O anúncio feito pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, na noite de domingo (21), reacendeu tensões diplomáticas envolvendo a Groenlândia, território autônomo da Dinamarca localizado no Ártico. Trump informou que nomeou o governador da Louisiana, Jeff Landry, como enviado especial dos EUA para tratar da ilha, decisão que foi seguida, no dia seguinte, por declarações do próprio Landry defendendo que a Groenlândia se torne parte do território americano.
A movimentação ocorre em um contexto no qual Trump, já em seu segundo mandato, voltou a vocalizar publicamente o interesse estratégico dos Estados Unidos pela Groenlândia. Em publicação na rede Truth Social, o presidente afirmou que Landry compreende a importância da ilha para a segurança nacional americana e que atuará na defesa dos interesses dos EUA “em prol da Segurança, Proteção e Sobrevivência de nossos Aliados e, de fato, do Mundo”.
A reação internacional foi imediata. Em Copenhague, o ministro das Relações Exteriores da Dinamarca, Lars Løkke Rasmussen, anunciou nesta segunda-feira (22) a convocação do embaixador dos Estados Unidos, gesto diplomático que expressa descontentamento formal entre países. Rasmussen declarou estar “profundamente incomodado” tanto com a nomeação quanto com as declarações de Landry, classificadas por ele como “totalmente inaceitáveis”.
Landry, por sua vez, agradeceu a indicação nas redes sociais e afirmou que considera “uma honra servir (…) nesta função voluntária para fazer da Groenlândia parte dos EUA”. O governador, filiado ao Partido Republicano, está no cargo desde 2024 e disse que a nova atribuição não interfere em seu mandato à frente do estado da Louisiana, que vai até 2027.
Na própria Groenlândia, o posicionamento americano também provocou reações. O primeiro-ministro do território, Jens-Frederik Nielsen, afirmou que os groenlandeses decidirão o próprio futuro e cobrou respeito à população local, à Dinamarca e à integridade territorial da ilha. Em Bruxelas, a União Europeia divulgou nota na qual ressaltou que a soberania da Groenlândia e do Reino da Dinamarca deve ser preservada.
A parlamentar groenlandesa Aaja Chemnitz, que integra o Parlamento dinamarquês, avaliou que a existência de um enviado especial americano não seria, por si só, um problema, mas criticou o objetivo atribuído à missão. “O problema é que ele recebeu a tarefa de assumir a Groenlândia ou torná-la parte dos Estados Unidos — e não há qualquer desejo disso na Groenlândia”, afirmou à agência Reuters.
O episódio retoma uma ofensiva antiga de Trump. Ainda durante seu primeiro mandato, o presidente chegou a declarar que pretendia comprar a Groenlândia, proposta rejeitada de forma imediata pelas autoridades locais. Desde então, Trump passou a adotar um discurso mais duro, afirmando que os Estados Unidos “precisam” da ilha e chegando a não descartar o uso de força militar para garantir o controle do território.
Em discursos recentes, o presidente americano justificou o interesse citando razões de segurança, como a instalação de radares e bases militares para monitorar ameaças vindas da Rússia e da Europa, além da posição estratégica da Groenlândia no Atlântico Norte. A ilha também possui reservas de minerais considerados essenciais para a transição energética, além de petróleo e gás natural, embora a exploração desses recursos enfrente restrições ambientais e oposição de comunidades locais.
As declarações de Trump ao longo de 2025 provocaram protestos na Groenlândia e críticas de países europeus. Em março, durante um discurso no Congresso, o presidente afirmou que os EUA “vão tomar a Groenlândia de um jeito ou de outro”, o que intensificou a reação internacional. Houve ainda ameaças de elevação de tarifas contra a Dinamarca caso o país tentasse barrar uma eventual incorporação do território.
Especialistas avaliam que, embora a Groenlândia tenha autonomia política e possa, em tese, decidir por sua independência da Dinamarca, a possibilidade de se tornar parte dos Estados Unidos é remota. Uma pesquisa recente indicou que apenas 6% da população apoia essa alternativa. Como resumiu o pesquisador Ulrik Pram Gad, do Instituto Dinamarquês de Estudos Internacionais, “a Groenlândia está discutindo a independência da Dinamarca, mas nenhum groenlandês quer simplesmente mudar para um novo senhor colonial”.