A ida de dois oficiais de Justiça ao escritório do Banco Master, em São Paulo, em busca do liquidante da instituição, Eduardo Félix Bianchini, intensificou o clima de tensão jurídica em torno da liquidação extrajudicial do conglomerado financeiro. A movimentação, revelada pela Folha de S.Paulo, alimentou a expectativa de que Bianchini possa ser intimado a prestar esclarecimentos nos próximos dias, em meio à disputa judicial envolvendo o banco controlado pelo banqueiro Daniel Vorcaro.
Segundo a reportagem, a visita ocorreu antes do feriado de Natal, mas o liquidante não foi encontrado no local. Servidor aposentado do Banco Central do Brasil, Bianchini havia viajado para passar as festas de fim de ano com a família fora da capital paulista, o que impediu o cumprimento de eventual intimação.
Liquidante se torna peça-chave em embate judicial
A atuação de Eduardo Bianchini ganhou centralidade após o Banco Central decretar, em 18 de novembro de 2025, a liquidação extrajudicial do Banco Master. A medida foi justificada oficialmente por grave crise de liquidez, deterioração da situação econômico-financeira e violações a normas do sistema financeiro nacional.
Desde então, a defesa de Daniel Vorcaro vem tentando, em diferentes frentes, reverter a decisão. Há ações em curso tanto no Supremo Tribunal Federal quanto no Tribunal de Contas da União, com o argumento de que a liquidação teria sido precipitada ou conduzida de forma irregular.
Nesse contexto, o papel do liquidante se torna sensível. Ao assumir a gestão do banco após a decretação da liquidação, Bianchini passa a ter acesso integral aos dados internos da instituição, incluindo contratos, fluxos financeiros e pagamentos realizados nos meses que antecederam o colapso. Seu relatório final é considerado peça central para esclarecer a real dimensão das operações do banco e eventuais irregularidades.
Contrato com escritório ligado a Alexandre de Moraes entra no foco
Um dos pontos que ampliaram a pressão política e institucional sobre o caso envolve contratos firmados pelo Banco Master com escritórios de advocacia. Reportagem citada pela Folha menciona que a instituição teria contratado o escritório de familiares do ministro Alexandre de Moraes, por valores que chegariam a R$ 3,6 milhões mensais, para atuar na defesa de interesses do banco.
A informação, atribuída anteriormente a O Globo, passou a ser observada com mais atenção após a decretação da liquidação, uma vez que contratos dessa magnitude, firmados em meio a uma crise financeira profunda, levantam questionamentos sobre governança, uso de recursos e eventual conflito de interesses.
A possibilidade de o liquidante ser chamado a explicar detalhes desses contratos e de outros vínculos comerciais passou a ser vista como um desdobramento natural do avanço das investigações e das disputas judiciais.
Defesa do banco acusa uso indevido de informações
Outro elemento que contribui para o ambiente de conflito é a acusação, feita pela defesa do Banco Master, de que o Banco Central teria se valido da atuação do liquidante para acessar informações internas da instituição já liquidada. Esse argumento teria sido levado ao TCU em petição que questiona a legalidade de atos posteriores à decretação da liquidação.
Para o regulador, contudo, a nomeação de um liquidante com acesso pleno aos dados é parte do procedimento regular previsto em lei, justamente para preservar ativos, apurar responsabilidades e proteger credores.
Toffoli nega envio de oficiais e mantém acareação restrita
No STF, o ministro Dias Toffoli decidiu promover uma acareação entre Daniel Vorcaro e Paulo Henrique Costa, com a participação do diretor de fiscalização do Banco Central, Ailton de Aquino Santos. A sessão está marcada para 30 de dezembro.
Procurado pela Folha, Toffoli negou, por meio de sua assessoria, que tenha determinado o envio de oficiais de Justiça para intimar o liquidante. Segundo o ministro, neste momento, “estão mantidos apenas os três nomes já divulgados pelo STF para a acareação”, afastando a hipótese de ampliação imediata do rol de convocados.
Pressão no TCU e desconforto entre técnicos
No Tribunal de Contas da União, o ministro Jhonatan de Jesus teria determinado que o Banco Central se manifeste sobre supostos indícios de precipitação na liquidação do Master. A Folha relata ainda que há desconforto interno no tribunal, após uma ação que teria limitado a atuação de técnicos da Audbancos, unidade responsável por fiscalizar instituições financeiras.
Além disso, o processo que analisa possível omissão do Banco Central em operações relacionadas ao Banco Master foi colocado sob sigilo, o que aumentou a especulação sobre os desdobramentos do caso.
“Sem precedente”: críticas de técnicos e ex-dirigentes
Especialistas ouvidos pela reportagem classificaram como atípica a possibilidade de interferência direta do STF ou do TCU no trabalho do liquidante. Um técnico aposentado do Banco Central, descrito como integrante da “velha guarda”, afirmou que uma iniciativa desse tipo seria “sem precedente” e poderia representar tentativa de intimidação do processo de liquidação.
O ex-diretor do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo foi ainda mais direto ao comentar o caso. “Eu nunca tinha visto. O que está sendo pedido são coisas que não têm sentido”, afirmou. Segundo ele, a liquidação teve respaldo legal e técnico. “Foi uma fraude gigante. Não foi decisão de um diretor, mas de todo um colegiado a partir de um volume de documentação muito robusto”, acrescentou.
Liquidação segue válida e debate permanece aberto
Apesar da crescente judicialização e das pressões políticas, a liquidação do Banco Master segue formalmente válida, sustentada por decisão unânime do colegiado do Banco Central. As disputas agora se concentram na tentativa de revisão do ato e na definição dos limites de atuação de órgãos de controle e do Judiciário sobre um processo tradicionalmente conduzido pela autoridade monetária.
Enquanto isso, a eventual intimação do liquidante permanece como mais um capítulo de um caso que já extrapolou o campo técnico e passou a ocupar o centro do debate institucional no país.


Nenhum comentário ainda, seja o primeiro!