro (PL), reforçando sua participação direta na condução dos trabalhos. A atuação do ministro no combate ao crime organizado remonta aos períodos em que ocupou o Ministério da Justiça e a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, quando ganhou notoriedade por comandar pessoalmente operações.
No âmbito da ADPF, a Polícia Federal no Rio recebeu reforço orçamentário e estruturou uma força-tarefa com cerca de 25 agentes especializados em inteligência e rastreamento financeiro. A equipe, em regime de dedicação exclusiva, atua junto à Receita Federal para rastrear movimentações e mecanismos de lavagem de dinheiro.
Antes da prisão de Bacellar, operações anteriores da PF já investigavam articulações criminosas dentro da Alerj. A Operação Zargun levou à detenção do ex-deputado Thiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Joias, acusado de atuar politicamente em favor de facções. Outras ações — Forja e Cartel — apuraram o fornecimento de armas e drogas sintéticas pelo Comando Vermelho.
O novo avanço das apurações agora concentra-se nas possíveis ligações entre autoridades públicas e organizações criminosas. Segundo a PF, Bacellar exercia influência na “nomeação de cargos diversos” na administração do estado, incluindo posições nas polícias Civil e Militar. Os investigadores também classificaram como “manobra regimental” a articulação entre o governo estadual e a cúpula da Alerj que resultou no afastamento de TH Joias, então suplente em exercício.
A prisão de Bacellar foi planejada para impedir destruição de provas. Agentes o chamaram para uma reunião na superintendência da PF e decretaram a prisão no momento de sua chegada. No carro oficial que o transportava, foram encontrados R$ 90,84 mil em espécie. A investigação indica que Bacellar teria alertado TH Joias sobre a operação que resultaria em sua detenção, permitindo que o ex-deputado se desfizesse de “objetos de interesse da investigação”.
No despacho, Moraes afirmou que o caso vai além da suspeita de obstrução de Justiça. Ele destacou que as organizações criminosas do Rio, além do controle territorial por meio da força e da corrupção sistemática de agentes públicos e políticos, alcançaram “infiltração política” nas esferas municipal, estadual e federal.
O ministro determinou ainda o compartilhamento de elementos de uma operação que tramita sob sigilo no Tribunal Regional Federal da 2ª Região, bem como o envio de documentos da Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado do Rio relacionados à articulação política que retirou TH Joias do mandato.
A estratégia de Moraes repete o modelo usado nos inquéritos das fake news e da trama golpista, marcados pela ampliação do alcance das investigações a partir do compartilhamento de dados entre diferentes frentes. O mesmo se desenha na ADPF das Favelas, agora com foco na desarticulação da rede de infiltração criminosa no aparelho estatal.