O advogado José Antonio Kast foi eleito neste domingo (14) presidente do Chile, marcando a volta da direita ao Palácio La Moneda após quatro anos de governo de esquerda. Com a apuração praticamente concluída, o candidato do Partido Republicano obteve cerca de 58% dos votos no segundo turno e derrotou a candidata governista Jeannette Jara, do Partido Comunista, que ficou com aproximadamente 42%, segundo dados do Serviço Eleitoral (Servel).
A vitória faz de Kast o presidente mais à direita do Chile desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet (1973–1990), há 35 anos. O novo presidente tomará posse em março e deverá governar em um cenário político complexo, marcado por um Congresso fragmentado e sem maiorias claramente definidas.
Pouco após a divulgação do resultado, apoiadores de Kast tomaram as ruas de Santiago para comemorar a vitória. Em seu primeiro discurso após a confirmação do triunfo, o presidente eleito classificou o momento como “um dia de alegria” e procurou adotar um tom conciliador.
“Esta não é uma vitória pessoal, não pertence a José Antonio Kast. Não pertence a um partido do qual me orgulho. Aqui, o Chile venceu, e com ele a esperança de viver sem medo”, afirmou.
Durante a fala, Kast pediu respeito à adversária após parte do público vaiar quando o nome de Jeannette Jara foi citado. “O respeito é essencial, porque se não o conquistarmos, a divisão continuará. Ela pode ter uma ideologia diferente, mas é uma pessoa como nós. Ela aceitou um desafio muito difícil e manteve-se fiel ao seu estilo até o fim. Um governo não se constrói somente com partidários, a oposição também é importante”, disse.
Jara reconheceu a derrota ainda no domingo e confirmou que telefonou ao presidente eleito. “A democracia falou alto e claro. Acabei de falar com o presidente eleito José Antonio Kast para desejar-lhe sucesso para o bem do Chile”, escreveu no X. Em discurso posterior, afirmou: “Não quero um país dividido. Seremos uma oposição proativa e exigente, trabalhando para melhorar a vida do nosso povo. E, ao mesmo tempo, seremos firmes na proteção do que foi conquistado”.
O atual presidente chileno, Gabriel Boric, também entrou em contato com Kast e desejou êxito ao sucessor. “Quero que ele saiba que, como presidente da República, estarei sempre à disposição para servir a nação”, declarou, em mensagem televisionada.
A vitória de Kast repercutiu internacionalmente. O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou que seguirá trabalhando com o novo governo chileno “em favor do fortalecimento das excelentes relações bilaterais”. Já o secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, disse confiar que o Chile avançará em “prioridades compartilhadas”, como segurança pública e combate à imigração ilegal.
Católico devoto, pai de nove filhos e ex-deputado por 16 anos, Kast construiu sua campanha com foco em uma agenda de linha dura contra o crime e a imigração. Entre suas principais promessas estão a deportação de cerca de 340 mil imigrantes em situação irregular, a militarização das fronteiras, a criação de uma força policial especializada nos moldes do ICE americano e o endurecimento das políticas de segurança pública. Ele também defende flexibilização das leis trabalhistas, redução de impostos corporativos e menor regulação econômica.
O presidente eleito já declarou que pretende revogar os direitos limitados ao aborto no Chile e proibir a venda da pílula do dia seguinte. Questionado sobre o tema durante o último debate, afirmou: “Eu apoio a vida desde a concepção até a morte natural”.
Ao longo da campanha, Kast evitou enfatizar temas que lhe renderam rejeição em disputas anteriores, como sua defesa aberta da ditadura de Pinochet — sobre a qual já afirmou que, se o ex-ditador estivesse vivo, votaria nele. Investigações jornalísticas também apontaram que seu pai, nascido na Alemanha, foi filiado ao Partido Nazista, algo que Kast nega, afirmando que ele foi recrutado à força pelo Exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial.
Apesar da vitória expressiva, analistas apontam que Kast não terá um caminho simples no Congresso. Embora as coligações de direita tenham avançado nas eleições legislativas, não há garantia de unidade entre os partidos conservadores, o que pode dificultar a aprovação de projetos centrais do novo governo.
A eleição encerra um ciclo iniciado em 2021, quando Boric venceu Kast em um segundo turno e conduziu o Chile ao governo mais à esquerda de sua história recente. Agora, com a alternância de poder, o país entra em um novo capítulo político, marcado por polarização, expectativas elevadas em torno da segurança pública e desafios econômicos que o próprio presidente eleito reconheceu: “Teremos um ano difícil, muito difícil, porque as finanças do país não estão em boa situação”.