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Como milhões de cartões de crédito comprometidos são vendidos a preço de banana?

Há algo muito revelador (e perturbador) no fato de que um número de cartão de crédito roubado possa ser comprado hoje por pouco mais de oito dólares no submundo digital.  Esse valor, menor que o do preço de um ingresso de cinema ou de um lanche simples em grandes cidades, indica o estágio avançado da […]

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Há algo muito revelador (e perturbador) no fato de que um número de cartão de crédito roubado possa ser comprado hoje por pouco mais de oito dólares no submundo digital. 

Esse valor, menor que o do preço de um ingresso de cinema ou de um lanche simples em grandes cidades, indica o estágio avançado da economia do cibercrime e a fragilidade estrutural da proteção de dados financeiros no Brasil contemporâneo.

O preço baixo aponta para uma disponibilidade alta de informações financeiras comprometidas. Quando um ativo tão sensível quanto um cartão de crédito passa a ser comercializado a valores tão baixos, fica claro que há excesso de oferta. 

Mercados clandestinos movimentam milhões de números indevidamente, fornecendo avaliações de vendedores, filtros por país, tipos de cartão e limites disponíveis como numa plataforma de comércio eletrônico.

Um cartão de crédito roubado pode ser vendido a uma média mundial de US$11,15. Tal valor pode variar conforme a disponibilidade de dados entre cada país e uma série de outros fatores. Assim, uma compra clandestina de cartão pode custar US$8,20 no Canadá, comparado a US$31,79 no Japão ou US$10,70 no Brasil (uma valorização de 26% diante dos US$8,47 computados em 2023).

Facilidades de pagamento perigosas 

No Brasil, onde o uso de cartões, pagamentos instantâneos e aplicativos bancários cresceu de forma acelerada na última década, o risco é ampliado. A adoção de práticas digitais financeiras no país não caminhou de mãos dadas com as dinâmicas mais básicas de proteção. A soma de 24 milhões de brasileiros vítimas de golpes envolvendo o Pix entre julho de 2024 e de 2025 foi revelada recentemente pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, corroborando essa noção.

O fato de parte expressiva da população nacional ser atingida por cibercrimes e de o prejuízo ser estimado em quase R$29 bilhões são fatos que inspiram cuidados óbvios. Ao mesmo tempo, empresas consolidadas também seguem tratando incidentes de cibersegurança não como falhas sistêmicas corrigíveis, mas sim como exceções inevitáveis.

No caso dos cartões, nem mesmo a verificação virtual com prazo de validade e código secreto são garantia de segurança. Empresas privadas, confiadas com tais informações confidenciais, invariavelmente são visadas por ataques cibernéticos. Suas bases de dados podem ser comprometidas nessas ocasiões, alimentando cadeias inteiras de revenda de dados e dizimando a confiança investida.

Os cibercriminosos tornam-se capazes de usar os dados de cartões comprados clandestinamente porque se utilizam de uma cadeia de suprimentos complexa, envolvendo ladrões de dados fonte, validadores dos dados em questão e agentes capazes de transformar saldos de cartões validados em valores digitais legítimos, criptomoedas ou até convertê-los em dinheiro vivo. 

O desafio aumenta porque robôs (“bots”) são usados para testes de pequena escala para viabilizar as autorizações virtuais, excedendo a capacidade humana de controle. 

Os dados como commodities

Seguindo essa logística criminosa, grandes bases de dados são comprometidas de uma só vez, alimentando cadeias inteiras de revenda. Para o consumidor comum, isso tem implicações diretas. Um cartão comprometido pode ser usado para compras fraudulentas, assinaturas recorrentes, lavagem de dinheiro ou até como etapa intermediária em crimes mais complexos. 

Mesmo quando o prejuízo financeiro é revertido pelos bancos, o custo indireto permanece: tempo perdido, insegurança, interrupção de serviços e desgaste emocional. 

Os preços de fraudes de cartões são mantidos baixos devido à lógica de mercado do crime. Os pequenos valores são multiplicados por milhares de transações, gerando retornos expressivos num ecossistema organizado, transnacional e altamente adaptável.

Regulação e interesse coletivo

Algumas ações pessoais podem ser tomadas para mitigar vulnerabilidades digitais. Fora da preocupação com bancos de dados virtuais, cuidados como usar uma boa VPN podem ser eficazes para proteger dispositivos isoladamente e suas comunicações. Testar opções de VPN grátis é uma maneira poderosa de entender se esse tipo de solução é suficiente para fornecer proteção para as necessidades de um indivíduo ou de uma rede corporativa.

Além disso, monitorar extratos com frequência, ativar alertas de transações, evitar armazenar dados de cartão em sites pouco confiáveis e desconfiar de comunicações que pedem informações financeiras são passos básicos, mas essenciais para a proteção de dados financeiros.

Entretanto, em última instância, incidentes gravíssimos de exposição de informações sensíveis acontecem de tempos em tempos, como o enorme vazamento de dados da Receita Federal de 2021, e isso dificulta qualquer eficácia de ações individuais de proteção.

Nesse sentido, a proteção de dados financeiros se configura como um claro tema de interesse coletivo que não poderia ser adiado por nossos legisladores nem cooptado por interesses pouco republicanos de agentes privados. O fato de um cartão de crédito valer menos que um sanduíche no mercado paralelo virtual não é apenas uma curiosidade mórbida. É um sintoma de um modelo digital insustentável para os cidadãos, que compromete a segurança individual sob o pretexto de uma conveniência econômica.

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