Nesta segunda-feira (15), Plano Clima pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) foi aprovado como o documento que passa a orientar as políticas brasileiras de enfrentamento à crise climática até 2035. O texto deve entrar em vigor nos próximos dias, após publicação no Diário Oficial da União, estabelecendo diretrizes que envolvem tanto a redução das emissões de gases de efeito estufa quanto a preparação do país para eventos extremos cada vez mais frequentes.
Concebido como um eixo organizador das ações públicas e privadas, o plano reúne a Estratégia Nacional de Mitigação e a Estratégia Nacional de Adaptação, além de planejamentos específicos para diferentes setores da economia. Segundo o secretário nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Aloisio Lopes de Melo, o documento funciona como um guia amplo para a atuação coordenada do país. “O Plano Clima é um orientador desse conjunto de ações. Quando a gente fala de adaptação a essa nova realidade, ele traz isso na forma de 16 agendas de trabalho. E tem o outro lado, de como a gente enfrenta o problema na sua causa, de como a gente reduz emissões, que traz 8 agendas na forma de planos setoriais”, afirmou.
Na prática, o plano estabelece um conjunto de iniciativas a serem adotadas até 2035, envolvendo governos e iniciativa privada, com o objetivo de contribuir para que o aquecimento global não ultrapasse 1,5 °C e, ao mesmo tempo, preparar o país para impactos já em curso, como secas prolongadas e chuvas intensas. Melo destaca que o alcance do documento vai além da esfera federal e dialoga diretamente com estados e municípios. “Ele orienta o conjunto de atores, como municípios, por exemplo, para terem um desenvolvimento urbano mais sustentável, seja no sentido de ter mais mobilidade pública, com modais coletivos, com avanço na eletriticação dos transportes, uso de biocombustíveis, e na organização da mobilidade urbana no sentido de ter cidades menos dependentes de combustíveis fósseis, cidades mais sustentáveis”, disse.
O secretário também ressaltou que o plano cria condições para orientar investimentos privados. “Por exemplo, o Plano Clima estabelece mecanismos para aumentar a oferta de recursos de financiamento para os investimentos em atividade de baixo carbono, para que o setor privado possa olhar para essas prioridades, entender quais são as principais inovações e eixos de atuações e possa orientar sua atividade e seus investimentos para essa finalidade”, explicou.
O documento complementa a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) apresentada pelo Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a UNFCCC, em novembro de 2024. O governo pretende entregar o Plano Clima como método para cumprir a meta de redução de 59% a 67% das emissões até 2035. Para Melo, a Estratégia Nacional de Adaptação representa uma inovação no cenário internacional. “Vai servir como referência e ajudar nesse debate internacional e nesse desafio que todos os países têm de conviver com a mudança do clima, fazendo com que ela não afete os seus processos de desenvolvimento social e econômico”, avaliou.
A construção do plano contou com ampla participação social desde 2023, envolvendo consultas públicas, oficinas e debates. Para Marta Salomon, especialista sênior do Instituto Talanoa, o Plano Clima se consolida como a espinha dorsal da política climática brasileira. “O que está diante de nós agora como grande desafio é exatamente implementar aquilo que foi definido nesse grande acordo. Teve uma série de consultas públicas, de oficinas, de debates para construir isso que foi aprovado ontem no CIM”, afirmou.
Apesar do avanço, representantes da sociedade civil apontam lacunas importantes. Marta avalia que falta maior ambição na transição definitiva da economia brasileira para longe dos combustíveis fósseis. “Tem problemas que a própria mudança climática impõe, como falta de chuva para gerar energia hidrelétrica. Então, isso vai ter um impacto no percentual de renovabilidade da matriz elétrica. Nesse sentido, a gente sentiu falta de o Plano Clima expressar o afastamento do uso de combustíveis fósseis”, disse. Uma avaliação semelhante foi feita por Fábio Ishisaki, assessor de políticas públicas do Observatório do Clima, que considera insuficiente o detalhamento nos planos setoriais de energia e indústria. “No setor de energia, tem incentivos para adoção de renováveis, mas o principal que é você não utilizar mais os fósseis, você não fomentar novas frentes de exploração, isso realmente nós não conseguimos identificar”, afirmou.
O debate sobre a transição energética foi defendido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a COP30, realizada em Belém, e também constou do documento final da COP28, em Dubai, como parte do aperfeiçoamento do Acordo de Paris. Embora não tenha havido consenso pleno, houve compromisso governamental de construção de um caminho para essa transição. “O mapa do caminho e essa transição para longe dos fósseis, ainda que o Brasil tenha uma matriz energética limpa e uma matriz elétrica limpíssima, a gente precisa ter no Plano Clima”, reforçou Marta.
Outro ponto sensível apontado pela especialista é a ausência de um projeto de lei que institucionalize o Plano Clima. “O desafio é gigantesco, porque a gente não tem o Plano Clima institucionalizado como uma lei. Então, dependendo do cenário eleitoral de 2026, o Plano Clima está sob risco de um próximo governo não comprometido com a causa climática, como o atual governo é, simplesmente transformar isso em pó”, alertou. Para Ishisaki, porém, o risco é mitigado pelo fato de as políticas previstas estarem vinculadas a legislações específicas e pelo reconhecimento, pelo Supremo Tribunal Federal, do Acordo de Paris como norma supralegal. “O Acordo de Paris está naquele patamar entre a lei e a Constituição Federal, que é a nossa lei máxima, nossa norma máxima”, afirmou.
Também há questionamentos sobre o financiamento. O Observatório do Clima avalia que ainda falta clareza sobre o custo total de implementação do plano, apesar da menção a fundos e recursos públicos e privados. “Se você não tem o dinheiro necessário e não sabe de onde você vai ter que tirar esse dinheiro, acaba travando, na verdade, todo o caminho para se implementar e efetivar as medidas do Plano Clima”, concluiu Ishisaki.
Contém informações da Agência Brasil